Como o café brasileiro ganhou mercado em alguns dos maiores produtores do mundo

Países que são tradicionalmente grandes produtores, como Vietnã e Indonésia, passam a importar mais do Brasil para atender ao crescimento da demanda interna pela bebida

Por

Bloomberg — Alguns dos maiores países produtores de café da Ásia estão descobrindo que ficou mais desafiador satisfazer os desejos por cafeína em seus mercados domésticos.

Das ruas de Ho Chi Minh, no Vietnã, às de Jacarta, na Indonésia, consumidores estão desenvolvendo rapidamente o gosto pelo café, e isso está transformando os produtores asiáticos em grandes compradores.

Enquanto o Vietnã e a Indonésia ainda se classificam como grandes exportadores, eles estão cada vez mais adquirindo café do Brasil, uma potência agrícola, para atender ao boom de consumo.

“É bastante notável como as pessoas amam seu café”, disse a consultora Judy Ganes, referindo-se à próspera cultura de cafés da Indonésia. Bebidas inovadoras, como uma mistura de café com abacate, têm atraído novos consumidores - parte de um movimento crescente em toda a Ásia, à medida que aumentos na renda disponível promovem o consumo de café, ela acrescentou.

Tanto a Indonésia quanto o Vietnã, grandes produtores da variedade robusta amarga preferida para fazer espresso e bebidas instantâneas, preferem exportar sua produção de café enquanto importam para o consumo doméstico - seus próprios grãos são mais caros do que os do Brasil.

O apelo do café em casa é um bom indicador de que as importações continuarão em alta, especialmente depois que condições climáticas extremas e rendimentos insuficientes nos últimos anos afetaram a produção global.

O maior trader de café do mundo, o Neumann Kaffee Gruppe, aposta nessa mudança e abre um escritório de importação na Indonésia, pois espera que a demanda local eventualmente seja maior do que as colheitas nacionais poderão suportar.

O consumo de café na Indonésia cresceu cerca de 4% ao ano na última década, de acordo com a associação local de exportadores. Isso é mais alto do que o crescimento de 2,2% na demanda global esperado para este ano pela Organização Internacional do Café, seguindo um período de altos e baixos durante a pandemia.

Os embarques do Brasil para a Indonésia, o quarto maior produtor do mundo, mais que dobraram no ano passado, segundo a Cecafé. “O potencial de crescimento ainda é muito grande, especialmente porque o consumo per capita é menor do que em outras partes do mundo”, disse Márcio Ferreira, presidente do grupo de exportadores.

À medida que os hábitos de consumo de café florescem, a produção do grão da Indonésia praticamente estagnou. A demanda pode superar a produção nos próximos cinco a oito anos se o mesmo ritmo continuar, disse Moelyono Soesilo, chefe da indústria cafeeira a jusante da Associação de Exportadores e Indústrias de Café da Indonésia.

O grupo busca ajudar os agricultores a gerenciar suas propriedades, visando aumentar os rendimentos acima do nível atual de 1,1 tonelada métrica por hectare. Em comparação, áreas que produzem uma variedade similar de café no Brasil têm rendimentos de cerca de 2,5 toneladas por hectare, segundo a Conab (Companhia Nacional de Abastecimento).

Enquanto isso, os envios do Brasil para o Vietnã também estão aumentando - saltando mais de seis vezes nos 12 meses encerrados em janeiro, relatou a Cecafé.

As importações do país sul-americano atendem à indústria de café instantâneo do Vietnã, disse Trinh Duc Minh, chefe da Associação de Café Buon Ma Thuot na província de Dak Lak. Algumas empresas importaram grãos para honrar contratos assinados e também produzir café torrado, disse Tran Thi Lan Anh, diretora adjunta da segunda maior exportadora, a Vinh Hiep Co.

O clima tem ajudado a trazer mais importações para a região. O fenômeno El Niño trouxe extrema aridez ao Sudeste Asiático nesta temporada, reduzindo a produção no Vietnã e na Indonésia e causando um aumento nos preços locais. O café do Vietnã está atualmente sendo negociado com mais de US$ 30 de ágio em relação aos grãos brasileiros, tornando as compras sul-americanas ainda mais atraentes.

“É difícil conseguir o grão nos dias de hoje”, apesar dos preços mais altos, disse Anh, sugerindo que provavelmente não há muitos feijões nas mãos dos agricultores.

Embora o Vietnã seja o maior fornecedor de robusta do mundo, condições climáticas extremas e anos de baixos lucros antes do aumento de preços do ano passado levaram alguns agricultores a mudar para outras culturas.

A participação do país no mercado global diminuiu gradualmente na última década - e agora está no menor nível desde 2008, estima a empresa de gestão de riscos Hedgepoint Global Markets.

Espera-se alguma recuperação no fornecimento de café do Vietnã e da Indonésia, pois preços mais altos trarão mais receita para os agricultores, estimulando-os a investir na expansão e na melhoria de suas plantações.

Ainda assim, desafios de longo prazo persistirão, disse Carlos Costa, chefe de vendas da Hedgepoint. “A quantidade de pequenas propriedades familiares torna mais difícil ver ganhos de escala”, disse ele. “A grande alternativa para entrar no mercado deveria ser o Brasil.”

Veja mais em Bloomberg.com

Leia também

Nespresso vê retomada de escritórios e mira os millennials, diz head no Brasil

Preço do café é pressionado por queda das exportações do Vietnã e aumento de estoques

Como a Unilever cresceu 50% em alimentos em 3 anos de olho nas novas gerações