Bloomberg — O negócio tinha todas as características da mudança inevitável de poder em Wall Street: a Apollo Global Management (APO), líder entre os crescentes players não bancários, aproveitou a crise do Credit Suisse para adquirir um dos negócios mais lucrativos do agora extinto banco suíço.
Mas a Atlas SP Partners - o negócio de finanças estruturadas que é essencial para o plano do CEO da Apollo, Marc Rowan, de se tornar uma máquina de empréstimos - enfrentou dificuldades sob seu novo proprietário desde a aquisição do ano passado, segundo entrevistas da Bloomberg News com quase uma dúzia de pessoas com conhecimento da unidade.
Culturas entraram em choque, os negócios diminuíram, e uma série de saídas de executivos culminou na partida abrupta de Jay Kim, chefe de longa data da Atlas SP, em agosto.
A unidade também enfrentou taxas de juros mais altas, que reduziram as originações de hipotecas. Outros aspectos do negócio se mostraram mais difíceis fora de um banco.
A Atlas não tinha mais uma grande mesa de negociação que criasse mercados para os títulos que estruturava, e também não se beneficiava dos baixos custos de financiamento dos bancos para competir em ativos mais convencionais.
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Apollo, Blackstone (BX), KKR (KKR) e outros gigantes do private equity têm expandido seus negócios de empréstimos privados nos últimos anos, para aproveitar o boom de US$ 1,7 trilhão à medida que os bancos reduziram os financiamentos.
Rowan pretende aumentar o volume anual de originação em quase 70% nos próximos cinco anos, e a firma já ganhou mais taxas de administração com crédito no ano passado do que KKR, Blackstone e Carlyle (CG).
No entanto, os últimos 18 meses mostraram que o avanço da Apollo no território tradicional dos bancos não será tão simples quanto parece no papel.
E a Atlas precisa de um novo líder para superar um período tumultuado de um ano e meio e atingir a meta de Rowan de US$ 275 bilhões em originação anual até 2029.
Rowan não está desistindo da Atlas, uma das maiores das 16 plataformas de originação da Apollo. A unidade garantiu novos recursos com US$ 5 bilhões em financiamento do BNP Paribas e US$ 5 bilhões em capital de investidores, incluindo Massachusetts Mutual Life Insurance e Abu Dhabi Investment Authority.
A empresa conseguiu uma licença de corretora e começou a planejar a construção de uma operação de trading, com a esperança de que mais negócios seja gerados à medida que puder mostrar aos investidores que existe um mercado para vender os ativos, se necessário.
A unidade começou com cerca de US$ 40 bilhões em ativos sob gestão quando a Apollo a adquiriu. Após a queda dos ativos, a Atlas se expandiu para novas áreas para voltar aos cerca de US$ 40 bilhões, disseram algumas pessoas.
“Com US$ 50 bilhões em originações, US$ 5 bilhões em capital de longo prazo e uma equipe que quase dobrou de tamanho desde o início, a Atlas rapidamente se tornou uma de nossas plataformas de negócios mais importantes”, disse a Apollo em um comunicado por e-mail. “Estamos orgulhosos de apoiar o sucesso e a continuidade da equipe desde o desmembramento do Credit Suisse.”
Jay Kim preferiu não comentar.
‘Alto crescimento’
Em fevereiro de 2023, a Apollo concluiu o acordo com o Credit Suisse para adicionar a Atlas como uma de suas plataformas que faz os empréstimos que a Apollo agrupa em títulos e vende a outros investidores, seus próprios fundos de clientes e seu braço de seguros Athene.
A Apollo promoveu sua nova unidade como uma “unidade de alto crescimento” que origina ativos cobiçados por “uma ampla gama de investidores.”
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Um mês depois, o UBS Group (UBS) concordou em assumir o banco como parte de um resgate intermediado pelo governo suíço.
Embora o Credit Suisse tivesse concordado em permitir que a Apollo administrasse US$ 20 bilhões em ativos securitizados em troca de taxas, o acordo foi encerrado após a compra do rival pelo UBS.
Enquanto isso, a Atlas operou sem uma licença de corretora por mais de um ano. Sem ela, a Atlas teve dificuldades para gerar negócios porque — ao contrário de concorrentes como grandes bancos — não conseguia facilmente oferecer os produtos para clientes.
