Copom eleva Selic a 11,25% ao ano e cita riscos para o aumento da inflação

BC subiu a taxa de juros básica em 0,50 ponto percentual, dobrando o ritmo do aperto monetário; cenário ‘demanda uma política mais contracionista’, diz comunicado

Banco do Brasil
06 de Novembro, 2024 | 06:41 PM

Bloomberg Línea — Os diretores do Banco Central (BC) decidiram elevar a Selic para 11,25% ao ano, no momento em que a autoridade monetária se vê ainda mais pressionada pelas expectativas de inflação acima da meta e pelas incertezas sobre os planos do governo de cortar despesas.

Em decisão nesta quarta-feira (6), o Comitê de Política Monetária (Copom), do BC, elevou a taxa de juros de referência do país em 0,50 ponto percentual, dobrando o ritmo do aperto monetário iniciado há um mês e meio. Na reunião passada, em setembro, os diretores optaram por elevar a Selic em 0,25 ponto. A decisão foi unânime.

O aumento desta quarta era amplamente esperado. Todos os economistas consultados em uma pesquisa da Bloomberg previam que os diretores do BC, liderados por Roberto Campos Neto, elevariam a Selic para 11,25%.

Em comunicado, o Copom afirmou que “há uma assimetria altista em seu balanço de riscos para os cenários prospectivos para a inflação”.

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“O cenário segue marcado por resiliência na atividade, pressões no mercado de trabalho, hiato do produto positivo, elevação das projeções de inflação e expectativas desancoradas, o que demanda uma política monetária mais contracionista”, afirma o texto do comunicado.

Sobre as futuras decisões de política monetária, o Copom diz que o ritmo de ajustes e “a magnitude total do ciclo de aperto monetário serão ditados pelo firme compromisso de convergência da inflação à meta e dependerão da evolução da dinâmica da inflação, em especial dos componentes mais sensíveis à atividade econômica e à política monetária, das projeções de inflação, das expectativas de inflação, do hiato do produto e do balanço de riscos.”

O Copom também destacou os riscos fiscais e diz que “tem acompanhado com atenção como os desenvolvimentos recentes da política fiscal impactam a política monetária e os ativos financeiros”.

Segundo o comunicado, a percepção sobre os riscos fiscais tem afetado os preços de ativos e as expectativas, o que impacta o prêmio de risco dos juros futuros e a taxa de câmbio.

“O Comitê reafirma que uma política fiscal crível e comprometida com a sustentabilidade da dívida, com a apresentação e execução de medidas estruturais para o orçamento fiscal, contribuirá para a ancoragem das expectativas de inflação e para a redução dos prêmios de risco dos ativos financeiros, consequentemente impactando a política monetária.”

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Para economistas do Citi, o comunicado do Copom continuou ressaltando que o cenário requer uma política monetária mais contracionista e trouxe poucas mudanças, com exceção do trecho sobre a política fiscal.

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“A única mudança substancial feita pelo Copom está ligada à intensificação do tom em relação ao cenário fiscal”, escreveram economistas da equipe do banco liderados Leonardo Porto, em uma nota.

Para Ricardo Faria, sócio da Legend Wealth, apesar de o Copom não ter sinalizado que pode acelerar o ritmo de aumento da Selic, as projeções apresentadas sugerem a necessidade de um aperto mais forte.

“A projeção para a inflação do segundo trimestre de 2026 subiu de 3,5% para 3,6%, e, com isso, é possível que o Copom precise manter um aperto monetário mais robusto, visando uma convergência da inflação para a meta de 3%”, afirmou Faria.

Desde a reunião anterior, em setembro, o cenário tem se mostrado mais desafiador para o Banco Central. Os preços mais elevados da energia e o dólar mais valorizado aumentaram as pressões inflacionárias, enquanto investidores aguardam a apresentação pelo governo de um pacote de corte de gastos que pode trazer algum alívio.

As preocupações de investidores com a trajetória da dívida pública e o compromisso do governo em controlar o aumento de despesas tem feito os operadores a exigirem prêmios mais elevados no mercado de juros futuros.

A vitória de Donald Trump na eleição americana, confirmada nesta quarta-feira (6), adiciona incerteza no ambiente internacional. As promessas do republicano de elevar tarifas de importação, deportar imigrantes sem documentação e estender o prazo de benefícios fiscais adotados por ele quando era presente em 2017 ameaçam aumentar a inflação nos EUA, colocando em dúvida o esforço do Federal Reserve em reduzir os juros.

Nesse ambiente, as taxas mais elevadas no país tendem a fortalecer o dólar, pressionando os preços de bens com preços atrelados ao mercado internacional em países como o Brasil.

As expectativas de inflação continuaram a subir nas últimas semanas e se mantiveram acima da meta do BC, de 3%. O Boletim Focus divulgado na segunda-feira (4) mostra que a maioria dos economistas estimam um IPCA de 4,59% em 2024 - acima do teto do intervalo de tolerância. Para 2025 e 2026, as projeções são de um IPCA de 4,03% e 3,61%, respectivamente.

Antes da reunião anterior do Copom, as expectativas de inflação eram de 4,35% (2024), 3,95% (2025) e 3,61% (2026).

A inflação no Brasil tem sido pressionada pelo aumento da energia em razão da bandeiras tarifárias adotadas para fazer frente ao baixo nível dos reservatórios depois de meses de seca. A situação melhorou nas últimas semanas com a volta das chuvas, mas os reflexos ainda se mantêm nos preços.

