Copom reduz Selic em 0,25 ponto e diz que cenário exige política contracionista

Taxa de juros de referência foi reduzida para 10,50 ao ano, na primeira desaceleração do ritmo de cortes desde que o BC começou a reduzir os juros; decisão foi dividida

Por

Bloomberg Línea — O Comitê de Política Monetária (Copom) decidiu nesta quarta-feira (8) pelo corte de 0,25 ponto percentual da Selic, para 10,50% ao ano. O movimento marca a primeira desaceleração no ritmo de cortes desde que o Banco Central começou a reduzir os juros, em agosto de 2023.

A decisão era esperada por grande parte do mercado financeiro, com analistas citando um pano de fundo mais adverso, marcado pelo adiamento das apostas de cortes de juros nos Estados Unidos, bem como um aumento nas expectativas de inflação, na esteira da revisão da meta fiscal.

No comunicado, o Copom afirmou que ambiente externo mostra-se mais adverso, o que segue exigindo cautela por parte de países emergentes.

“Considerando a evolução do processo de desinflação, os cenários avaliados, o balanço de riscos e o amplo conjunto de informações disponíveis, o Copom decidiu reduzir a taxa básica de juros em 0,25 ponto percentual, para 10,50% a.a., e entende que essa decisão é compatível com a estratégia de convergência da inflação para o redor da meta ao longo do horizonte relevante, que inclui o ano de 2025. Sem prejuízo de seu objetivo fundamental de assegurar a estabilidade de preços, essa decisão também implica suavização das flutuações do nível de atividade econômica e fomento do pleno emprego”, diz o comunicado.

“A conjuntura atual, caracterizada por um estágio do processo desinflacionário que tende a ser mais lento, expectativas de inflação desancoradas e um cenário global desafiador, demanda serenidade e moderação na condução da política monetária”, complementa o Copom no texto.

O Comitê retirou a menção aos próximos movimentos sobre a taxa de juros.

Na reunião anterior, realizada em março, o Copom alterou um trecho que apontava em janeiro para cortes de mesma magnitude (0,50 ponto percentual) nas “próximas reuniões”, deixando a estimativa apenas para o próximo encontro, em maio.

“O Comitê, unanimemente, avalia que o cenário global incerto e o cenário doméstico marcado por resiliência na atividade e expectativas desancoradas demandam maior cautela. Ressalta, ademais, que a política monetária deve se manter contracionista até que se consolide não apenas o processo de desinflação como também a ancoragem das expectativas em torno de suas metas. O Comitê também reforça, com especial ênfase, que a extensão e a adequação de ajustes futuros na taxa de juros serão ditadas pelo firme compromisso de convergência da inflação à meta”, afirma o Copom.

A decisão não foi unânime. Cinco diretores, entre eles o presidente Roberto Campos Neto, votaram pelo corte de 0,25 ponto. Os demais quatro diretores, incluindo o diretor de política monetária Gabriel Galípolo, indicado pelo governo Lula, votaram pela redução de 0,50 ponto.

O Copom também elevou o cenário para a inflação. Agora as projeções do Copom para a inflação em 2024 são de um aumento de 3,8% (ante 3,5% na reunião anterior) e de 3,3% para 2025 (ante 3,2% da reunião de março).

Sobre a atividade, o Copom destacou que os indicadores da economia e do mercado de trabalho “mostram maior dinamismo do que o esperado”, alterando o texto do comunicado de março, que apontava uma “desaceleração”.

O Copom também avalia que o ambiente externo está mais “adverso”, com incertezas persistentes sobre a flexibilização monetária nos EUA e a queda da inflação em diversos países. É uma mudança em relação ao texto anterior, que apontava um cenário externo “volátil”.

Leia também: O pior momento do crédito para pessoa física ficou para trás, diz CEO do BV

Em abril, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo - 15 (IPCA-15), considerado uma prévia da inflação oficial, desacelerou para 0,21%, de 0,78% em março, influenciado pelo setor de alimentação e bebidas.

Nos últimos 12 meses, o índice acumula alta de 3,77%, abaixo dos 4,14% observados nos 12 meses imediatamente anteriores.

Os dados completos do IPCA de abril serão divulgados nesta sexta-feira (10). “A alta dos preços de alimentos e o aumento anual dos preços de remédios provavelmente pressionaram a inflação em abril”, avalia Adriana Dupita, da Bloomberg Economics, em nota.

O impacto das chuvas no Rio Grande do Sul também deve pressionar os preços. A preocupação é de que as enchentes possam afetar a produção agrícola e elevar os preços dos alimentos, além de piorar o cenário fiscal, dado o gasto com ajuda federal ao estado.

No relatório Focus, do BC, mais recente, a mediana das expectativas dos economistas apontava para inflação de 3,72% em 2024. Já para a Selic, o mercado espera agora uma taxa de 9,63% ao ano em dezembro, acima da taxa de 9,50% projetada na semana passada.

