Bloomberg Línea — O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central decidiu elevar a taxa básica de juros em 1 ponto percentual, levando a Selic para 14,25% ao ano, e apontou que pode fazer um ajuste “de menor magnitude na próxima reunião”.
Com a decisão, divulgada nesta quarta-feira (19), a taxa de juros de referência alcança o maior patamar desde 2016, no período dos governos de Dilma Rousseff e Michel Temer.
O aumento era amplamente esperado pelo mercado financeiro. Todos os 26 economistas consultados pela Bloomberg projetavam o cumprimento do guidance estabelecido pelo BC na reunião de dezembro, quando o comitê indicou que faria três elevações consecutivas de 1 ponto percentual. A posição foi reafirmada na reunião de janeiro. A decisão desta quarta-feira foi unânime.
Em comunicado, o Copom disse que o ambiente atual ainda indica uma “assimetria altista” para os cenários de inflação, o que exige a continuidade do aperto monetário.
“O cenário mais recente é marcado por desancoragem adicional das expectativas de inflação, projeções de inflação elevadas, resiliência na atividade econômica e pressões no mercado de trabalho, o que exige uma política monetária mais contracionista”, diz o texto (leia abaixo na íntegra).
Sobre os próximos passos da política monetária o Copom afirmou que pode fazer “um ajuste de menor magnitude na próxima reunião”, caso o cenário esperado se confirme, e que a magnitude total do ciclo de aperto monetário “dependerá da evolução da dinâmica da inflação”.
No balanço de riscos, o Copom ainda avaliou que o cenário externo segue exigindo cautela, e destacou as incertezas sobre o desempenho da economia americana diante da política de tarifas de Donald Trump.
“O ambiente externo permanece desafiador em função da conjuntura e da política econômica nos Estados Unidos, principalmente pela incerteza acerca de sua política comercial e de seus efeitos. Esse contexto tem gerado ainda mais dúvidas sobre os ritmos da desaceleração, da desinflação e, consequentemente, sobre a postura do Fed e acerca do ritmo de crescimento nos demais países”, afirma o Copom.
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A decisão ocorre em um contexto de preocupações persistentes com a inflação. O IPCA acumulado em 12 meses segue acima do teto da meta, e as expectativas de mercado indicam um aumento de 5,66% nos preços para 2025, bem acima do centro da meta de 3%.
O aperto monetário acontece no terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que tem enfrentado queda em suas taxas de aprovação, atribuída em parte à alta dos preços dos alimentos.0
Apesar da necessidade de contenção inflacionária, começam a surgir sinais de desaceleração da atividade econômica. Indicadores de varejo, serviços e indústria têm mostrado um desaquecimento, enquanto o Produto Interno Bruto (PIB) desacelerou no quarto trimestre para uma expansão de 0,2% no período.
O diretor de Política Econômica do BC, Diogo Guillen, declarou no início de março que “uma moderação do crescimento pode estar começando”, enquanto o presidente do BC, Gabriel Galípolo, afirmou em fevereiro que a instituição caminha para colocar os juros em um patamar restritivo com segurança.
Leia a íntegra do comunicado do Copom
“O ambiente externo permanece desafiador em função da conjuntura e da política econômica nos Estados Unidos, principalmente pela incerteza acerca de sua política comercial e de seus efeitos. Esse contexto tem gerado ainda mais dúvidas sobre os ritmos da desaceleração, da desinflação e, consequentemente, sobre a postura do Fed e acerca do ritmo de crescimento nos demais países. Os bancos centrais das principais economias permanecem determinados em promover a convergência das taxas de inflação para suas metas em um ambiente marcado por pressões nos mercados de trabalho. O Comitê avalia que o cenário externo segue exigindo cautela por parte de países emergentes.
Em relação ao cenário doméstico, o conjunto dos indicadores de atividade econômica e do mercado de trabalho tem apresentado dinamismo, ainda que sinais sugiram uma incipiente moderação no crescimento. A inflação cheia e as medidas subjacentes mantiveram-se acima da meta para a inflação e novamente apresentaram elevação nas divulgações mais recentes.
