Vitória do Partido Trabalhista no Reino Unido ajuda o mercado? Não é bem assim

Investidores devem ficar atentos aos planos fiscais e regulatórios do novo governo e seus impactos sobre o desempenho do mercado de ações; britânicos foram às urnas nesta quinta-feira (4)

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Bloomberg Opinion — Os investidores em ações do Reino Unido podem se sentir um pouco otimistas. Com a política dos Estados Unidos e da Europa parecendo cada vez mais bizarra, a Grã-Bretanha começa a se destacar como um farol de estabilidade em um mundo volátil.

As eleições gerais do país ocorreram nesta quinta-feira (4), e o Partido Trabalhista deve sair vencedor com uma maioria bastante robusta. As projeções de boca-de-urna indicam uma vitória por uma ampla margem (este artigo foi escrito antes da divulgação do resultado).

O consenso tem sido de que essa não é uma eleição que alguém gostaria de ganhar, pois os ânimos estavam exaltados para a votação. Mas, quando a poeira da eleição baixar, o novo governo deverá verá que recebeu um país razoável.

A influência desestabilizadora dos separatistas na Escócia está muito silenciada. O comércio líquido do Reino Unido pós-Brexit está se reequilibrando muito bem: segundo o economista Sanjay Raja, do Deutsche Bank, o país recentemente ultrapassou a França, a Holanda e Japão no total de exportações.

O Reino Unido saiu da recessão. O crescimento foi bom no primeiro trimestre deste ano (aumento de 0,7% trimestre a trimestre). O resto do ano também deve ser bom.

Raja aponta que a renda real disponível deve aumentar cerca de 3% em 2024, à medida que a inflação esfria e com os últimos cortes de impostos do Chanceler do Tesouro, Jeremy Hunt.

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Tanto as famílias quanto as empresas também possuem excesso de poupança – grande parte acumulada durante a pandemia e que ainda não foi gasta. Estima-se que o valor alcance 170 bilhões de libras esterlinas (US$ 217 bilhões) para as famílias e 58 bilhões de libras esterlinas (US$ 74 bilhões) para as empresas.

Com a redução das taxas de juros, esses consumidores começarão a gastar e as empresas devem começar a investir. De modo geral, segundo Raja, não há motivo para que o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) não seja de 1,5% em 2025 e 2026.

Não é um número perfeito, é claro – 1,5% em um país com uma população em rápido crescimento é, na verdade, um pouco decepcionante. Mas é pelo menos convidativo o suficiente para que se fale sobre os investimentos que devem entrar no Reino Unido após as eleições. Em algumas partes do mercado, os valores já começaram a entrar.

Nos primeiros seis meses do ano, diz Charles Hall, da Peel Hunt, houve 32 transações de fusões e aquisições de valor acima de 100 milhões de libras esterlinas (US$ 127,6 milhões) no mercado do Reino Unido. E 60% do total foram para compradores estrangeiros, com um prêmio médio de 40%, algo que definitivamente chamou atenção.

Somando tudo isso com os baixos valuations no Reino Unido e a perspectiva da chamada UK ISA – uma conta de poupança para investimentos em ações britânicas – ou a promessa do Partido Trabalhista de “agir para aumentar o investimento dos fundos de pensão nos mercados do Reino Unido”, o que aumentaria a demanda por ações do Reino Unido.

Os mais céticos dirão que a história se repete. Em 1997, o mercado acionário do Reino Unido estava tão tranquilo com a chegada de um governo do Partido Trabalhista com uma grande maioria que o FTSE 100 atingiu um recorde no dia da eleição. Tony Blair havia renunciado à nacionalização, abandonado os sindicatos e prometeu que não aumentaria o imposto de renda.

Em seguida, ele imediatamente entregou a política de taxas de juros a um Banco da Inglaterra independente, em um gesto destinado a deixar absolutamente claro que, sob seu comando, a economia seria administrada adequadamente. O mercado adorou – e subiu acentuadamente nos quase três anos que se seguiram.

