Opinión - Bloomberg

Por que reguladores deveriam incentivar pagamentos digitais na América Latina

O uso de dinheiro vivo na região cai rapidamente, liderado por exemplos como o Brasil com o Pix, o que significa o acesso ao sistema financeiro formal a milhões de pessoas

O avanço do Pix no Brasil fez milhões de pessoas substituírem o dinheiro vivo pelo meio eletrônico de transferências e pagamentos
Tempo de leitura: 5 minutos

Bloomberg Opinion — Muitos dos grandes problemas da América Latina, desde a criminalidade até a desigualdade, parecem estar enraizados a ponto de serem intratáveis. Mas há uma área em que é possível encontrar boas notícias: na questão fundamental da informalidade e da inclusão financeira, a região tem dado saltos gigantescos.

A preferência pelos pagamentos em dinheiro na região – normalmente um reflexo de sua economia paralela – vem diminuindo rapidamente graças às crescentes alternativas de pagamento digital.

Ao mesmo tempo, o número de novas fintechs cresceu rapidamente, à medida que mais empreendedores e players tradicionais disputam um mercado em alta.

As autoridades e os órgãos reguladores devem promover essa tendência positiva: é uma oportunidade de incluir a população sem conta bancária ao tornar os produtos financeiros mais disponíveis para os trabalhadores formais e informais e permitir que as pequenas empresas expandam suas operações a um custo mais baixo.

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Ao mesmo tempo, isso ajuda a reduzir a infame burocracia da região e a estimular os tão necessários aumentos de produtividade por meio da tecnologia.

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As evidências dessa nova tendência são impressionantes: de acordo com um relatório de maio da McKinsey, em apenas dois anos, o cartão de débito substituiu o dinheiro como o método de pagamento preferido entre os latino-americanos de língua espanhola.

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Um estudo do Banco Interamericano de Desenvolvimento e da Finnovista, divulgado na semana passada, mostrou que o número de fintechs na América Latina e no Caribe cresceu 340%, chegando a mais de 3.000 empresas em apenas seis anos até 2023.

E sete em cada dez adultos latino-americanos já fizeram ou receberam pagamentos por meios digitais, de acordo com a pesquisa Beyond Borders 2024.

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Muitos fatores impulsionaram esses acontecimentos, entre eles o confinamento provocado pela pandemia de covid-19: meses de isolamento social e trabalho remoto significaram que milhões de pessoas testaram novas opções de pagamento móvel e plataformas digitais de bancos para evitar ir a agências físicas, familiarizando-se assim com essa mecânica.

A facilidade de uso, a velocidade e o melhor controle das despesas são citados entre os principais motivos para confiar em pagamentos digitais e cartões de débito, principalmente entre a população mais jovem. Há também motivos para a adoção de tecnologia: os latino-americanos são grandes usuários de telefones celulares e mídias sociais.

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O boom de remessas – houve quase US$ 160 bilhões em transferências para a região no ano passado – também fez com que os clientes usassem novas opções digitais para suas finanças.

A inovação é mais visível no Brasil, com o sistema de pagamento instantâneo do Banco Central, o Pix, que atingiu mais de 160 milhões de usuários desde seu lançamento no final de 2020. Isso é simplesmente revolucionário: em um passado não muito distante, era necessário ter um boleto impresso para ir ao banco efetuar o pagamento no caixa.

Agora, o Nubank (NU), com sede em São Paulo, já acumulou mais de 100 milhões de clientes em suas operações regionais, principalmente no Brasil mas também no México e na Colômbia, o que a torna um dos maiores bancos digitais do mundo.

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Na Argentina, a inflação anual de três dígitos teve o efeito colateral inesperado de impulsionar o uso de aplicativos de pagamento entre as pessoas que estavam cansadas de carregar cada vez mais notas sem valor em suas carteiras – ao mesmo tempo em que obtinham retornos decentes graças às opções de investimento das plataformas.

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É claro que é preciso superar grandes deficiências estruturais, desde a dificuldade de mudar o comportamento dos clientes até o charme irresistível do dinheiro vivo ao fazer transações irregulares ou que evitam impostos.

Na pesquisa da McKinsey, 70% dos entrevistados ainda disseram ter usado dinheiro vivo nos últimos 30 dias.

Essa é uma área óbvia em que o governo tem interesse em promover ferramentas digitais que ofereçam transparência e formalidade – a começar com as próprias plataformas de impostos e compras do estado e com o trabalho para a chamada interoperabilidade, que permite que diferentes aplicativos operem com qualquer comerciante ou cliente sem distinções regulatórias.

Pedro Rivas, diretor do Mercado Pago no México, também cita problemas de infraestrutura de telecomunicações, como a falta de cobertura de rede celular em partes do país. “Em uma escala de um a dez no ciclo de desenvolvimento do mercado, estamos apenas em quatro”, ele me disse. “O dinheiro continua sendo nosso principal concorrente”.

O Mercado Pago, braço fintech do Mercado Livre (MELI), relatou um aumento anual de 38% em usuários ativos mensais na América Latina durante o primeiro trimestre, para 49 milhões de clientes e mais de US$ 5,5 bilhões em ativos sob gestão.

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Com uma população de quase 130 milhões de habitantes e um mercado informal considerável, o México é o campo de batalha em que os bancos tradicionais e as fintechs estão acirrando a concorrência.

Os órgãos reguladores fariam bem em seguir a estratégia do Pix para acelerar o processo, principalmente agora que o Brasil planeja levar o sistema para além de suas fronteiras.

De qualquer forma, a era dos consumidores e comerciantes que obtêm qualquer coisa, de empréstimos a cartões de crédito, por meio de um aplicativo móvel chegou e é imparável. Graças à revolução digital, uma geração de latino-americanos que nunca teve acesso a serviços financeiros finalmente pode se beneficiar deles. E os pagamentos em dinheiro passam a dominar menos a região.

Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.

Juan Pablo Spinetto é colunista da Bloomberg Opinion e cobre negócios, assuntos econômicos e política da América Latina. Foi editor-chefe da Bloomberg News para economia e governo na região.

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