Dólar mais valorizado impulsiona os ganhos de produtores de soja no Brasil

Apesar da queda nos últimos dias, a cotação mais elevada da moeda americana tem protegido os agricultores do recuo dos preços internacionais da soja

Campo de soja no Brasil
Por Clarice Couto - Tarso Veloso
11 de Julho, 2024 | 01:06 PM

Bloomberg — Apesar da queda do dólar na última semana, o real mais desvalorizado tem protegido os agricultores do Brasil da queda de preços da soja neste ano, dando-lhes uma vantagem sobre os rivais norte-americanos.

O real perdeu 11% em relação ao dólar este ano, impulsionado pelas preocupações com o déficit orçamentário do país. Isso, por sua vez, gera uma receita muito maior para a soja do que em 2023.

A queda do real incentivou os agricultores a aumentar as vendas, aprofundando um recuo nos preços de referência que corroeu a receita de produtores americanos.

Como o Brasil é o maior exportador de soja do mundo, os altos e baixos do real desempenham um papel fundamental nos mercados agrícolas.

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O real mais desvalorizado significa que os agricultores do país podem suportar melhor os preços mais baixos das commodities - que normalmente são denominados em dólares - do que seus colegas norte-americanos.

Em geral, isso incentivaria as exportações da região, pressionando para baixo os contratos futuros negociados em locais como Chicago e Nova York.

Em um exemplo da influência do real sobre as negociações, os agricultores brasileiros venderam mais de 4 milhões de toneladas de soja nos cinco dias encerrados em 5 de julho, o maior volume para um período semelhante desde outubro de 2020, depois que a moeda caiu para seu nível mais baixo em mais de dois anos em relação ao dólar, de acordo com Victor Martins, gerente de risco da corretora Amius.

O dólar tem caído nos últimos dias desde que alcançou R$ 5,70 no dia 2 de julho, mas se mantém acima do patamar de R$ 5 no qual estava até o início de maio. Nesta quinta-feira (11), a moeda americana era cotada a cerca de R$ 5,43, com alta de 0,23%, por volta das 12h55 (horário de Brasília).

"Essa é uma má notícia para os exportadores dos EUA", disse Martins em uma entrevista por telefone. O aumento da moeda pode dar aos agricultores brasileiros uma vantagem competitiva que durará até o quarto trimestre, encurtando o período em que os fornecedores dos EUA normalmente têm vantagem, acrescentou.

Os futuros da soja perderam quase 13% - ou US$ 1,68 por bushel - este ano até sexta-feira passada, já que a perspectiva de ampla oferta global pesou sobre os preços.

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A queda é reduzida para apenas 1,7% - ou o equivalente a 19 centavos - quando os preços são convertidos em reais. Em Sorriso, uma importante região produtora do estado do Mato Grosso, os preços à vista subiram 3% no acumulado do ano.

A correlação entre os preços da soja e o real brasileiro chegou a 59% em junho, segundo dados compilados pela Bloomberg, o que significa que a commodity e a moeda brasileira tendem a se mover na mesma direção.

Depois de um início tardio, os produtores brasileiros tentam tirar proveito do real mais fraco para acelerar as vendas da commodity para entrega em 2025.

A SLC Agricola (SLCE3), um gigante agrícola que cultiva soja em uma área quatro vezes maior que a cidade de Nova York, fixou preços para quase 44% de sua próxima safra, acima dos menos de 28% do ano passado e o maior valor desde pelo menos três temporadas, de acordo com um documento da empresa.

"Foi uma grande oportunidade, que não esperávamos, especialmente com os futuros em queda", disse Eduardo Zorzi, gerente comercial do Grupo Bavaresco, uma empresa agrícola que planta mais de 20.000 acres de soja no estado de Mato Grosso.

Sem dúvida, o real mais fraco significa que os agricultores brasileiros têm de pagar mais reais por cada dólar de nutrientes e pesticidas agrícolas importados, o que compensa parcialmente seu impacto positivo sobre a receita.

Um índice da Green Markets de preços de fertilizantes no país recentemente atingiu o nível mais alto em mais de um ano, quando medido em reais.

Nos últimos dias, o real reduziu algumas de suas perdas, com o governo brasileiro buscando tranquilizar os investidores quanto ao seu compromisso com a disciplina fiscal. Espera-se que a moeda encerre 2024 em 5,20 reais por dólar, fortalecendo-se em relação ao nível atual de cerca de 5,48, de acordo com uma pesquisa do banco central com economistas.

-- Com a colaboração de Davison Santana e Jonathan Gilbert.

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