Mercado espera pausa em cortes da Selic nesta quarta por preocupação fiscal

Analistas consultados pela Bloomberg News esperam uma manutenção da taxa Selic em 10,50% após o fechamento dos mercados nesta quarta (19)

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Bloomberg — O Banco Central provavelmente fará uma pausa em seu ciclo de quase um ano de cortes nas taxas de juros, já que os formuladores de políticas monetárias enfrentam uma crise de credibilidade generalizada e lutam para domar as expectativas de inflação, que estão subindo acima da meta.

Todos os analistas consultados pela Bloomberg News esperam que a autoridade monetária liderada por Roberto Campos Neto mantenha a Selic estável em 10,50% após o fechamento dos mercados nesta quarta-feira (19), com exceção de dois que preveem outro corte de 0,25 ponto percentual.

Os traders também veem uma pausa a partir de agora, e a maioria está precificando aumentos nas taxas no final do ano.

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Os formuladores de políticas monetárias estão sob os holofotes após a votação dividida do mês passado, que colocou os membros alinhados com Campos Neto contra os diretores nomeados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que eram a favor de um corte maior nas taxas.

Essa divergência aumentou os temores de que o banco central se torne mais tolerante em relação à inflação quando o presidente Lula ganhar efetivamente o controle da maioria do conselho no final deste ano. A autoridade monetária não deu nenhuma orientação futura (guidance) após a última decisão.

“O Banco Central provavelmente interromperá seu ciclo de flexibilização nesta quarta-feira, com a política monetária ainda apertada, enquanto tenta conter o aumento das expectativas de inflação. Esperamos um comunicado pós-reunião mais hawkish, embora os formuladores de políticas possam tentar desviar os mercados dos aumentos das taxas precificados pela curva de juros”, avalia Adriana Dupita, economista do Brasil e da Argentina.

Lula aumentou ainda mais as tensões ao intensificar os pedidos de redução dos custos dos empréstimos, tanto nesta semana quanto na anterior, dizendo que eles são uma parte fundamental de seu plano para fortalecer as contas públicas. Ele definiu Campos Neto como “político”, chamou as taxas atuais de “proibitivas” e disse que o banco central deveria fazer mais para ajudar o crescimento.

A decisão do Copom será publicada após as 18h30, no horário de Brasília, com uma declaração da diretoria. Confira as principais expectativas:

Decisão dividida

Os investidores prestarão atenção à contagem de votos, uma vez que outra decisão dividida poderia implicar o pior resultado possível. Os ativos podem cair ainda mais, mesmo que a minoria seja menos significante desta vez.

As estimativas de inflação subiram ainda mais acima da meta de 3% do BC quase todas as semanas desde a decisão anterior, em maio, o que levou os analistas a advertir o banco central, em particular, de que não há mais espaço para cortes nas taxas.

Ex-formuladores de políticas apontam para uma crise de credibilidade, com alguns traçando paralelos com um aumento nas previsões de preços ao consumidor há mais de uma década, durante o governo da aliada de Lula, Dilma Rousseff.

"Eles tentaram reduzir o ruído, mas a marca ainda está lá", disse o ex-diretor de Política Monetária do Banco Central, Luiz Fernando Figueiredo, que entrou para a diretoria em 1999 e trabalhou na instituição durante o início da primeira presidência de Lula.

Campos Neto disse que os aumentos de preços ao consumidor foram os “esperados” e concentrou suas preocupações em uma “contínua desancoragem” das previsões de inflação. O Diretor de Política Monetária, Gabriel Galipolo, que é visto como candidato a próximo presidente do BC, reiterou seu compromisso com a meta do banco.

"Há espaço para buscar consenso entre a diretoria", disse Fernando Gonçalves, chefe de pesquisa econômica do Itau Unibanco.

Estresse fiscal

As preocupações dos investidores em relação às perspectivas fiscais do Brasil estão aumentando à medida que o Ministro da Fazenda, Fernando Haddad, enfrenta obstáculos em sua tentativa de reforçar as contas públicas.

Mais recentemente, o Congresso rejeitou um projeto de lei que teria aumentado as receitas tão necessárias. Haddad respondeu inicialmente dizendo que não há um "plano B", embora mais tarde tenha indicado que a equipe econômica revisará todos os gastos do governo.

“O banco tem sido muito cuidadoso ao falar sobre as perspectivas fiscais”, disse Carla Argenta, economista-chefe da CM Capital. “Todos os movimentos recentes do mercado abrem espaço para uma mensagem geral hawkish” dos formuladores de políticas.

Em uma entrevista a uma estação de rádio local na terça-feira, Lula disse que está disposto a rever os gastos públicos, mas que só concordará com os cortes se sua equipe econômica demonstrar que eles são necessários.

Os banqueiros centrais poderiam optar por evitar mais tensões com o governo na decisão desta quarta-feira, reiterando comentários sobre a importância de cumprir as promessas de eliminar o déficit primário deste ano, que exclui o pagamento de juros.

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"Com todos os principais indicadores econômicos piorando, eles precisam enviar um sinal de coesão", disse Caio Megale, economista-chefe da XP Investimentos.

Cortes nos EUA

É provável que os formuladores de políticas comentem sobre as condições financeiras globais mais apertadas, depois que os EUA mantiveram suas taxas de juros estáveis novamente na semana passada, sem dar nenhuma ideia concreta sobre quando começarão a flexibilizar.

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