Tudo isso teve um fim bastante complicado. Após atingir o pico em março de 2000, o índice de referência perdeu quase metade de seu valor nos três anos seguintes. Em seguida, teve uma recuperação de 80% em meados de 2007 – e então caiu pela metade no início de março de 2009.

A culpa poderia ter sido atribuída à crise financeira global, é claro, mas, como notou o historiador do mercado John Littlewood, no mesmo período o mercado acionário de Londres foi superado por todos os principais mercados, exceto o do Japão. Em 2010, o mercado britânico havia recuperado a maior parte de suas perdas, mas o governo já estava manchado.

No final, o padrão seguiu o de todos os governos do Partido Trabalhista desde a Segunda Guerra Mundial. Em 1945-1951, 1964-1970 e 1974-1979, as perdas reais dos índices foram, respectivamente, de 8%, 13% e 11% após o ajuste pela inflação, de acordo com Littlewood.

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Os governos do Partido Conservador tiveram um desempenho melhor: o mandato de 1970-1974 foi terrível (queda de 11,3%), mas os de 1951-1964 e 1979-1997 foram ótimos (74,8% e 166,7%). O período mais recente de 2010 até agora não é tão bom – se você tivesse comprado ações no dia da eleição em 2010, você estaria apenas empatado em termos reais.

Se você perguntar o que dá errado para os mercados durante os governos do Partido Trabalhista, raramente terá que procurar muito para encontrar a resposta: impostos e regulamentação. Na década de 1970, os mercados de ações do Reino Unido tiveram que suportar coisas que hoje parecem quase ridículas – o controle de dividendos é o exemplo óbvio.

Sob o comando de Gordon Brown, eles suportaram um fardo de novas regulamentações que, de acordo com a Câmara de Comércio Britânica na época, adicionaram custos da ordem de 77 bilhões de libras esterlinas (US$ 98,2 bilhões) e mudanças de políticas que foram seriamente prejudiciais ao mercado de ações.

Um exemplo de Littlewood: a abolição do imposto corporativo avançado, uma “reforma” que introduziu um elemento de dupla tributação (com o mesmo dinheiro pagando tanto o imposto corporativo quanto o imposto de renda) que efetivamente reduziu o valor dos dividendos pagos pelas empresas do Reino Unido em 17%.

É possível que o próximo governo do Partido Trabalhista não cometa nenhum dos erros de seus antecessores (ou mesmo do governo mais recente do Partido Conservador).

Mas o que ele vai herdar também não é tão bom quanto em 1997. Os custos do compromisso legal do Reino Unido com as emissões de carbono zero serão um entrave para o crescimento. A produtividade é horrível. O PIB per capita não melhora desde 2017. E a infraestrutura do Reino Unido está uma bagunça. Tudo isso em um momento em que a dívida é de 100% do PIB.

Isso significa que os impostos devem aumentar – e se eles não vão aumentar sobre a renda (ou assim diz Starmer), eles devem aumentar sobre a riqueza.

Será que o excesso de poupança será despejado nos mercados de ações se o imposto sobre ganhos de capital aumentar, se os dividendos forem tributados ainda mais ou se os subsídios para aposentadoria forem ainda mais limitados?

Quanto ao dinheiro estrangeiro, será que ele continuará entrando em uma economia em que as empresas estão limitadas pelos altos custos de energia ou por uma grande quantidade de novas regulamentações?

No dia da eleição, o mercado britânico pode estar se regozijando com a estabilidade e, espera-se, com bons anos pela frente, com base apenas nas baixas avaliações. Mas seria um investidor corajoso se apostasse que o governo de Keir Starmer seria o único a quebrar o recorde de retorno real negativo do Partido Trabalhista no pós-guerra.

Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.

Merryn Somerset Webb é colunista sênior da Bloomberg Opinion e escreve sobre finanças pessoais e investimentos. Foi editora-chefe da MoneyWeek e apresenta o podcast Merryn Talks Money.

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