Profissão sob risco: uso de tênis avança em Wall St e deixa engraxates ociosos

Empresas tradicionais para engraxar sapatos demitem, fecham unidades e passam a oferecer limpeza de tênis à medida que sapatos sociais estão cada vez mais raros no mercado financeiro

Pessoas passando em uma rua. Foco em um homem usando tênis da marca Nike com roupa típica de escritório
Por Ignacio Gonzalez
24 de Junho, 2024 | 02:53 PM

Bloomberg — A Roman Shoe Repair of New York abriu sua loja em Wall Street em uma manhã de sexta-feira, como faz todos os dias da semana desde 1998. Três horas depois, recebeu seu primeiro cliente.

O negócio centenário de engraxar sapatos enfrenta dificuldades com a mudança de hábitos em relação às roupas de trabalho, uma vez que os trabalhadores têm valorizado mais o conforto do que a formalidade.

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Wall Street e outras empresas começaram a flexibilizar o dress code antes da pandemia, mas a tendência se acelerou depois dos anos em que as pessoas trabalhavam em casa de chinelos e moletom.

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Até mesmo o CEO do JPMorgan (JPM), Jamie Dimon, usa tênis no trabalho, e o traje casual chegou até ao Senado dos Estados Unidos. Para se adaptar, algumas lojas de engraxate passaram a oferecer serviços de limpeza de tênis.

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“O setor não é mais o mesmo”, disse Charlie Colletti, proprietário da Cobbler Express, uma loja de terceira geração de engraxates e consertos de calçados em Manhattan. “Fazemos alguns trabalhos com tênis, limpamos, tentamos nos manter atualizados.”

Homem em uma sapataria. Ele veste camisa clara, um avental escuro e um boné também escuro. Tem uma expressão neutra. Usa óculos e tem cabelo e barba brancos

Os serviços de limpeza de tênis ajudaram a Anthony’s Shoe Repair, que fica próximo do Grand Central Terminal, a sobreviver à pandemia.

Assim como engraxar sapatos sociais, esse é um serviço especializado. “Muitas pessoas não sabem como limpá-los”, disse o proprietário Teodoro Morocho. “É preciso ter o equipamento e o material certos para fazer isso bem feito.”

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As buscas por tênis de escritório subiram 181% desde janeiro de 2021, e os fabricantes de calçados esportivos visam funcionários de escritórios com opções mais casuais que são adequadas para o escritório.

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Parte do argumento da Allbirds para sua coleção de calçados para o dia-a-dia é o conforto para “passar algumas horas em sua mesa”, ao passo que a Nike (NKE) também sugere a troca de botas ou saltos altos por calçados mais confortáveis.

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A tendência dos tênis surge no momento em que o patamar de trabalhadores que vão para o escritório na região metropolitana de Nova York voltou ao equivalente à metade dos níveis pré-covid.

Gráfico

“Se eu observar o movimento, de cada dez pessoas que passam, oito delas estão de tênis”, disse Colletti. “A situação mudou muito. Wall Street não é mais a mesma, então você vê menos pessoas que precisam engraxar os sapatos.”

O aumento dos custos também atingiu os engraxates. O preço para engraxar os sapatos subiu de US$ 5 para US$ 10 neste ano na Anthony’s Shoe Repair, pois a inflação aumentou os custos de mão de obra e materiais como couro e graxa de sapato nos últimos anos. Mas eles ainda enfrentam dificuldades. “Não é como antes e nunca será”, disse Morocho.

A Edisson’s Shoe Repair, a dez quarteirões da Anthony’s Shoe Repair, também oferece serviços de limpeza de tênis – mas a diversificação para limpeza e reparos de tênis não foi suficiente para algumas empresas.

Tênis ganham espaço em Wall Street

As empresas de engraxates de sapatos têm fechado as portas e cortado pessoal.

A Arnold Shoe Repair, localizada a uma curta caminhada de dois minutos da loja de Morocho, fechou permanentemente no início deste ano, enquanto a Edisson’s Shoe Repair encerrou três lojas após a pandemia. Colletti costumava ter 16 funcionários, mas agora tem apenas dois – e um deles trabalha em meio período.

“Tínhamos muito movimento”, disse Colletti. “Nos anos 90, eu tinha um contrato com o Merrill Lynch”, disse ele, acrescentando que “ganhava muito dinheiro”.

Alguns sapateiros disseram que o ofício está em risco de extinção à medida que menos jovens entram no ramo.

“Eles não querem aprender essa arte”, disse Morocho. “Imagino que em cerca de 20 anos será difícil encontrar pessoas que trabalhem e que estejam interessadas em fazer isso.”

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