Opinión - Bloomberg

Apple mira em revolução e praticidade do iPad, mas acerta em desconfiança na IA

O anúncio do tablet da Apple, apresentado na terça-feira (7), visava exibir toda a praticidade do produto, mas interpretações diferentes alertaram para os riscos da tecnologia para artistas

Cena da propaganda "Crush", do novo iPad Pro, da Apple
Tempo de leitura: 4 minutos

Bloomberg Opinion — Acho difícil acreditar que ninguém na equipe de marketing da Apple (AAPL) tenha previsto o ocorrido. Talvez eles fossem tímidos demais para se manifestar. Talvez tenham sido ignorados. Talvez não se importassem.

Mas certamente alguém na sede da empresa em Cupertino, na Califórnia, poderia compreender a imagem sombria da nova propaganda do iPad – intitulada simplesmente “Crush!” – na qual uma máquina compressora gigante espreme lentamente uma pilha de ferramentas e instrumentos associados às artes e à cultura.

Primeiro, um trompete, que se dobra. Depois, há tinta espirrando por toda parte. Uma escultura de um busto – esmagada. Um piano vertical, também esmagado, com cordas e martelos voando e fazendo um barulho horrível. As lentes de câmeras fotográficas se estilhaçam.

A mensagem do anúncio era sugerir que todas essas ferramentas maravilhosas poderiam agora ser fielmente recriadas usando um dos novos iPads anunciados em um evento na terça-feira (7). Mas muitos tiveram opiniões diferentes, e a reação do público ganhou força.

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“É uma imagem terrivelmente cruel”, escreveu um usuário em resposta à publicação da propaganda pelo CEO Tim Cook no X, antigo Twitter.

“Que vergonha”, escreveu o artista HappyToast. “A Apple confundiu o anúncio de seu novo iPad com uma propaganda de suas ferramentas de inteligência artificial (IA), mostrando toda a criatividade humana sendo esmagada até desaparecer”.

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Essa é a pior gafe de marketing da Apple desde que a empresa incluiu um álbum da banda irlandesa U2 em seus aparelhos e não permitiu que ele fosse apagado pelos usuários.

O caso apela para nossos amplos temores de que os recentes avanços drásticos na tecnologia sejam um grave risco para a alegria, a autenticidade e a espontaneidade da criatividade humana.

Durante décadas, a publicidade da Apple tomou como base o otimismo em relação à tecnologia. Sua emblemática propaganda inspirada na obra 1984 de George Orwell e dirigida por Ridley Scott, colocava a Apple como a salvadora do individualismo contra a conformidade – e nós acreditamos.

Posteriormente, os consumidores foram agraciados com a excelente propaganda do iPod, com os característicos fones de ouvido brancos pendurados e uma trilha sonora bombástica. A propaganda anunciava um mundo em que era mais fácil comprar, ouvir e colecionar a preciosa música.

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À medida que a Apple amadureceu, sua publicidade se tornou mundana. Tons suaves e cenas alegres exibem os principais recursos do iPhone e outros de maneira informativa, embora não inspiradora.

Leia mais: Apple retoma negociação com OpenAI para recursos de IA generativa no iPhone

Com esse último esforço, a Apple claramente decidiu ser um pouco mais ousada para promover seus novos iPads – cuja linha de produtos precisava ser reformulada devido à queda nas vendas e a uma espécie de crise de identidade sobre a finalidade exata de seu uso.

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A Apple acabou veiculando uma propaganda que se tornou um gatilho. Ao longo da vida da empresa, o sentimento em relação à tecnologia mudou profundamente. Atualmente somos mais céticos em relação aos danos de longo prazo ao nosso bem-estar ou aos efeitos da divisão política possibilitada pela tecnologia.

O momento revolucionário do ChatGPT em 2022 aumentou os temores. Pela primeira vez, discutimos sobre o que poderia acontecer quando um computador tivesse amplas habilidades para superar até mesmo os seres humanos mais brilhantes.

Diante de inúmeras perguntas sem resposta, parecia haver apenas uma aposta certa: o poder cada vez maior das implacáveis big techs.

A Apple gasta muito em iniciativas de IA e começou a alardear que seus produtos são os melhores da categoria em IA. Saberemos mais sobre o trabalho de IA da empresa em junho, em sua conferência anual de desenvolvedores, na qual a empresa estará sob pressão para mostrar que não ficou atrás da Microsoft (MSFT) e de outras empresas.

Nesses estágios iniciais da IA, as artes ficaram mais vulneráveis do que a maioria.

Mais da metade dos adultos nos EUA se preocupa com os efeitos da IA na música, de acordo com uma pesquisa recente da YouGov, sendo que as principais preocupações são a falta de originalidade e o impacto nos meios de subsistência dos músicos humanos.

Pouco mais de um em cada 10 adultos (11%) disse que apoiaria os artistas de IA.

Enquanto isso, a OpenAI e outros criadores de IA são processados pela descarada coleção de trabalhos que não lhes pertencem e pelo uso desses trabalhos para treinar a IA.

De modo geral, um estudo separado da Pew sugere que mais americanos estão preocupados do que animados com a IA.

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É surpreendente que a Apple não tenha sido capaz de captar esses sentimentos. Duvido que a empresa tenha tido essa intenção. Um porta-voz sem dúvida dirá que o iPad é amigo dos criativos e diminui a barreira para gravar músicas ou produzir arte.

Isso é verdade, é claro, mas estamos falando do grande cenário dos efeitos da IA. Se a Apple quiser se vender para os criativos, ela precisa mostrar que os entende. Como metáfora, a máquina esmagadora é um desastre publicitário.

Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.

Dave Lee é colunista da Bloomberg Opinion e cobre a área de tecnologia. Foi correspondente em São Francisco para o Financial Times e a BBC News.

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