Projetos em LatAm têm melhor eficiência de capital, mas faltam recursos, diz Claure

Em entrevista à Bloomberg Línea, bilionário investidor diz que ‘América Latina costumava ser o quintal dos EUA, mas estão adormecidos’, e isso abre espaço para fundos como os sauditas

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Rio de Janeiro — O bilionário investidor Marcelo Claure é um entusiasta declarado da América Latina e acredita que as oportunidades na região superam a disponibilidade de capital. Ele se envolveu diretamente para viabilizar o evento global FII Priority no Brasil na semana passada, que contou com o apoio financeiro do PIF (Public Investment Fund), fundo soberano da Arábia Saudita.

“Uma das razões pelas quais eu fui uma parte importante para realizar o evento no Brasil foi para que pudéssemos trazer mais de 900 investidores de todo o mundo. Assim, eles poderiam conhecer o potencial da América Latina”, disse Claure em entrevista à Bloomberg Línea no Rio de Janeiro. A sua holding, o Claure Group, tinha um estande no local do evento, no Copacabana Palace.

Ele afirmou que não foi uma missão trivial convencer os responsáveis a trazer a conferência para o Brasil. O evento foi organizado pelo FII (Future Investment Initiative) Institute, fundado em 2017 com apoio do PIF e que busca servir como um catalisador de investimentos de impacto ao redor do mundo em áreas como energias renováveis, tecnologia e esporte.

“Mas passamos muito tempo explicando a eles [sauditas] que a América Latina tem tamanho, 660 milhões de pessoas, e que os latino-americanos ganham dinheiro”, disse Claure.

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A tese do boliviano, que anteriormente foi COO do SoftBank, um dos maiores grupos do mundo em apoio financeiro a empresas de tecnologia, é conectar investidores globais com empreendedores locais.

Claure é sócio da eB Capital, que, no início do mês, assinou um acordo com investimentos em conjunto com a Arábia Saudita. Essa parceria pretende inicialmente levantar um fundo com US$ 600 milhões para aportes em ativos na América Latina. A gestora brasileira conta Eduardo Melzer, Luciana Ribeiro e Pedro Parente, ex-CEO da Petrobras e da BRF, como sócios fundadores.

No evento realizado no Copacabana Palace, Claure participou de três painéis e dividiu palco com nomes como o ex-secretário de Estado dos EUA Mike Pompeo e e Magda Chambriard, nova CEO da Petrobras.

‘Quintal dos EUA, mas não mais’

Segundo Claure, o convencimento dos investidores do Oriente Médio começa a dar resultados. Além do evento e da parceria com a eB Capital, o Mubadala, fundo soberano dos Emirados Árabes Unidos, é um dos investidores do Bicycle, seu fundo lançado em 2023 para investimento em tecnologia.

“Olhe para Mubadala, o Brasil é uma parte significativa [dos investimentos], crescendo rapidamente, ‘roubando’ [dinheiro do] private equity. O fato de que a FII está aqui pelos sauditas é um testemunho de que eles querem olhar para a América Latina”, disse.

“Isto [a América Latina] costumava ser o quintal dos Estados Unidos. Acho que os americanos estão adormecidos e isso está permitindo que outras partes do mundo, que agora são uma parte crítica de todo o sistema financeiro, venham para a América Latina”, ponderou.

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‘Melhor eficiência de capital’

“A América Latina tem a melhor eficiência de capital de qualquer país em qualquer região do mundo. Se você olhar para a avaliação do exit [saída do investidor do negócio] na América Latina em comparação com a quantidade de capital que foi alocado, temos a melhor relação absoluta, o que significa que os empreendedores latino-americanos, uma vez que você investe, fazem um ótimo trabalho de gerenciamento do dinheiro.”

Segundo Claure, o principal problema da região não é a falta de empreendedores ou inovações, mas a escassez de capital.

Ele disse acreditar que a América Latina abriga alguns dos mais talentosos empreendedores e startups do mundo, especialmente no setor de fintech. No entanto a barreira crítica reside em trazer investimentos suficientes para que essas empresas possam florescer e se expandir globalmente.

‘Falta ambição’

Um ponto de frustração para Claure, por outro lado, é o que apontou como falta de ambição de alguns empreendedores que visam apenas o mercado local. Ele acredita que empreendedores latino-americanos têm o potencial de competir e triunfar globalmente, citando exemplos de sucesso como Nubank (NU), Mercado Livre (MELI) e Globant (GLOB), entre outros.

“O Nubank é estudado em todo o mundo como o banco digital mais avançado, mais lucrativo e melhor administrado do mundo. A Globant disputa contratos grandes de implementação de IA e outros com a Accenture. O Quinto Andar, adoro como eles completamente disruptaram o negócio de aluguel no Brasil. A Kavak foi uma das primeiras pioneiras de como disruptar o mercado de carros usados e eu poderia continuar e continuar”, disse.

“Portanto, só quero garantir que meu objetivo na vida seja trazer capital suficiente para os empreendedores latino-americanos para que possam replicar minha história. Fui o primeiro empreendedor [da região] que realmente construiu um número um global com a BrightStar. Quero ver mais Nubanks, mais Globants e Mercado Livres”, completou.

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O investidor e empreendedor se referiu à empresa de serviços que fundou em 1997 e que oferece de seguros e manutenção a trocas e reparos de equipamentos em casas e tem bancos, operadoras e varejistas como clientes. Hoje está presente em mais de 30 países - com o nome Likewize nos EUA. O controle foi adquirido pelo SoftBank em 2013 por US$ 1,26 bilhão.

Apesar das preocupações históricas de investidores institucionais com a estabilidade política e econômica, Claure argumentou que a América Latina atualmente apresenta um cenário mais estável do que muitas outras regiões. Ele mencionou uma gestão responsável das políticas monetárias durante a pandemia de covid-19 como um exemplo de resiliência.

“Sempre digo às pessoas que a estabilidade política da América Latina é significativamente melhor do que o que está acontecendo na Europa e nos EUA. As moedas têm se comportado incrivelmente bem porque temos bancos centrais independentes.”

“A América Latina foi incrivelmente responsável durante a covid: foram os primeiros a aumentar as taxas de juros e, depois, os primeiros a baixar as taxas de juros, e por eassa razão as moedas estão se fortalecendo”, disse Claure.

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