Brasil iniciou altas nos juros. Agora, deve liderar também o ciclo de cortes

Inflação brasileira deu sinais antes de outros países no pós-pandemia, levando Banco Central a não pensar duas vezes em iniciar ciclo de aperto ainda em 2021

Brasil
Por Giovanna Bellotti Azevedo e Maria Eloisa Capurro
01 de Agosto, 2023 | 04:45 PM

Bloomberg — Repetidamente, Jerome Powell, presidente do Federal Reserve, enfatizou: a inflação não estava alta o suficiente. Ela precisava continuar subindo, disse ele a repórteres, e depois permanecer elevada para convencer a ele e a seus colegas de que a economia estava se recuperando do choque da pandemia. Até então, não haveria alta de juros. Isso foi no começo da tarde de 17 de março de 2021.

Três horas depois e a 4.000 milhas de distância, Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central do Brasil, transmitiu uma mensagem bem diferente.

Enfrentando as mesmas forças macroeconômicas em Brasília que Powell enfrentava em Washington — estímulo fiscal e monetário sem precedentes aliado a restrições na cadeia de suprimentos — Campos Neto orquestrou o maior aumento de juros em uma década para conter a espiral inflacionária que ele viu se formando.

Em um ano, enquanto as autoridades do Fed e do BCE mantiveram os juros em zero, o Brasil foi pioneiro de uma alta de juros em toda a região — no Chile, Colômbia, México, Peru e Uruguai. Campos Neto subiu juros oito vezes — em quase 9 pontos percentuais — antes que Powell implementasse seu primeiro aumento.

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Agora, o Brasil — e a América Latina – também saem na frente. Com inflação abaixo da meta de 3,25% e quase idêntica a dos EUA, Campos Neto está prestes a começar a cortar juros amanhã, uma semana depois que Powell aumentou pela 11ª vez e sinalizou que poderia haver mais aperto por vir. No Chile, os cortes já começaram, com uma redução de 1 ponto percentual na última sexta-feira.

“A história nos salvou”, disse Sandro Sobral, diretor da Tesouraria do Banco Santander que trabalhou por 10 anos com Campos Neto, que, segundo ele, tem a a mesma aversão à alta de preços que inúmeros outros brasileiros depois de sofrer com uma inflação que chegou a 3.000% na década de 90. “É por isso que subiram rápido e subiram mais.”

A inflação, para ser justo, acelerou mais cedo no Brasil do que nos EUA e na Europa, o que ajudou Campos Neto a compreender a urgência do problema antes que seus colegas. Além disso, deixar que a própria experiência de vida — a hiperinflação neste caso — influencie decisões políticas nem sempre funciona. Mas desta vez funcionou.

Mesmo assim, porém, alguns críticos dos aumentos de juros argumentam que eles tiveram um papel pequeno na contenção da inflação na maioria dos países. No caso do Brasil, eles conseguiram, no mínimo, uma coisa crucial: uma valorização forte do real. A moeda brasileira se valorizou 18% em relação ao dólar desde a primeira alta em 2021, revertendo uma queda que elevava os preços das importações e acelerava a inflação.

Agora, grande parte do sucesso da campanha de cortes de juros no Brasil depende do que as principais economias do mundo farão a seguir. O mercado precifica 53% de chance de um corte de 0,50 ponto percentual nesta quarta-feira, e quase 63% de chance de outro movimento de meio ponto no mês seguinte, muito mais rápido do que o ritmo gradual que o banco central sinalizou.

Campos Neto disse que uma pausa “organizada” no ciclo de aperto global que não interrompa os canais de crédito deve ajudar na desinflação do Brasil. Mas uma desconexão com movimentos globais poderia afetar a moeda e, por sua vez, desencadear uma nova alta da inflação.

“O fato de que o Brasil agiu muito rápido, com base em toda a sua experiência no combate à inflação, permitiu que interrompesse as expectativas crescentes a tempo, ao contrário de outros países”, disse Henrique Meirelles, o ex-presidente do Banco Central que ocupou o cargo por mais tempo. “Eles aumentaram juros na hora certa. Eles vão cortar na hora certa.”

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--Com a ajuda de Davison Santana e Enda Curran

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