Da McKinsey ao BCG: como o Golfo se tornou um ‘eldorado’ para consultores

Com expansão quatro vezes maior do que a média global, mercados como Dubai atraem profissionais em busca de uma rápida ascensão na carreira para se tornarem sócios

Dubai
Por Dinesh Nair - Omar El Chmouri - Matthew Martin - Abeer Abu Omar
26 de Outubro, 2024 | 05:36 AM

Bloomberg — O caminho notoriamente difícil para obter promoções e o status de partner (sócio) em algumas das maiores empresas de consultoria do mundo pode, atualmente, passar pelo Oriente Médio.

Globalmente, o setor enfrenta uma desaceleração prolongada e cresceu apenas 3% para US$ 250 bilhões em 2023, segundo a Source Global Research, que foca em empresas de médio e grande porte.

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No Golfo, a taxa de crescimento foi quatro vezes maior, à medida que os governos gastam trilhões em construção e M&As. Isso tem alimentado expansões de gigantes como McKinsey e Boston Consulting Group (BCG).

Na McKinsey, alguns executivos escolhem deliberadamente posições no Golfo, vendo-as como um trampolim para o avanço na carreira e para chegar ao cargo de sócio, disseram fontes próximas ao assunto ouvidas pela Bloomberg News.

A empresa emprega mais de 1.000 consultores no Oriente Médio, um número bem acima dos anos pré-pandemia, segundo essas pessoas.

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No BCG, alguns líderes seniores estão baseados em Dubai, e a empresa conta com o fundo soberano da Arábia Saudita, com patrimônio de US$ 925 bilhões, como um de seus maiores clientes, disseram as fontes.

Leia mais: McKinsey: maior adoção de IA impulsiona consultoria em meio à queda do setor

A corrida para capitalizar sobre a riqueza do petróleo do Golfo, por outro lado, ocorre em um contexto de crescentes hostilidades entre Israel e outros países, como o Irã.

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Além disso, os preços do petróleo bruto mantiveram-se em média em cerca de US$ 80 nos últimos dois anos, abaixo do patamar de US$ 100 alcançado em 2022.

Executivos disseram que entidades governamentais na região tornaram-se mais exigentes e começam a pressionar por fees de consultoria mais baixas.

A Arábia Saudita também cortou recentemente as previsões de crescimento e tem reduzido o trabalho em alguns de seus projetos ambiciosos, o que pode diminuir a demanda por consultores em algumas áreas.

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Ainda assim, vários executivos seniores entrevistados pela Bloomberg News dizem que a indústria de consultoria é uma das mais resilientes do mundo no Golfo Pérsico.

É um jogo simples: os consultores prosperam ao trabalhar muito de perto com os governos do Oriente Médio, oferecendo conselhos durante os períodos de crescimento e propostas de reestruturação em tempos de retração.

“Por trás de cada grande projeto no Golfo há uma equipe de consultoria”, disse Hagop Panossian, professor na Universidade Americana de Beirute, que observa muitos novos graduados que conseguem empregos bem remunerados no setor.

O modelo de Dubai

Para a McKinsey e o BCG, a região está entre as mais fortes globalmente em receita e rentabilidade, segundo fontes que preferiram não comentar sobre assuntos confidenciais.

O BCG tem nomes influentes, como Saleh Al-Ateeqi, que ingressou na empresa em 2023, vindo da Kuwait Investment Authority, onde liderou o braço de Londres por quatro anos, e Ihab Khalil, com vasta experiência em fundos soberanos e investidores regionais.

O BCG também emprega mais de 1.000 consultores na região, disseram as fontes.

Representantes da McKinsey se recusaram a comentar. O BCG não respondeu a um pedido de comentário.

A demanda continua, com algumas empresas de consultoria alocando funcionários para compor departamentos inteiros em entidades sediadas no Oriente Médio, segundo pessoas familiarizadas com o assunto.

A atividade prossegue apesar do aumento da violência na região. Um executivo disse que o conflito ainda não teve um grande impacto, e as entidades continuam com os planos de investimento, embora uma escalada possa afetar o ambiente de negócios.

Como resultado, a remuneração inicial para consultores nas capitais do Golfo pode superar a de Londres, mesmo sem ajuste para impostos.