O resultado do IPCA de outubro será divulgado na sexta-feira (8). Economistas consultados pela Bloomberg esperam que o índice de preços acelere para 0,54% sobre o mês anterior, levando a inflação anual para 4,74%.

Em setembro, o IPCA acelerou para 0,44% depois de registrar uma deflação de -0,02% em agosto, de acordo com os dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no mês passado. No acumulado em 12 meses, o IPCA avançou para 4,42%, acima dos 4,24% registrados até agosto.

A meta de inflação do Banco Central é de 3%, com intervalo de tolerância de 1,5 ponto percentual para cima ou para baixo.

Leia o comunicado do Copom na íntegra:

O ambiente externo permanece desafiador, em função, principalmente, da conjuntura econômica incerta nos Estados Unidos, o que suscita maiores dúvidas sobre os ritmos da desaceleração, da desinflação e, consequentemente, sobre a postura do Fed. Os bancos centrais das principais economias permanecem determinados em promover a convergência das taxas de inflação para suas metas em um ambiente marcado por pressões nos mercados de trabalho. O Comitê avalia que o cenário externo, também marcado por menor sincronia nos ciclos de política monetária entre os países, segue exigindo cautela por parte de países emergentes.

Em relação ao cenário doméstico, o conjunto dos indicadores de atividade econômica e do mercado de trabalho segue apresentando dinamismo. A inflação cheia e as medidas subjacentes se situaram acima da meta para a inflação nas divulgações mais recentes.

As expectativas de inflação para 2024 e 2025 apuradas pela pesquisa Focus encontram-se em torno de 4,6% e 4,0%, respectivamente. A projeção de inflação do Copom para o segundo trimestre de 2026, atual horizonte relevante de política monetária, situa-se em 3,6% no cenário de referência (Tabela 1).

O Comitê avalia que há uma assimetria altista em seu balanço de riscos para os cenários prospectivos para a inflação. Entre os riscos de alta para o cenário inflacionário e as expectativas de inflação, destacam-se (i) uma desancoragem das expectativas de inflação por período mais prolongado; (ii) uma maior resiliência na inflação de serviços do que a projetada em função de um hiato do produto mais apertado; e (iii) uma conjunção de políticas econômicas externa e interna que tenham impacto inflacionário, por exemplo, por meio de uma taxa de câmbio persistentemente mais depreciada. Entre os riscos de baixa, ressaltam-se (i) uma desaceleração da atividade econômica global mais acentuada do que a projetada; e (ii) os impactos do aperto monetário sobre a desinflação global se mostrarem mais fortes do que o esperado.

O Comitê tem acompanhado com atenção como os desenvolvimentos recentes da política fiscal impactam a política monetária e os ativos financeiros. A percepção dos agentes econômicos sobre o cenário fiscal tem afetado, de forma relevante, os preços de ativos e as expectativas dos agentes, especialmente o prêmio de risco e a taxa de câmbio. O Comitê reafirma que uma política fiscal crível e comprometida com a sustentabilidade da dívida, com a apresentação e execução de medidas estruturais para o orçamento fiscal, contribuirá para a ancoragem das expectativas de inflação e para a redução dos prêmios de risco dos ativos financeiros, consequentemente impactando a política monetária.

O cenário segue marcado por resiliência na atividade, pressões no mercado de trabalho, hiato do produto positivo, elevação das projeções de inflação e expectativas desancoradas, o que demanda uma política monetária mais contracionista. Considerando a evolução do processo de desinflação, os cenários avaliados, o balanço de riscos e o amplo conjunto de informações disponíveis, o Copom decidiu, por unanimidade, elevar a taxa básica de juros em 0,50 ponto percentual, para 11,25% a.a., e entende que essa decisão é compatível com a estratégia de convergência da inflação para o redor da meta ao longo do horizonte relevante. Sem prejuízo de seu objetivo fundamental de assegurar a estabilidade de preços, essa decisão também implica suavização das flutuações do nível de atividade econômica e fomento do pleno emprego.

O ritmo de ajustes futuros na taxa de juros e a magnitude total do ciclo de aperto monetário serão ditados pelo firme compromisso de convergência da inflação à meta e dependerão da evolução da dinâmica da inflação, em especial dos componentes mais sensíveis à atividade econômica e à política monetária, das projeções de inflação, das expectativas de inflação, do hiato do produto e do balanço de riscos.

Votaram por essa decisão os seguintes membros do Comitê: Roberto de Oliveira Campos Neto (presidente), Ailton de Aquino Santos, Carolina de Assis Barros, Diogo Abry Guillen, Gabriel Muricca Galípolo, Otávio Ribeiro Damaso, Paulo Picchetti, Renato Dias de Brito Gomes e Rodrigo Alves Teixeira.

-- Com informações da Bloomberg News. Atualizada para incluir comentários do Citi e da Legend Wealth.

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Filipe Serrano

É editor sênior da Bloomberg Línea Brasil e jornalista especializado na cobertura de macroeconomia, negócios, internacional e tecnologia. Foi editor de economia no jornal O Estado de S. Paulo, e editor na Exame e na revista INFO, da Editora Abril. Tem pós-graduação em Relações Internacionais pela FGV-SP, e graduação em Jornalismo pela PUC-SP.