Opinión - Bloomberg

Temperaturas elevadas não são mais um problema para as gerações do futuro

População mundial não está preparada para lidar com o calor extremo que tem atingido diversas regiões; segunda-feira (22) foi o dia mais quente já registrado na história

Onda de calor no Egito
Tempo de leitura: 5 minutos

Bloomberg Opinion — Durante décadas, o aquecimento global foi amplamente visto como um problema do futuro, algo com que nossos infelizes netos deveriam se preocupar. Mas com os recordes de calor, está claro que o amanhã já chegou. Nós somos os netos infelizes. E também está claro que não estamos preparados para a temperatura mais elevada.

Segunda-feira (22) foi o dia mais quente já registrado na história. A temperatura média global atingiu 17,15°C, de acordo com o Serviço de Mudanças Climáticas Copernicus da União Europeia. Isso quebrou o recorde anterior, estabelecido no domingo (21).

Antes de domingo, o recorde anterior havia sido estabelecido em julho de 2023. Na verdade, os últimos 10 anos tiveram as 10 temperaturas máximas anuais mais altas já registradas, de acordo com dados do Copernicus que remontam a 1940. As máximas dos últimos dois anos subiram em um ritmo mais veloz, ultrapassando os 17°C pela primeira vez.

No ano passado, pudemos atribuir parte desse calor ao padrão climático El Niño, que tende a elevar as temperaturas globais. Mas o El Niño acabou, e as temperaturas continuam altas.

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Provavelmente, essas também são as máximas mais altas em cerca de 125.000 anos. Como os negacionistas da mudança climática não se cansam de apontar, o clima sempre esteve em constante mudança.

Aquele período quente de 5.000 gerações atrás – quando as temperaturas podem ter atingido o máximo de 1,5ºC acima das médias pré-industriais, o que corresponde aproximadamente ao ano escaldante que passou – foi seguido por uma longa era glacial. Depois disso, o planeta aqueceu naturalmente até atingir as temperaturas agradáveis nas quais a civilização humana prosperou por cerca de 240 gerações.

A má notícia é que, graças a essa mesma civilização que queima combustíveis fósseis e lança gases que retêm o calor na atmosfera, essas temperaturas agradáveis são coisa do passado.

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Devemos ultrapassar o aquecimento de 1,5ºC e chegar a algo próximo de 3ºC, acelerando um processo que naturalmente levaria milhares de anos. Esses podem ser os anos mais quentes da história, mas também serão alguns dos mais frios que teremos por um tempo.

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As temperaturas mais altas turbinam os motores climáticos do planeta e levam a ondas de calor, secas, incêndios florestais e enchentes mais frequentes e severas, além de furacões e tempestades cada vez mais destrutivos.

À medida que aumentam, acabarão por derreter as camadas de gelo e elevar os níveis globais do mar, erradicar a floresta amazônica, descongelar o permafrost boreal e liberar gás metano e patógenos antigos, matar os recifes de coral e desligar a corrente do Oceano Atlântico que controla a temperatura da Europa. A crise climática levará à migração em massa e a guerras por recursos.

Mas o efeito imediato mais mortal é simplesmente o calor em si. Ele ataca a saúde humana em todos os níveis e já tira mais vidas a cada ano do que todos os outros desastres naturais juntos. O problema é tão grande e tão insidioso que ainda não compreendemos totalmente seu escopo.

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As mais de 2.300 mortes relacionadas ao calor nos Estados Unidos no ano passado foram apenas aquelas em que o calor foi um contribuinte óbvio. Um estudo de 2020 realizado por pesquisadores da Brown University, da Boston University e da University of Toronto sugeriu que o número real poderia ser mais de duas vezes maior. As mortes globais por calor não contabilizadas podem se aproximar de meio milhão por ano.

Leia mais: Como a crise climática afetará o crescimento da renda global nas próximas décadas

Quantificar a ameaça do calor à saúde é fundamental, mas é apenas o começo. As pessoas também precisam ser mais bem instruídas sobre seus perigos para que parem de se colocar em perigo. Isso inclui a mudança de uma atitude cultural em relação ao calor como “algo que deve ser aceito de bom grado, suportado com coragem, ignorado alegremente ou, no caso de algumas comunidades marginalizadas, totalmente merecido”, escreveram recentemente Umair Irfan e Aja Romano, da Vox.

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Com relação ao último ponto, as pessoas mais vulneráveis ao calor são idosos, crianças pequenas, pessoas com doenças subjacentes e pessoas sem ar condicionado. Os bairros marginalizados têm menos árvores e são os que mais sofrem com os efeitos das ilhas de calor urbanas. Todos merecem uma proteção melhor do que a que temos atualmente.

Enquanto isso, milhões de americanos que trabalham ao ar livre não têm alívio contra o calor. A Flórida e o Texas tornaram ilegal que os governos locais exijam que as empresas ofereçam aos funcionários sombra e intervalos para beber água regularmente.

A Administração de Segurança e Saúde Ocupacional (OSHA) do governo federal poderia salvar vidas ao impor padrões nacionais, mas só agora começou um processo de elaboração de regras que já dura anos.

E até mesmo a proposta da OSHA anunciada no mês passado, que atraiu uma reação política virulenta dos republicanos, deixará 7,9 milhões de trabalhadores públicos desprotegidos, informou o E&E News, do Politico, na quarta-feira (24).

Isso se deve ao fato de que a lei que criou a OSHA só lhe deu autoridade sobre empresas privadas. Os funcionários públicos devem contar com a proteção dos estados, e 23 deles não se preocuparam com isso.

Juntamente com a bizarra relutância da Federal Emergency Management Agency em considerar as ondas de calor como desastres naturais, esses são descuidos que o Congresso precisa corrigir.

Se, de repente, a atmosfera da Terra incluísse um gás incolor e inodoro que nunca desaparecesse e matasse e adoecesse milhões de pessoas todos os anos, consideraríamos isso uma emergência de saúde pública na escala de uma pandemia e provavelmente dedicaríamos toda a sociedade a uma guerra contra o gás incolor e inodoro. Deveríamos tratar o novo estado permanente de aquecimento global com a mesma urgência.

Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.

Mark Gongloff é editor e colunista da Bloomberg Opinion e escreve sobre mudança climática. Trabalhou para a Fortune.com, o Huffington Post e o Wall Street Journal.

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