Em Riad, uma cidade que expatriados há muito evitam devido às normas sociais rígidas, novos recrutas no BCG podem garantir um salário mensal livre de impostos de cerca de US$ 10.000, superior ao salário base médio listado no Glassdoor para associados nos EUA na mesma empresa, segundo algumas das fontes.

A dependência de conhecimento externo tem sido uma característica da transformação da região há anos. O exemplo mais proeminente talvez seja Dubai, o centro de negócios do Oriente Médio.

Leia mais: De júnior a sócio: gigantes da consultoria usam IA para acelerar a carreira até o topo

A cidade contou com consultores para desenvolver projetos como a icônica ilha artificial Palm Jumeirah, disse Jim Krane, pesquisador do Baker Institute for Public Policy da Universidade Rice, em Houston.

A Palm agora está no centro do boom imobiliário de luxo da cidade, atraindo bilionários de todo o mundo. Quando o emirado reviveu um projeto semelhante anos depois de ser suspenso, compradores fizeram fila por casas de milhões de dólares.

Embora Dubai tenha iniciado sua transformação décadas atrás, a Arábia Saudita está no meio de seu próprio ciclo de mudanças econômicas e sociais.

Outras cidades nos Emirados Árabes Unidos também estão ampliando planos ambiciosos, o que pode significar mais negócios para as empresas de consultoria.

Transição econômica

Um objetivo estratégico é o avanço em inteligência artificial. Emirados Árabes e Arábia Saudita estão investindo bilhões para desenvolver expertise em semicondutores, IA e gestão de dados.

Algumas dessas ambições têm atraído atenção nos EUA, onde autoridades estão preocupadas com os laços da região com a China.

Ainda assim, as empresas de consultoria estão ampliando suas operações em tecnologia.

Por exemplo, o chefe da Oliver Wyman Quotient — lançado em junho como uma oferta global que combina a expertise e ferramentas de IA da empresa — está sediado no Oriente Médio.

“Para nós, essa região é uma das nossas mais fortes globalmente”, disse Nick Studer, CEO da Oliver Wyman, em uma entrevista. No entanto, a empresa é “cuidadosa com os trabalhos que assumimos, então, em uma região que pode ser contenciosa, avançamos com cautela”, afirmou ele.

Consultoras menores como a AT Kearney e Roland Berger também têm aumentado suas atividades no Golfo.

O clima na região contrasta com a retração pós-pandemia em outras partes do mundo, onde empresas agora têm de cortar funcionários devido à falta de transações.

Embora a receita de consultoria no Oriente Médio ainda represente uma fração do total global, a Source Global Research estima que o mercado de US$ 5,4 bilhões expandiu 13% no ano passado.

“Um dos principais motivos pelos quais essas organizações estão em alta no Oriente Médio é que ainda existem muitos projetos especulativos em andamento como parte da transformação econômica do Golfo para além do petróleo”, disse Ryan Bohl, analista sênior do Oriente Médio e Norte da África na consultoria Rane Network.

Governos com trilhões de dólares em fundos soberanos estão contando com consultores para traçar estratégias econômicas para a era pós-petróleo.

Eles contrataram empresas para aconselhar sobre os planos para o projeto de US$ 1,5 trilhão no deserto, Neom, e ajudaram a moldar a turnê de golfe LIV Golf, apoiada por Riad.

Conforme as empresas buscam a região, elas competem por uma fatia do mesmo mercado. Algumas estão até mesmo realizando trabalhos de curto prazo gratuitamente, na esperança de que isso leve a projetos mais longos, disse uma fonte.

Os consultores também receberam críticas mistas localmente por seu trabalho. “Embora tenham ajudado a melhorar a imagem dos países do Golfo, alguns ajudaram a conceber escolhas excessivamente exuberantes”, disse Krane da Universidade Rice.

Ainda assim, muitos apostam que as agências governamentais no Golfo agora dependem tanto dos consultores que as empresas continuarão a ver negócios sendo direcionados a elas.

Com foco em seus orçamentos, Riad já está discutindo um novo plano de transformação econômica chamado Vision 2040.

“Ainda que haja rumores de que a Arábia Saudita pretende reduzir alguns desses projetos, o imperativo estratégico permanece”, segundo Bohl, da Rane Network. “Acredito que seria um erro para essas organizações não levarem a sério seus planos aspiracionais.”

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