Bloomberg — Depois de gastar cerca de US$ 380 bilhões na última década para quase dobrar a capacidade de geração de energia eólica na Europa, empresas de serviços públicos que atuam no continente agora recorrem a um mercado obscuro e pouco conhecido para se protegerem contra um período prolongado de tempo calmo.
A chamada “seca eólica” - ou simplesmente a falta de ventos - é um lembrete de que não importa o quanto o homem decida construir de parque eólico, a geração real sempre será ditada pela intensidade do vento.
As velocidades do vento na Europa entre fevereiro e abril provavelmente tiveram sua maior queda em relação às médias históricas de longo prazo desde 1940, de acordo com dados do Climate Change Institute da Universidade do Maine.
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Como resultado, as empresas do setor estão recorrendo ao mercado de derivativos climáticos e fecham mais acordos de hedge de vento para este verão do hemisfério norte do que no passado, disse Pierre Buisson, da resseguradora Munich Re.
Ele trabalhou em quatro ou cinco solicitações importantes recentemente, mais do que o normal, e o foco agora se voltou para os meses de verão, disse ele.
“O interesse em hedging eólico cresceu significativamente nos últimos dois ou três anos, e a atual seca eólica colocou mais ‘lenha na fogueira’”, disse Ralph Renner, ex-trader de energia e chefe de originação da Parameter Climate, que presta consultoria a empresas sobre hedging, fazendo um trocadilho.

As operadoras estão comprando contratos que oferecem proteção contra uma produção eólica menor do que a esperada.
Assim, se uma empresa de utilities espera produzir uma determinada quantidade de terawatts-hora de energia eólica durante um determinado período, mas não consegue devido à velocidade insuficiente do vento, receberá uma compensação de sua contraparte - Munich Re, Swiss Re AG ou outras empresas similares.
Os derivativos meteorológicos existem há décadas para proteção contra padrões climáticos adversos. Eles também são comuns em outros setores, desde a agricultura até eventos esportivos, viagens e entretenimento.
Embora a maioria dos mercados de commodities e energia tenha se tornado mais transparente nas últimas décadas em meio à pressão dos órgãos reguladores, o mercado de derivativos climáticos permaneceu opaco.
Não há dados disponíveis sobre o grau de disseminação do hedging eólico e as empresas ativas no mercado recusaram pedidos para fornecer mais detalhes.
A European Energy Exchange, a maior bolsa de energia do mundo, e a Nasdaq lançaram contratos eólicos em suas plataformas na última década, mas não conseguiram ganhar força.
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Em geral, os acordos são assinados diretamente entre as empresas de serviços públicos e a empresa que oferece o contrato de hedge.
Todos os maiores produtores eólicos da região aumentaram sua capacidade eólica no ano passado.
A espanhola Iberdrola relatou um pequeno ganho na produção no primeiro trimestre, enquanto a produção da dinamarquesa Orsted caiu. Para a RWE, a maior produtora de energia da Alemanha, a produção eólica offshore caiu em até um terço. Todas elas se recusaram a comentar sobre o hedging eólico.
“Empresas como a RWE podem perder dezenas de milhões de euros devido à persistência de ventos fracos”, disse Patricio Alvarez, analista sênior da Bloomberg Intelligence.
Mesmo com a redução dos preços em relação ao pico, a energia elétrica europeia continua mais cara do que antes da crise energética, o que torna dispendioso para as empresas substituir os déficits de produção.
Esse “é um grande desafio para as empresas de energia”, disse Pierre Off, diretor de clima e energia para a Europa da Swiss Re Corporate Solutions. Ele destacou a crescente demanda por seus serviços.
A empresa de serviços públicos sueca Vattenfall, com parques eólicos no noroeste da Europa, viu sua produção cair 20% no primeiro trimestre. Ela não tem usado contratos de hedge eólico especificamente, mas, em vez disso, equilibra a produção com outras partes de seu portfólio de geração, disse Catrin Jung, chefe de energia eólica offshore da empresa.
“Uma empresa pode ter 300 mil turbinas eólicas e isso não fará diferença”, disse Ivan Fore Svegaarden, CEO da TradeWPower, uma empresa norueguesa de previsão para o setor de energia.
“A situação fica cada vez mais calma, cada vez mais seca, dura mais tempo e aparece com mais frequência.”

A queda na velocidade média de ventos é causada por padrões climáticos de alta pressão que têm sido excepcionalmente frequentes e duradouros em toda a Europa neste ano. Isso criou condições calmas e secas fora de época.
“Existe a preocupação de que a tendência de ventos fracos possa persistir”, disse Robin Girmes, ex-trader meteorológico da RWE que presta consultoria a empresas de utilities por meio de sua própria companhia RM Energy Weather.
Embora o aquecimento global esteja tornando o clima mais imprevisível, não há explicações meteorológicas óbvias para essa longa sequência de períodos de calmaria, disse Nathalie Gerl, analista-chefe de energia do London Stock Exchange Group.
Os modelos de previsão de longo prazo estão repletos de incertezas, mas uma análise sazonal da MetDesk mostra que os períodos de baixa velocidade do vento durarão até o verão, o que pode aumentar ainda mais as necessidades de cobertura.
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“O vento é difícil de prever e a volatilidade do vento é extremamente grande. Essa grande volatilidade pode ter impactos significativos sobre os preços, tornando o hedge eólico particularmente atraente”, disse Renner, da Parameter Climate.
A velocidade média diária dos ventos na Alemanha em abril foi a mais baixa desde 1996, de acordo com a agência de previsão nacional Deutscher Wetterdienst.
“Isso certamente é um revés para as operadoras”, disse Alvarez, da Bloomberg Intelligence. “Elas tiveram que compensar o déficit com a compra de eletricidade no mercado ou o aumento da geração movida a combustível fóssil - e ambos tendem a oferecer margens menores.”
-- Com a colaboração de Joe Wertz e Kari Lundgren.
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