Bloomberg Opinion — O apelo do cirurgião-geral dos Estados Unidos na segunda-feira (17) para que as redes sociais exibam rótulos de advertência sobre saúde é uma ótima manchete, mas não mudará hábitos prejudiciais. São necessárias ações mais enérgicas.
Inspirando-se nos esforços antitabagismo que começaram na década de 1960, a proposta do Dr. Vivek Murthy, segundo escreveu ele no New York Times, “lembraria regularmente aos pais e adolescentes que as redes sociais não são comprovadamente seguras”.
Ele quer que o Congresso americano aprove a ideia, afirmando que “as evidências dos estudos sobre tabaco mostram que os rótulos de advertência podem aumentar a conscientização e mudar o comportamento”.
Eu apoio as amplas conclusões de Murthy sobre as redes sociais e seus riscos para o público. Está cada vez mais claro que limitar seu impacto na saúde mental e aumentar a interação pessoal entre os jovens parece ser tão vital quanto combater a dependência da nicotina. Mas as táticas usadas para a crise de saúde de uma geração anterior não são mais adequadas para a situação atual.
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Com o tabaco, o objetivo era obrigar as pessoas a parar de fumar, não moderar o hábito, porque não há benefícios em fumar e não há desvantagens em parar. Obviamente, o mesmo não pode ser dito sobre as redes sociais, como Murthy reconheceu em seu parecer sobre redes sociais, publicado no ano passado.
“As redes sociais podem trazer benefícios para alguns jovens ao proporcionar [sensação de participar de] uma comunidade positiva e conexão com outras pessoas que compartilham identidades, habilidades e interesses”, afirmou. “Elas podem fornecer acesso a informações importantes e criar um espaço para a expressão individual.
A distinção faz com que a presença de advertências nas redes sociais não seja um começo, mas apenas outra janela que os usuários fecharão instintivamente enquanto navegam.
Os usuários de redes sociais não precisam ser lembrados sobre os danos – eles os sentem instintivamente. O problema é que eles se sentem impotentes para fazer algo a respeito.
Intervenções dos pais, seja ao proibir o uso dos dispositivos por seus filhos ou limitar seu tempo de uso, não alteraram a dinâmica mais poderosa que torna o uso das redes sociais tão predominante e prejudicial.
Pais que procuram tomar medidas mais drásticas para seus filhos, como permitir que eles usem um celular com menos recursos, correm o risco de isolá-los de seus colegas.
Felizmente, Murthy está bem ciente das deficiências das mensagens rótulos de advertência. Na verdade, eu me pergunto se a sugestão é, em grande parte, um esforço de publicidade, projetado para chamar mais atenção para suas recomendações mais práticas, que, apesar de terem sido promovidas por um ano, ainda não estão nem perto de se tornar realidade.
As outras ideias de Murthy transferem o ônus de pais estressados para órgãos maiores, como escolas que exigem ambientes livres de telefones, ou para as próprias redes sociais, que podem resolver alguns desses problemas em escala.
Murthy quer restrições apropriadas à idade para “notificações push, reprodução automática e rolagem infinita” – três recursos comuns das redes sociais criados para manter os usuários dentro das plataformas.
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As empresas se opuseram à maioria das propostas. Na segunda-feira, um grupo de lobby do setor de tecnologia disse que exigir avisos de advertência seria um abuso de poder por parte do governo.
O Vale do Silício argumenta que a ligação entre o uso das redes sociais e a deterioração da saúde mental ainda não foi estabelecida. Ao mesmo tempo, as empresas resistem aos esforços para abrir suas plataformas para uma análise adequada de especialistas independentes em saúde pública, como Murthy está pedindo.
Ele está certo em seguir em frente na ausência de evidências absolutamente definitivas (que talvez nunca cheguem). Como ele escreve, “Em uma emergência, você não pode esperar pelas informações perfeitas. Você avalia os fatos disponíveis, usa seu melhor julgamento e age rapidamente”.
Mas ele precisa de ajuda. Avisos de advertência fazem pouco sentido para qualquer pessoa que entenda como funcionam as redes sociais e provavelmente se tornariam tão invisíveis para os americanos quanto os avisos sobre aceitação de cookies ou termos e condições.
Murthy só chegará mais perto de atingir seu objetivo de criar “ambientes on-line mais seguros e saudáveis” ao mudar as empresas que operam as redes sociais à força. Infelizmente, o Congresso americano não parece compartilhar de sua urgência.
Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.
Dave Lee é colunista da Bloomberg Opinion e cobre a área de tecnologia dos EUA. Foi correspondente para o Financial Times e a BBC News.
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