As expectativas de inflação para 2025 e 2026 apuradas pela pesquisa Focus elevaram-se de forma relevante e situam-se em 5,7% e 4,5%, respectivamente. A projeção de inflação do Copom para o terceiro trimestre de 2026, atual horizonte relevante de política monetária, situa-se em 3,9% no cenário de referência (Tabela 1).
Persiste uma assimetria altista no balanço de riscos para os cenários prospectivos para a inflação. Entre os riscos de alta para o cenário inflacionário e as expectativas de inflação, destacam-se (i) uma desancoragem das expectativas de inflação por período mais prolongado; (ii) uma maior resiliência na inflação de serviços do que a projetada em função de um hiato do produto mais positivo; e (iii) uma conjunção de políticas econômicas externa e interna que tenham impacto inflacionário maior que o esperado, por exemplo, por meio de uma taxa de câmbio persistentemente mais depreciada. Entre os riscos de baixa, ressaltam-se (i) impactos sobre o cenário de inflação de uma eventual desaceleração da atividade econômica doméstica mais acentuada do que a projetada; e (ii) um cenário menos inflacionário para economias emergentes decorrente de choques sobre o comércio internacional e sobre as condições financeiras globais.
O Comitê segue acompanhando com atenção como os desenvolvimentos da política fiscal impactam a política monetária e os ativos financeiros. A percepção dos agentes econômicos sobre o regime fiscal e a sustentabilidade da dívida segue impactando, de forma relevante, os preços de ativos e as expectativas dos agentes.
O cenário mais recente é marcado por desancoragem adicional das expectativas de inflação, projeções de inflação elevadas, resiliência na atividade econômica e pressões no mercado de trabalho, o que exige uma política monetária mais contracionista.
O Copom então decidiu elevar a taxa básica de juros em 1,00 ponto percentual, para 14,25% a.a., e entende que essa decisão é compatível com a estratégia de convergência da inflação para o redor da meta ao longo do horizonte relevante. Sem prejuízo de seu objetivo fundamental de assegurar a estabilidade de preços, essa decisão também implica suavização das flutuações do nível de atividade econômica e fomento do pleno emprego.
Diante da continuidade do cenário adverso para a convergência da inflação, da elevada incerteza e das defasagens inerentes ao ciclo de aperto monetário em curso, o Comitê antevê, em se confirmando o cenário esperado, um ajuste de menor magnitude na próxima reunião. Para além da próxima reunião, o Comitê reforça que a magnitude total do ciclo de aperto monetário será ditada pelo firme compromisso de convergência da inflação à meta e dependerá da evolução da dinâmica da inflação, em especial dos componentes mais sensíveis à atividade econômica e à política monetária, das projeções de inflação, das expectativas de inflação, do hiato do produto e do balanço de riscos.
Votaram por essa decisão os seguintes membros do Comitê: Gabriel Muricca Galípolo (presidente), Ailton de Aquino Santos, Diogo Abry Guillen, Gilneu Francisco Astolfi Vivan, Izabela Moreira Correa, Nilton José Schneider David, Paulo Picchetti, Renato Dias de Brito Gomes e Rodrigo Alves Teixeira.
Tabela 1
Projeções de inflação no cenário de referência
Variação do IPCA acumulada em quatro trimestres (%)
Índice de preços | 2025 | 3º tri 2026 |
---|---|---|
IPCA | 5,1 | 3,9 |
IPCA livres | 5,4 | 3,8 |
IPCA administrados | 4,3 | 4,2 |
No cenário de referência, a trajetória para a taxa de juros é extraída da pesquisa Focus e a taxa de câmbio parte de R$5,80/US$, evoluindo segundo a paridade do poder de compra (PPC). O preço do petróleo segue aproximadamente a curva futura pelos próximos seis meses e passa a aumentar 2% ao ano posteriormente. Além disso, adota-se a hipótese de bandeira tarifária “verde” em dezembro de 2025. O valor para o câmbio foi obtido pelo procedimento usual.”
-- Com informações da Bloomberg News.
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