Culinária da América Latina é o verdadeiro ‘soft power’ dos países da região

Gastronomia latino-americana mostra como a alimentação é mais do que apenas nutrientes para sobreviver; é uma forma de socializar e criar laços com outras pessoas

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Bloomberg Opinion — Seja com ceviche, tacos ou empanadas, a culinária da América Latina transcende fronteiras.

A alimentação é uma das poucas áreas em que a região pode ser considerada uma superpotência, não apenas por causa de seu papel histórico como fornecedora de várias commodities, de café a abacate e carne bovina, mas também por causa de sua crescente influência na alta gastronomia.

Isso se traduz em mais demanda por seus produtos, atraindo turistas locais e estrangeiros para o setor de hospitalidade e disseminando a noção popular de que a comida é mais do que apenas nutrientes para sobreviver; é uma forma de socializar e criar laços com outras pessoas, além de ser uma fonte potente de “soft power”.

O surgimento de receitas e ingredientes locais no mercado global é uma prova disso. Assim como a guacamole conquistou as mesas do mundo há muitos anos, agora, repentinamente, o chimichurri – o molho de ervas com alho que os argentinos colocam em suas carnes grelhadas há gerações – também se tornou algo que pode ser encontrado em todos os lugares nos Estados Unidos. Alguns chefs até o chamam de chimi, como fazem os locais.

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Tudo isso veio à mente com o lançamento, na semana passada, da lista 2024 dos 50 melhores restaurantes da América Latina.

Assim como em outros rankings, a lista combina alguns dos restaurantes mais estabelecidos e os mais novos e empolgantes da região, de acordo com os critérios caprichosos dos juízes dedicados a essas questões.

A lista deste ano foi encabeçada pelo Don Julio, a elegante churrascaria de Buenos Aires que se transformou em uma sensação internacional visitada por celebridades como Lionel Messi e Angela Merkel.

Na lista dos 50 Best Restaurants, uma classificação global paralela, 11 dos melhores restaurantes do mundo são da América Latina, ou seja, quase um quarto do total.

Já vivenciei algumas viagens gastronômicas inesquecíveis em alguns desses lugares, mesmo que a fama que ganharam os torne mais caros e mais difíceis de entrar. Mas você não precisa desses selos de aprovação para desfrutar de uma refeição memorável em Lima, Santiago ou Caracas.

Portanto, em homenagem aos milhões de famílias e empreendedores que fizeram da culinária – desde a comida de rua e as barracas de mercado até os jantares finos – uma forma de viver e cultivar amizades, aqui está minha própria lista totalmente arbitrária dos melhores restaurantes a preços acessíveis em quatro locais queridos da América Latina:

Albamonte Ristorante (Buenos Aires)

Jantei no Albamonte pela primeira vez provavelmente no final dos anos 90, enquanto crescia em Buenos Aires, e logo me tornei um frequentador assíduo.

Esse é um típico bodegón porteño, os tradicionais locais de refeições da capital argentina que mesclam receitas de influência europeia (principalmente italiana ou espanhola) com pratos locais.

O restaurante está no mesmo local, no bairro de Chacarita, há mais de 65 anos, e aposto que seu extenso cardápio não mudou muito desde então.

Embora seja conhecido por suas pizzas e massas, meu prato favorito é a milanesa a la fugazzeta, ou costeletas de vitela empanadas cobertas com uma quantidade obscena de queijo e cebola. Imperdível com batatas fritas.

Bar e Lanches Estadão (São Paulo)

Eles dizem servir a melhor carne de porco cozida lentamente de São Paulo e, caramba, é ótima. Esse ponto de encontro há muito estabelecido em uma esquina despretensiosa do centro histórico da cidade oferece comida clássica brasileira, bebidas e companhia.

O Bar e Lanches Estadão é uma instituição dentro da cultura de lanchonete do país, os bares que servem lanches, sanduíches e sucos saudáveis o dia todo para pessoas que lidam com o ritmo agitado da vida cotidiana, de trabalhadores de escritório a artistas.

Que lugar melhor para discutir sobre os assuntos atuais do Brasil – desde a desvalorização do real até o Botafogo finalmente se tornar campeão da Copa Libertadores – do que aqui?

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Mi Compa Chava (Cidade do México)

Escolher um ótimo restaurante na Cidade do México é como escolher frutas em uma barraca de fazenda ou mercearia da Califórnia: você será mimado pelas opções disponíveis.

Se eu tiver que escolher um, escolheria esse novo local focado em frutos do mar frescos da costa do Pacífico, que faz você se sentir como se estivesse de férias em uma praia ensolarada.

Aqui você encontrará aguachiles, ceviches e tostadas, mas o que você não pode perder é o prato principal, Señora Torres, uma torre de camarão cru e cozido, polvo, atum, vieira, cebola, pepino e abacate, tudo abençoado com molho de chile. A cultura popular de Sinaloa em sua melhor forma.

Taquería La Lupita (Mérida, Yucatán)

Localizada no mercado Santiago, no centro de Mérida, essa taqueria tem as tortilhas de milho mais macias que já comi.

Posso comer meia dúzia de seus tacos de cochinita pibil sem nem piscar. A comida yucateca está entre as cozinhas regionais mais saborosas do México, e esse lugar popular tem feito as honras há décadas.

Experiência emblemática

Não pense nesses restaurantes como os “Melhores” – esse tipo de hipérbole gastronômica deve ser evitado, até porque todos nós temos nossas próprias listas.

São restaurantes simples e emblemáticos que, em diferentes momentos da minha vida, me proporcionaram alegria, permitindo que eu me divertisse com amigos e familiares.

Dividir a mesa com comida durante horas é uma característica da cultura latino-americana. Os problemas econômicos, políticos e sociais da região podem ser uma confusão eterna, mas igualmente eterna é a paixão de seus habitantes pela comida.

Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.

Juan Pablo Spinetto é colunista da Bloomberg Opinion e cobre negócios, assuntos econômicos e política da América Latina. Foi editor-chefe da Bloomberg News para economia e governo na região.

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