Para Luca Mercadante, economista da Rio Bravo, mais importante do que a comunicação do Copom, são os votos divergentes. “Pela segunda vez na história temos 4 votos divergentes no comitê, sendo que os diretores divergentes foram todos os indicados pelo atual governo. A visão de que os novos diretores são mais lenientes com a política monetária pode gerar uma pressão para o juro longo, dando ainda mais importância para a decisão do presidente”, afirmou.

Confira o comunicado na íntegra do Copom:

O ambiente externo mostra-se mais adverso, em função da incerteza elevada e persistente referente ao início da flexibilização de política monetária nos Estados Unidos e à velocidade com que se observará a queda da inflação de forma sustentada em diversos países. Os bancos centrais das principais economias permanecem determinados em promover a convergência das taxas de inflação para suas metas em um ambiente marcado por pressões nos mercados de trabalho. O Comitê avalia que o cenário segue exigindo cautela por parte de países emergentes.

Em relação ao cenário doméstico, o conjunto dos indicadores de atividade econômica e do mercado de trabalho tem apresentado maior dinamismo do que o esperado. A inflação cheia ao consumidor manteve trajetória de desinflação, enquanto medidas de inflação subjacente se situaram acima da meta para a inflação nas divulgações mais recentes.

As expectativas de inflação para 2024 e 2025 apuradas pela pesquisa Focus encontram-se em torno de 3,7% e 3,6%, respectivamente.

As projeções de inflação do Copom em seu cenário de referência* situam-se em 3,8% em 2024 e 3,3% em 2025. As projeções para a inflação de preços administrados são de 4,8% em 2024 e 4,0% em 2025.

O Comitê ressalta que, em seus cenários para a inflação, permanecem fatores de risco em ambas as direções. Entre os riscos de alta para o cenário inflacionário e as expectativas de inflação, destacam-se (i) uma maior persistência das pressões inflacionárias globais; e (ii) uma maior resiliência na inflação de serviços do que a projetada em função de um hiato do produto mais apertado. Entre os riscos de baixa, ressaltam-se (i) uma desaceleração da atividade econômica global mais acentuada do que a projetada; e (ii) os impactos do aperto monetário sincronizado sobre a desinflação global se mostrarem mais fortes do que o esperado. O Comitê avalia que as conjunturas doméstica e internacional devem se manter mais incertas, exigindo maior cautela na condução da política monetária.

O Comitê acompanhou com atenção os desenvolvimentos recentes da política fiscal e seus impactos sobre a política monetária. O Comitê reafirma que uma política fiscal crível e comprometida com a sustentabilidade da dívida contribui para a ancoragem das expectativas de inflação e para a redução dos prêmios de risco dos ativos financeiros, consequentemente impactando a política monetária.

Considerando a evolução do processo de desinflação, os cenários avaliados, o balanço de riscos e o amplo conjunto de informações disponíveis, o Copom decidiu reduzir a taxa básica de juros em 0,25 ponto percentual, para 10,50% a.a., e entende que essa decisão é compatível com a estratégia de convergência da inflação para o redor da meta ao longo do horizonte relevante, que inclui o ano de 2025. Sem prejuízo de seu objetivo fundamental de assegurar a estabilidade de preços, essa decisão também implica suavização das flutuações do nível de atividade econômica e fomento do pleno emprego.

A conjuntura atual, caracterizada por um estágio do processo desinflacionário que tende a ser mais lento, expectativas de inflação desancoradas e um cenário global desafiador, demanda serenidade e moderação na condução da política monetária.

O Comitê, unanimemente, avalia que o cenário global incerto e o cenário doméstico marcado por resiliência na atividade e expectativas desancoradas demandam maior cautela. Ressalta, ademais, que a política monetária deve se manter contracionista até que se consolide não apenas o processo de desinflação como também a ancoragem das expectativas em torno de suas metas. O Comitê também reforça, com especial ênfase, que a extensão e a adequação de ajustes futuros na taxa de juros serão ditadas pelo firme compromisso de convergência da inflação à meta.

Votaram por uma redução de 0,25 ponto percentual os seguintes membros do Comitê: Roberto de Oliveira Campos Neto (presidente), Carolina de Assis Barros, Diogo Abry Guillen, Otávio Ribeiro Damaso e Renato Dias de Brito Gomes. Votaram por uma redução de 0,50 ponto percentual os seguintes membros: Ailton de Aquino Santos, Gabriel Muricca Galípolo, Paulo Picchetti e Rodrigo Alves Teixeira.

* No cenário de referência, a trajetória para a taxa de juros é extraída da pesquisa Focus e a taxa de câmbio parte de R$5,15/US$, evoluindo segundo a paridade do poder de compra (PPC). O preço do petróleo segue aproximadamente a curva futura pelos próximos seis meses e passa a aumentar 2% ao ano posteriormente. Além disso, adota-se a hipótese de bandeira tarifária “verde” em dezembro de 2024 e de 2025. O valor para o câmbio foi obtido pelo procedimento, que passou a ser adotado na 258ª reunião, de arredondar a cotação média da taxa de câmbio observada nos dez dias úteis encerrados no último dia da semana anterior à da reunião do Copom.