Opinión - Bloomberg

O que o Vale do Silício pode aprender com os ‘unicórnios’ de IA do Japão

A pressa em implantar ferramentas de IA resultou em erros embaraçosos para empresas como Google e OpenAI; é melhor seguir o exemplo da potência asiática e ir mais devagar

Tóquio
Tempo de leitura: 5 minutos

Bloomberg Opinion — O mote do Vale do Silício de “move fast and break things” (“aja rapidamente e inove”) impulsionou a inovação tecnológica na era da internet. Na era da inteligência artificial (IA), é melhor seguir o exemplo do Japão e ir mais devagar.

A pressa em implantar ferramentas de IA para o público resultou em erros embaraçosos, desde um recurso de buscas do Google alimentado por IA que recentemente recomendou uso de cola para fazer pizza, até consequências que podem afetar o sustento de pessoas reais, como a tecnologia por trás do ChatGPT da OpenAI que mostra sinais de preconceito racial ao classificar candidatos a emprego, conforme constatou uma análise da Bloomberg.

Isso também fez com que as empresas de tecnologia consumissem enormes quantidades de energia para alimentar a IA. A Agência Internacional de Energia (AIE) estima que o consumo total de eletricidade dos data centers em todo o mundo será aproximadamente equivalente à demanda de energia do Japão em 2026.

Outros analistas afirmam que, até 2030, esses data centers vão usar mais energia do que a Índia, o país mais populoso do mundo.

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Os grandes modelos de linguagem (LLM), a tecnologia que sustenta a mais recente safra de ferramentas de IA generativa, requerem uma quantidade gigantesca de dados, e treiná-los exige quantidades imensas de potência de computação e energia.

À medida que a tecnologia continua a se desenvolver, muitas empresas de IA acreditam que a chave para o crescimento é tornar esses grandes modelos de linguagem ainda maiores.

Alguns titãs da tecnologia dos EUA, incluindo o cofundador da Microsoft (MSFT), Bill Gates, e o CEO da OpenAI, Sam Altman, estão até mesmo apoiando empresas de energia nuclear para ajudar a alimentar os data centers de IA.

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Mas há outras opções além da pressa em ligar novos reatores nucleares para treinar modelos de IA.

Leia mais: Como a Nvidia se tornou a empresa mais valiosa do mundo, à frente de Microsoft e Apple

A startup Sakana AI, com sede em Tóquio – que o Nikkei Asia informou que se tornará a empresa japonesa a alcançar mais rapidamente o status de unicórnio – adotou uma abordagem diferente. Quando se trata da tecnologia mais importante de nosso tempo, a empresa pensa no longo prazo.

A Sakana – palavra que significa peixe em japonês – foi criada em 2023 por David Ha, Ren Ito e Llion Jones com o objetivo de aplicar ideias inspiradas na natureza, como evolução e inteligência coletiva, para criar modelos de IA, e não consumir o máximo de energia possível para treinar um único modelo de IA.

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Jones, notavelmente, foi coautor do artigo de pesquisa seminal de 2017, enquanto estava no Google, que sustenta a tecnologia dos produtos de IA mais populares de hoje, incluindo o ChatGPT, e estimulou grande parte do boom atual.

Ha contou que grande parte dos problemas enfrentados pela IA decorre do fato de as empresas implantarem prematuramente a tecnologia em busca de lucros a curto prazo, sem levar em conta o alto custo da energia.

Embora a tecnologia da Sakana pudesse ser usada para criar um chatbot de namorada virtual agora, eles estão mais focados em pesquisar maneiras de aplicar a IA para resolver problemas do mundo real.

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Isso está de acordo com outras empresas de IA do Japão das quais o Ocidente talvez nunca tenha ouvido falar, como a Preferred Networks, que tenta desenvolver chips de IA com maior eficiência energética.

Leia mais: Por que a obsessão do mercado com ‘unicórnios’ está com os dias contados

O Vale do Silício também precisa começar a pensar no longo prazo. O mundo não precisa de mais chatbots inúteis que geram poesia ruim ou perpetuam preconceitos racistas enquanto consomem uma quantidade insustentável de recursos.

Essa maneira de pensar também poderia ter poupado algumas das manchetes embaraçosas que fizeram com que grande parte do público decidisse não adotar a IA.

A pesquisa mais recente da Sakana visa novas maneiras de produzir modelos de IA que não exijam grandes quantidades de energia e tem ambições de longo prazo de ajudar o Japão em escala nacional a encontrar soluções reais para alguns de seus problemas mais urgentes, incluindo a iminente escassez de mão de obra. Sua missão recebeu apoio do governo japonês.

No Japão, a queda no aumento da população e a redução da força de trabalho levaram a um ecossistema dos setores público e privado que busca abraçar as possibilidades da tecnologia emergente com curiosidade e esperança, em vez de desespero.

Há um senso de urgência em torno da ideia de que essas ferramentas podem ajudar a resolver a escassez de mão de obra – com menos medo existencial de que elas acabem substituindo os trabalhadores humanos.

O presidente da Microsoft Japão, Miki Tsusaka, elogiou o poder da IA generativa para acelerar o crescimento em um país com uma população envelhecida em uma entrevista à Bloomberg TV no início desta semana.

Seus comentários vêm na esteira do anúncio da Microsoft de que gastará cerca de US$ 2,9 bilhões, seu maior investimento de todos os tempos no Japão, para aumentar a computação em nuvem e a infraestrutura de IA.

O fato de ser um aliado americano próximo também ajudou o Japão no atual boom – o país acolheu uma série de investimentos em tecnologia dos EUA que anteriormente poderiam ter sido canalizados para a China.

Juntamente com a Microsoft, a OpenAI abriu seu primeiro escritório na Ásia em Tóquio, enquanto a Oracle (ORCL) se comprometeu a investir mais de US$ 8 bilhões nos próximos 10 anos em computação em nuvem e IA.

Leia mais: Citi prevê que IA vai substituir mais empregos em finanças do que qualquer outra área

O Japão, avesso a riscos, perdeu seu lugar como líder global em tecnologia nas últimas décadas, mas o boom da IA, ainda em sua infância, é algo totalmente diferente.

Desta vez, sua abordagem cautelosa e coletiva em relação à tecnologia significa que Tóquio está em uma posição única para sair na frente quando se trata de acertar na IA. O resto do mundo pode, em breve, tentar correr atrás do prejuízo.

Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.

Catherine Thorbecke é colunista de opinião da Bloomberg e cobre tecnologia na Ásia. Anteriormente, foi repórter de tecnologia na CNN e na ABC News.

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