Bloomberg — A Kinea Investimentos avalia que o “fantasma” da questão fiscal no Brasil pode voltar a reaparecer com a perspectiva de elevação da Selic a níveis que podem ser de 14% ou mais no ano que vem.
“Uma taxa Selic a esses níveis pode trazer novamente o fantasma do problema fiscal estrutural brasileiro, em que um primário com déficit em torno de 1% e o elevado nível de juros reais pressionam o crescimento da relação dívida/PIB, fazendo com que a política monetária perca potência”, disse a Kinea, em carta mensal sobre sua estratégia multimercado.
A preocupação crescente com as contas públicas tem levado economistas a debater recentemente o risco de o Brasil entrar em um cenário de “dominância fiscal”, uma situação na qual a política fiscal ganha uma influência predominante sobre a inflação e a atividade econômica, e a política monetária do Banco Central perde a eficácia.
O fundo Kinea está vendido em bolsa doméstica — operação que ganha com a desvalorização dos ativos —, dada a combinação de alta de juros e contração fiscal, e diz notar oportunidades melhores de aplicação em ações no exterior. Já no mercado de juros, a Kinea diz que tem apenas pequenas posições “táticas”, sem especificar.
Leia também: Governo vai estimular mais a demanda com isenção de IR, diz economista da G5
A economia brasileira está sobreaquecida como resultado do aumento dos gastos públicos, disse a Kinea, que estima um impulso fiscal de cerca de 3% do PIB.
Apesar dos alertas, a gestora não vê o Brasil numa situação insustentável do ponto de vista das contas do governo, o chamado “fiscal cliff” — ou abismo fiscal.
Nos próximos meses, haverá uma perda de tração do impulso fiscal, disse a Kinea, citando que o governo não está acelerando mais os gastos e que a política monetária está se tornando mais contracionista — o que deve levar a uma desaceleração da economia.
O mercado local recentemente reagiu de forma negativa ao anúncio do pacote de corte de gastos anunciado junto com isenção do Imposto de Renda para salários até R$ 5.000, com avanços de dólar e taxas futuras de juros.
A atividade doméstica deve ter um pouso suave em 2025, mas o fundo não descarta o risco de uma espiral negativa de elevação do prêmio de risco sobre os ativos locais — que seria reflexo da dificuldade do governo conquistar credibilidade e do ambiente externo mais turbulento.
A gestora estima que, no primeiro semestre de 2025, os núcleos de inflação, que excluem itens mais voláteis como alimentos e energia, devem rodar próximo de 6%.
Com a depreciação do real, que alcança 20% no ano, há aumento significativo da inflação no atacado, disse a Kinea. Além disso, há choques nos preços de alimentos, como no caso do boi gordo, que dispara 45% desde setembro.
A Kinea avalia que o dólar deve se fortalecer frente às principais moedas devido à perspectiva do aumento do diferencial de juros dos Estados Unidos, na esteira da força da atividade econômica americana e da política de tarifas do futuro governo de Donald Trump.
A estratégia multimercado da gestora está comprada na moeda americana contra o renminbi — a divisa chinesa — e outras moedas europeias.
A Kinea, controlada pelo Itaú (ITUB4), detinha R$ 132,7 bilhões em ativos sob gestão em 31 de outubro.
Veja mais em Bloomberg.com
-- Com informações adicionais da Bloomberg Línea.
Leia também
Economia frágil atrapalha a ascensão global do Brasil, aponta estudo
© 2024 Bloomberg L.P.