De viagens a vinhos: inflação dos mais ricos é o dobro do IPCA, aponta Itaú

Novo indicador calculado por economistas do Itaú Private Bank revela uma inflação perto de 10% para quem ganha acima de R$ 40 mil em 2024, versus 4,83% do índice do IBGE

Times Square
Por Beatriz Quesada
16 de Janeiro, 2025 | 11:07 AM

Bloomberg Línea — A variação do valor do dólar impacta as contas dos brasileiros de maneira abrangente. Produtos e insumos importados, por exemplo, encarecem os preços de eletrônicos, combustíveis e alimentos no mercado interno.

Mas existe uma parcela da população que é mais sensível à variação cambial: os mais ricos. É o que demonstra um novo indicador de inflação agregado calculado por economistas do Itaú, que apresentou volatilidade maior da inflação para o público de alta renda em anos de disparada do dólar.

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Trata-se do Índice de Preços ao Consumidor do Itaú Private Bank (IPC Private).

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O exemplo mais recente vem justamente do ano recém-encerrado de 2024, quando o dólar saltou 27% versus o real. O IPC Private registrou uma variação na casa dos 10% no ano passado, mais que o dobro do IPCA, o indicador oficial da inflação ao consumidor no Brasil, que fechou o ano com avanço de 4,83%.

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A maior diferença veio em 2015, quando o dólar disparou 48% no acumulado do ano: o IPC Private teve aumento de 18% contra 10,7% do IPCA. No ano seguinte, quando a moeda americana caiu 17,7% contra o real, o IPC Private ficou em 2,3%, ante 6,3% do indicador oficial da inflação.

IPC Private

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A explicação para a disparidade vem da composição do índice calculado pelo banco, que inclui itens como viagens ao exterior, gastos com casas em outras localidades, motorista e educação internacional. A avaliação dos economistas do Itaú Private Bank é que a composição do IPCA tem pouca representatividade para as famílias com renda mensal acima de R$ 40 mil.

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O IPCA, por sua vez, cobre a variação dos preços para famílias que ganham de 1 a 40 salários mínimos por mês, ou seja, de R$ 1.412 a R$ 56.480, segundo a metodologia do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Muitos preços se referem a produtos, portanto, da classe média.

“O IPCA não é um índice que representa os hábitos de consumo da parcela da população de alta renda, já que não contabiliza gastos importantes sensíveis ao câmbio, como viagens internacionais e educação fora do país, além de atribuir baixo peso para bens de luxo, como vinhos, na cesta de consumo”, explicaram, em artigo, a economista-chefe Gina Baccelli, acompanhada dos economistas Carolina Sato, Victor Camacho e Luann Kenji Assakawa, responsáveis pela criação do IPC Private.

Os economistas apontam que os preços de serviços de luxo, em especial restaurantes e hotéis, tiveram alta acentuada no Brasil e no exterior nos últimos anos, o que ampliou ainda mais a distância entre a inflação convencional e a que atinge os mais ricos. “Houve uma subestimação da inflação experimentada por indivíduos de alta renda.”

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Na falta de um indicador agregado de coleta de preços de bens e serviços luxuosos, o Itaú montou a própria cesta de itens.

“Por meio de conversas com alguns dos nossos colegas banqueiros, entendemos o que eles acreditavam ser essencial incluir em uma cesta de consumo de famílias de alta renda.”

Foram incluídas as já mencionadas viagens e educação no exterior, além de gastos com segunda residência e motorista (às vezes também fora do país). Itens de consumo de luxo, como vinhos, ganharam um reforço de peso na composição do novo índice.

O saldo final mostrou pesos diferentes dos apresentados pelo IPCA e também da estimativa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), que avalia a inflação por faixa de rendimento. Uma das maiores diferenças vem da alimentação, segmento que possui peso de 21% no IPCA e de apenas 10% no IPC Private.

“No caso do grupo de transporte, o peso no IPCA é bem mais elevado, de 20%, enquanto em nosso indicador o peso é de 12%, mesmo incluindo passagem aérea internacional (que evolui com os preços de passagens em dólar e com a variação do real)”, escreveram os economistas.

O indicador para alta renda, por outro lado, atribuiu um peso mais elevado para as despesas pessoais, que incluem hospedagens em dólares: no IPC Private, essa categoria supera os 25%, enquanto no IPCA é de apenas 10%.

Os preços de habitação, que englobam gastos com outras casas além da residência principal, também é um item em que o IPC Private tem mais peso que o indicador padrão da inflação.

Comparação índices de preços ao consumidor

Para as próximas divulgações, o Itaú Private Bank pretende aprimorar o indicador com dados proprietários, bem como expandir as fontes de coleta de preços.

Muitas das famílias de alta renda possuem contas offshore e poderiam arcar com parte de seus gastos em moeda estrangeira, o que diminui o impacto da inflação calculada pelo IPC Private.

“No entanto o objetivo do nosso exercício é levar em consideração o custo de vida em reais, pois essa é a percepção que muitos têm: que o seu poder de compra varia com o câmbio.”

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Beatriz Quesada

Beatriz Quesada

Jornalista especializada na cobertura econômica. Formada pela USP, escreve sobre mercados, negócios e setor imobiliário. Tem passagens por Exame, Capital Aberto e BandNews FM.