Sua unidade de hipotecas residenciais foi a mais afetada pela dificuldade em originar novos negócios, em grande parte devido à falta de capacidade de negociação da empresa, disseram algumas pessoas ouvidas pela Bloomberg News.
A Atlas também se afastou de algumas das atividades de finanças estruturadas existentes do Credit Suisse, incluindo hipotecas garantidas pelo governo.
Normalmente, é mais difícil para instituições não bancárias competirem com bancos de Wall Street e seus custos ultrabaixos de financiamento no mercado de hipotecas garantidas por agências governamentais.
A Atlas se voltou para hipotecas não qualificadas para mutuários que não atendem aos requisitos tradicionais de subscrição, que considerava mais atraentes do que o mercado garantido pelo governo.
Apesar dessa mudança, a Atlas também teve que lidar com uma desaceleração mais ampla nas originações de hipotecas, já que as taxas de juros elevadas impediram os compradores de refinanciar suas casas.
Como resultado, a empresa buscou fazer negócios fora do setor de hipotecas, incluindo o fornecimento de financiamento para bancos regionais após a crise do ano passado que prejudicou vários credores de médio porte.
Enquanto isso, a Atlas conseguiu convencer a grande maioria dos clientes do Credit Suisse a permanecer na empresa, aliviando as preocupações de alguns sobre trabalhar com uma instituição não bancária.
Tensão interna
Ao transferir os clientes do Credit Suisse, a Atlas também transferiu cerca de 180 funcionários do banco para trabalhar para a gestora de ativos alternativos.
A fusão das equipes causou atritos, especialmente nos primeiros dias do negócio. Quando os executivos da Apollo tentaram se aprofundar nos detalhes do portfólio que haviam adquirido durante o fechamento do negócio, tiveram dificuldades para obter informações em tempo hábil do Credit Suisse, disseram algumas pessoas.
Enquanto isso, a cultura intensa da Apollo — com suas ligações telefônicas de executivos tarde da noite — gerou desacordos com os ex-funcionários do Credit Suisse sobre expectativas que algumas pessoas consideraram inaceitáveis.
Alguns funcionários juniores insatisfeitos da Atlas começaram a buscar novas oportunidades em concorrentes, enquanto vários membros seniores da equipe levaram suas habilidades para outros lugares.
A Pacific Investment Management Co. (Pimco) contratou Jason O’Brien, que era chefe da Europa na Atlas. Ryan Bernholz, que supervisionava o investimento e a securitização de empréstimos, também saiu recentemente.
A Ares Management contratou Lekith Lokesh, que era diretor de estruturação, e o diretor de vendas Michael Santulli trabalhará para o Nomura Holdings. Margaret Dellafera, membro da equipe de hipotecas residenciais, vai para o Canadian Imperial Bank of Commerce. O trader David Garner foi contratado pelo Barclays no início deste ano.
Os funcionários preferiram não comentar ou não responderam aos pedidos de comentário. A Pimco confirmou que contratou O’Brien, e as outras empresas preferiram não comentar.
Saída de Jay Kim
Embora alguns tenham saído por vontade própria, a Apollo demitiu outros como parte das reorganizações da equipe. A saída de Jay Kim, o líder da Atlas, em agosto foi uma decisão mútua, e ele ainda avalia suas opções, disseram algumas pessoas. Ele liderava o grupo de produtos estruturados do Credit Suisse desde 2016.
O número de funcionários da Atlas cresceu para cerca de 350 pessoas, ante aproximadamente 180 quando a Apollo a comprou.
À medida que a equipe se expande, Rowan determinou que o time se concentre em áreas emergentes de crédito, como empréstimos baseados no valor do patrimônio líquido (NAV) para emmpresas de private equity.
Empréstimos NAV — dívida garantida pelos ativos de um fundo de investimentos — ganharam popularidade no mercado americano, à medida que empresas de private equity buscam maneiras de gerar liquidez para seus investidores em meio a uma prolongada desaceleração de deals.
Há sinais de que o mercado pode estar descongelando, o que significa que a Atlas terá que continuar evoluindo se quiser atender às altas expectativas de Rowan.
O CEO da Apollo classificou a Atlas como uma das empresas com capacidade para dobrar de tamanho, e ele continua a projetar otimismo de que os mercados privados acabarão por ganhar mais negócios do que os mercados públicos e os bancos.
“No final das contas,” disse Rowan no dia dos investidores da firma na semana passada, “o privado vencerá o público.”
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