Discurso vs realidade: Tesla vende mais, mas lucra menos e vê margem encolher

Homem mais rico do mundo tem demonstrado atenção com temas que vão do governo americano e da eleição na Alemanha ao robô-táxi, mas atuação em elétricos passa por desafios relevantes

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Bloomberg Opinion — É bom para a Tesla (TSLA) que seu CEO Elon Musk tenha se aproximado do presidente dos Estados Unidos, porque os números mais recentes da empresa estão péssimos.

A Tesla não cumpriu as estimativas de lucros para o quarto trimestre. O maior problema é que a perda teria sido ainda pior se a Tesla não tivesse recorrido a alguns ajustes extraordinários.

Outro grande volume de vendas de créditos de carbono, combinado com um volume excepcionalmente grande de “outras receitas”, devido principalmente a uma mudança contábil relacionada a participações em bitcoin, somou US$ 1,5 bilhão.

Ajustado pelos impostos, isso representa a metade de todo o lucro da Tesla no trimestre. Esses lucros não são apenas fracos mas também de baixa qualidade.

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A Tesla divulgou um trimestre recorde em termos de vendas de veículos e baterias. De alguma forma, isso se traduziu no oposto para suas finanças.

A métrica de margem automotiva, observada de perto, excluídas as vendas de créditos de emissões, atingiu seu nível mais baixo desde pelo menos 2018, com 13,6%.

A receita média por veículo vendido, excluindo leasings e créditos, caiu para menos de US$ 40.000 e a margem bruta nessa base caiu para cerca de US$ 5.100 – novamente, a menor desde pelo menos 2018.

De uma forma oblíqua, a Tesla explicou o problema, mas o emoldurou como uma vitória. Ela observou na apresentação de resultados da noite de quarta-feira (29) que reduziu seu custo médio de produção de veículos para o nível mais baixo de todos os tempos, abaixo de US$ 35.000 cada.

Foi o que aconteceu. Mas isso chama a atenção para um problema subjacente: os custos de produção da Tesla estão diminuindo em pequenos incrementos.

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A queda média por trimestre nos últimos dois anos foi de menos de 2%. Isso torna as margens vulneráveis em uma guerra de preços – que é exatamente o que aconteceu com os veículos elétricos em meio à desaceleração do crescimento das vendas nos EUA e à intensa concorrência na China.

O envelhecimento da linha de modelos da Tesla agrava o problema. O resultado é a queda dos preços aliada a custos persistentes e, portanto, margens drasticamente menores.

Considere que a Tesla vendeu 36% mais veículos em 2024 do que dois anos antes, bem como aumentou muito mais a capacidade da bateria, e ainda assim o lucro operacional caiu pela metade.

Esses resultados são ainda mais chocantes considerando os números anteriores. Naquela época, a Tesla se esforçava para se recuperar do fracasso que foi o evento de lançamento do táxi-robô. Logo em seguida, a Tesla divulgou resultados melhores do que os esperados, embora fossem mais uma queda do que uma recuperação.

Mas Elon Musk mudou completamente a narrativa ao divulgar um grande crescimento nas vendas de veículos no quarto trimestre e um crescimento de mais 20 a 30% em 2025. O valor da Tesla disparou em mais de um quinto no dia seguinte.

Como se viu, as vendas não atingiram esse guidance no quarto trimestre e, curiosamente, a meta para 2025 não foi repetida com os resultados mais recentes – provavelmente uma coisa boa, dadas as ordens executivas de combate a veículos elétricos do presidente Donald Trump.

No entanto o CEO estava em um modo “expansivo” na teleconferência de resultados de quarta-feira, embora principalmente a respeito de outras coisas além das vendas de veículos elétricos que representam a grande maioria da receita e dos lucros da Tesla.

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Os veículos autônomos tiveram grande destaque, é claro, e Musk declarou que “a realidade da autonomia chegou”; depois continuou e disse que ainda não era totalmente uma realidade e que a Tesla lançará um serviço de táxi-robô com limites geográficos em Austin em junho.

As ações da Tesla avançaram nas negociações pós-mercado com essa frase, apesar do fato de que ela simplesmente indicava um mês para uma meta de 2025 que Musk já havia anunciado anteriormente.

Musk também não mencionou nenhum táxi-robô na Califórnia neste ano, como havia feito antes – até que alguém fez uma pergunta. Em seguida, ele expressou sua confiança no lançamento da Tesla para a condução autônoma total sem supervisão não apenas na Califórnia mas em muitas regiões do país.

O Optimus, o projeto de robô humanoide da Tesla, também teve grande destaque. Apesar da oscilação com a DeepSeek nesta semana, a inteligência artificial continua sendo o maior tema industrial e tecnológic e fornece suporte crítico para a gigantesca capitalização de mercado da Tesla, dada a fraqueza gritante do negócio principal de veículos elétricos.

Musk elogiou 2025 como “talvez” o ano mais importante na história da Tesla e também apresentou uma velha história sobre ela se tornar a empresa mais valiosa do mundo, embora com uma nova reviravolta de possivelmente se tornar mais valiosa do que as próximas cinco empresas combinadas (isso seria uma capitalização de mercado de cerca de US$ 15 trilhões nos níveis atuais).

Perto do final, a teleconferência focou em Musk com críticas à mídia, denúncias sobre a Europa como um “bolo de regulamentações” e declarações sobre a necessidade de “fazer com que a fabricação volte a ser descolada” nos EUA.

Com isso e a vitória eleitoral de Trump com apoio de Musk, toda aquela campanha do segundo semestre do ano passado parece ter realmente surtido efeito.

Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.

Liam Denning é colunista da Bloomberg Opinion e cobre energia. Ex-banqueiro, ele editou a coluna “Heard on the Street” do Wall Street Journal e escreveu a coluna “Lex” do Financial Times.

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