Do Brasil à Colômbia: tarifas de Trump são nova ameaça para os preços do café

As tarifas do governo Trump exercem mais uma pressão sobre o mercado de café, que já sofre com preços altos

Uma pessoa manejando grãos de café maduros
10 de Abril, 2025 | 12:23 PM

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Bloomberg Línea — O mercado global de café enfrenta uma nova onda de pressão, após o anúncio de tarifas pelo governo do presidente Donald Trump sobre os principais países produtores de café: Brasil, Colômbia e Vietnã.

A medida, argumentada pela Casa Branca como parte de um esforço para reduzir os déficits comerciais e estimular a produção doméstica dos Estados Unidos, tem profundas implicações para a cadeia global de fornecimento de café, em um contexto em que os preços já estavam altos devido às más condições das colheitas e à escassez de estoques.

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O Vietnã, maior produtor mundial de robusta, uma variedade usada em café instantâneo, cápsulas e bebidas prontas para beber, foi o país mais afetado pela decisão comercial.

Desde o último fim de semana, as exportações vietnamitas para os Estados Unidos estão sujeitas a uma tarifa de 46%, uma das tarifas mais altas impostas por Washington nesta rodada.

Granos de café arábico tostados

“Todos estão preocupados, especialmente com os contratos de exportação assinados”, disse Nguyen Nam Hai, presidente da Associação de Café e Cacau do Vietnã, em um comunicado divulgado pela Bloomberg.

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O impacto também atinge o Brasil e a Colômbia, líderes mundiais na produção de café arábica, com uma tarifa básica de 10% sobre suas exportações para o mercado americano.

A medida chega em um momento crítico para o setor. A produção brasileira de arábica em 2025 é estimada em 34,7 milhões de sacas de 60 kg, uma queda de 12,4% em relação ao ano anterior, afetada por eventos climáticos adversos e pela bienalidade negativa da safra.

Na Colômbia, a Federação Nacional dos Cafeicultores expressou preocupação com o impacto das tarifas.

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“O anúncio do presidente Trump gera preocupação legítima em nosso setor cafeeiro, especialmente por seu possível efeito sobre a demanda de café de nosso comprador mais importante, os Estados Unidos”, escreveu Germán Bahamón, gerente geral da organização, em sua conta no X, antigo Twitter.

Mercado mais apertado para todos

O aumento das tarifas se soma a um ambiente já tenso, marcado por preços internacionais elevados e colheitas reduzidas.

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Os futuros do café arábica em Nova York permaneceram próximos a recordes de alta, já que o clima adverso afetou as principais regiões produtoras.

Ao mesmo tempo, os futuros do robusta em Londres subiram mais de 40% no último ano por motivos semelhantes.

Entretanto, a volatilidade tem sido a norma este ano.

“Nos últimos meses, a expectativa de tarifas teve um impacto positivo sobre os preços do café, pois os importadores e torrefadores dos EUA correram para importar grãos.

A mensagem era ‘importe agora ou pague as tarifas depois’”, disse Carlos Mera, analista do Rabobank. “Agora que a tarifa é oficial, o efeito é claramente negativo para os preços do café.”

A Indonésia, o quarto maior produtor de café do mundo, também foi atingida por uma taxa de 32%.

“O impacto total dessas tarifas sobre o comércio mundial de café continua difícil de avaliar, dada a incerteza atual e o amplo escopo da proposta. No entanto, as primeiras indicações sugerem que pode haver uma mudança significativa nos fluxos comerciais”, disseram os analistas da StoneX em uma nota aos investidores.

A farmer harvests coffee at the El Crucerito' farm, harvests coffee in Sevilla, Valle del Cauca department, Colombia, on Tuesday, May 14, 2024. The International Coffee Organization said that total global coffee exports rose 8.1% year over year to 12.99 million bags, with Arabica exports rising 9.7% in the same period. Photographer: Jair F. Coll/Bloomberg

Para Mera, a decisão de Trump aumenta o custo para os americanos, o que pode reduzir a demanda do segundo maior consumidor, depois da União Europeia.

Entretanto, ele acredita que a demanda por café é muito inelástica e “eu não esperaria mais do que uma queda de um ou no máximo dois pontos percentuais na demanda por uma tarifa de 10% (o que é o caso de muitos países produtores)”.

Colômbia: atingida, mas em uma posição melhor

Em meio à tempestade global sobre preços, estoques e tarifas, a Colômbia parece estar passando por essa fase com relativa resiliência.

Embora o país andino enfrente uma tarifa de 10% sobre suas exportações para os Estados Unidos, mercado para o qual embarcou café no valor de cerca de US$ 1,1 bilhão em 2024, representando 40% das vendas externas do setor, o impacto é menos severo em comparação com o Vietnã ou a Indonésia.

Gustavo Gómez, diretor da Associação Nacional de Exportadores de Café da Colômbia, foi claro a esse respeito: “Nossos principais concorrentes, Brasil, Guatemala, Honduras e Peru, partem todos do mesmo cenário de 10%. O Vietnã, por outro lado, começa com uma tarifa de 46%”, disse Gómez.

María Claudia Lacouture, presidente da Câmara de Comércio Colombiano-Americana, enfatizou que a situação comercial é uma opção estratégica para o país, pois a diferença tarifária com os concorrentes “abre uma janela de oportunidade para a Colômbia nesse mercado”.

Segundo Lacouture, o novo ambiente pode favorecer a consolidação do café colombiano como opção preferencial entre os importadores norte-americanos que buscam qualidade e estabilidade no fornecimento.

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“Reiteramos que a Colômbia continuará a ser um fornecedor confiável e competitivo, diferenciando-se pelo que fazemos de melhor: produzir o melhor café suave do mundo”, acrescentou o presidente da Federação Colombiana de Cafeicultores.

No entanto, analistas da StoneX alertam que os cafés arábica armazenados nos Estados Unidos “provavelmente terão um alto valor comercial, já que todos os cafés desembarcados se tornam mais caros” e é possível que a nova estrutura tarifária desestimule os embarques nos EUA e os redirecione para a Europa.

De acordo com Mera, as tarifas remodelarão a geografia das compras dos EUA. “As torrefadoras americanas evitarão comprar café do Vietnã e da Indonésia”, alertou.

Diante desse cenário, o analista prevê um aumento nas compras de robusta de países como o Brasil, que, além de ser o principal produtor de arábica, é o segundo maior produtor de robusta, e de Uganda.

Entretanto, ele também observou que “é possível um aumento na demanda por grãos arábica”, especialmente se a pressão tarifária for mantida e os compradores buscarem diversificar seu portfólio de origem.

Além do impacto direto das tarifas, a Mera acredita que fatores estruturais continuarão a influenciar o comportamento do mercado cafeeiro no restante do ano. Esses fatores incluem uma safra de arábica menor que a esperada no Brasil, a quinta safra decepcionante consecutiva, que continua a limitar a oferta global do grão de alta qualidade.

Entretanto, ele observou que esse fator será compensado pela menor demanda global por café, o que poderá sustentar os preços. “Esperamos ver preços mais baixos no final do ano, mas dependemos muito de uma normalização do clima”, concluiu.

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Carlos Rodríguez Salcedo (BR)

Jornalista colombiano, especializado em economia. Fui jornalista e editor do jornal La República, com experiência em questões macroeconômicas, comerciais e financeiras. Eu também trabalhei para a agência de notícias Colprensa.