Bloomberg — Mais de uma década após os gargalos nos portos terem afetado a maior economia da América Latina — fazendo os preços do açúcar dispararem —, a logística está sendo esticada ao máximo novamente. Aproximadamente 70 navios esperavam cerca de 20 dias para carregar mais de 3 milhões de toneladas de açúcar no país, segundo a agência de transporte SA Commodities. Isso equivale a um mês de exportações.
Para piorar a situação, um incêndio no fim de outubro nem Paranaguá, o segundo maior porto do Brasil, fechou um terminal e afetou as operações em outra instalação. E tudo isso está acontecendo no momento em que uma seca na região amazônica está redirecionando o transporte de grãos dos portos do norte, aumentando a concorrência com o açúcar no sudeste.
“Esta é a primeira vez em anos que o Brasil testou sua capacidade logística máxima”, disse Ricardo Carvalho, diretor comercial da BP Bunge Bioenergia, uma joint venture entre a gigante britânica do petróleo e uma das maiores empresas comerciais de commodities.
As safras recordes de soja e milho coincidiram com a produção de açúcar que se espera que atinja um recorde este ano. Embora safras maiores teoricamente possam ajudar a aliviar as escassezes globais de açúcar que já levaram os preços aos mais altos desde 2011, a repetição dos gargalos da última década mantém o mundo subabastecido.
Más safras e a ameaça de restrições às exportações na Índia e na Tailândia já colocaram os contratos futuros de açúcar bruto negociados em Nova York a caminho do quinto ano consecutivo de ganhos, a mais longa sequência vitoriosa desde 1989. Com estoques globais esperados para atingir seu nível mais baixo em 13 anos, o mundo está novamente dependendo do Brasil para atender à crescente demanda.
“A dependência que o mundo está criando com o açúcar brasileiro é assustadora”, disse Mauro Angelo, diretor-executivo da Alvean, a maior trader de açúcar do mundo, em uma entrevista em São Paulo na semana passada. A empresa é controlada pela produtora brasileira Copersucar.
Para muitos negociantes de açúcar, parece que estamos revivendo o início dos anos 2010. O Brasil enfrentou graves congestionamentos nos portos naquela época, seguidos por um incêndio no porto de Santos que interrompeu o carregamento. A concorrência com as exportações de grãos também foi forte, aliviando-se apenas quando uma onda de investimentos logísticos no norte do país começou a operar.
Mas, ao contrário daquela época, as condições atuais pintam um futuro incerto. Com altas taxas de juros e custos crescentes de construção, o alívio para os mercados de açúcar pode vir apenas com um novo terminal em Santos. A Cofco International deve começar a operar a instalação em 2025, disse Marcelo de Andrade, diretor-gerente de commodities leves na unidade de negociação da maior empresa de alimentos da China.
“O mundo precisa de açúcar. O Brasil tem açúcar, mas não pode enviá-lo, então os preços têm que subir”, disse de Andrade em São Paulo na semana passada. “Até quando a festa vai durar? Até o terminal da Cofco começar.”
Mas mesmo assim, a pressão aliviaria por apenas dois a três anos, antes que a produção agrícola total do Brasil cresça o suficiente para esticar a capacidade novamente, disse Angelo da Alvean.
Por enquanto, a logística apertada colocou os mercados de açúcar em modo de alerta.
A seca na Amazônia significa que cerca de 1 milhão de toneladas de grãos que normalmente viajariam em barcaças pela região estão sendo direcionadas para os portos do sudeste, segundo Carvalho da BP Bunge. Embora os níveis de água tenham melhorado após atingirem mínimos históricos, a logística de açúcar deve permanecer sob pressão. O Brasil começará a colher sua nova safra de soja ainda este ano, e muitos terminais que estão enviando açúcar agora mudarão para a oleaginosa no próximo ano. Outros pararão para manutenção anual.
Muitos já estão enfrentando chuvas intensas, o que impede que os terminais carreguem açúcar com o risco de danificar o produto.
“A safra recorde atual de açúcar está testando os limites da logística apertada, especialmente em Santos”, disse Thierry Songeur, gerente-geral da trader francesa Sucres et Denrees. “O mercado é vulnerável às notícias sobre o clima, com chuvas pesadas e duradouras provavelmente desencadeando um movimento altista.”
O incêndio em uma correia transportadora que atendia ao Terminal CAP em Paranaguá apenas adiciona mais pressão a um mercado tenso. Embora a instalação da Bunge próxima seja esperada para retomar as operações completas nesta semana ou no máximo na semana que vem, não está claro por quanto tempo o CAP ficará offline.
Os terminais detinham principalmente grãos, que os terminais e operadores de ferrovias geralmente preferem devido à maior lucratividade. Isso provavelmente significa que a competição para embarcar aumentará em outros portos.
Os gargalos nos portos já forçaram os produtores de açúcar no Brasil a encontrar soluções criativas, alugando armazéns de terceiros para armazenar o produto. A Água Bonita foi uma das produtoras que alugaram espaço adicional.
“É um problema com certeza”, disse o diretor-executivo Flavio Ribeiro. “Mesmo que ter muito produto para vender seja o tipo de problema que gostamos de ter.”
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