Austin — Robôs dotados de Inteligência Artificial não deveriam ser encarados com maniqueísmo, seja como máquinas à prova de erros ou como as que vão causar mal à humanidade. Mas, sim, como aquelas que podem trazer benefícios específicos para a sociedade, desde que incorporados de maneira planejada.
Esse foi o tom de um painel que discutiu temas como benefícios, desafios de segurança e questões éticas emergentes no primeiro dia de programação do South by Southwest (SXSW), um dos principais eventos de inovação do mundo, realizado em Austin, no estado do Texas, nos EUA.
Os avanços da IA em robótica foram analisados e discutidos por Andrea Thomaz, cofundadora e CEO da Diligent Robotics, Peter Stone, professor na Universidade do Texas em Austin, e Bill Smart, professor na Universidade Estadual de Oregon, em painel acompanhado pela Bloomberg Línea.
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Para Stone, há benefícios do uso da robótica para serviços específicos como o cuidado de idosos.
O professor da Universidade do Texas deu um exemplo e comentou que, em tese, seria evidente proibir o acesso de um robô equipado com câmera a um banheiro. Por outro lado, se uma pessoa idosa cai no banheiro, seria necessário que o robô tivesse acesso ao local. “Demoramos anos para aprender julgamentos de certo ou errado e é difícil programar esse julgamento para um robô”, disse.
Ele disse ainda que a sociedade impõe um padrão muito alto para acidentes com robôs, mas que, na verdade, não há tantos incidentes assim. “É como aviões, que as pessoas pensam que são menos seguros do que carros. Estatisticamente, há mais acidentes com carros, mas as manchetes são diferentes”, disse.
“Há riscos, sim, com a tecnologia. É tentador querer pensar na perfeição. Mas, para carros autônomos, os robôs podem dirigir melhor do que as pessoas, pois as pessoas dirigem mal”, afirmou.
Para Stone, um ponto fundamental é tentar avançar na questão do controle dos robôs. “Há maneiras de controlar um robô em termos de segurança para que ele não faça força para atravessar um objeto que encontre no meio do caminho, por exemplo, mas que desvie. Isso faz uma diferença em termos de segurança. Creio que muito tem a ver com percepção do público”, disse Stone.
Convivência com robôs
Smart, da Universidade de Oregon, concordou com o ponto de que a compreensão do comportamento dos robôs é algo crucial. Ele fez uma analogia ao relacionamento das pessoas com os cachorros, em que o aprendizado ao longo do tempo, quando existe, torna o processo mais natural.
“As crianças hoje são nativas de Inteligência Artificial Generativa. Eventualmente, teremos crianças que crescerão com robôs, e elas poderão distinguir no que os robôs são melhores do que os humanos e no que não são. As pessoas têm que se acostumar e crescer com isso”, complementou Stone.
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Andrea Thomaz, por sua vez, afirmou que poder contar com robôs em casa será um “desenvolvimento conjunto”, dado que muitas pessoas já pensam em maneiras de otimizar tarefas que os robôs já podem cumprir.
Segundo a CEO da Diligent Robotics, é possível fazer uma analogia também com a regulação em hospitais, em que a estrutura permite a passagem de camas de tamanho maior pelos corredores, bem como de cadeiras de rodas, sendo totalmente compatíveis com normas de acessibilidade.
“Existem estruturas semelhantes que facilitam o trabalho dos robôs. Se alguém estiver pensando em construir uma casa verdadeiramente habilitada para robôs, seria necessário pensar no design dos corredores, no layout dos objetos e em que lugares são armazenados.”
“A cozinha, por exemplo, não seria projetada para mãos muito habilidosas, mas sim para aquelas menos habilidosas. Isso significa que se tornaria fácil para acenar ou até mesmo ‘conversar’ com a gaveta por meio de Bluetooth para dar um comando para abri-la, por exemplo”, disse.
Segundo os especialistas, assim como placas nas estradas são colocadas para orientar as pessoas, é importante adaptar o ambiente para facilitar o trabalho dos robôs, com códigos QR, entre outros.
Fator confiança
Stone complementou que há pessoas que confiam demais nos robôs, enquanto outras não o fazem.
Segundo Thomas, apesar das regulações, no fim tudo volta para o fator de confiança. “As pessoas se perguntam se um robô com câmera salva as imagens ou se usa apenas para sua coordenação. E a verdade é que nós não temos ainda bons modelos de regulação”, disse. “Há muita preocupação de privacidade envolvida em robôs com IA.”
Smart, professor de Oregon, complementou dizendo que se preocupa que as pessoas pensem nos robôs como “dispositivos mágicos”, quando, na verdade, não são imunes a erros. “Quando você olha alguns dos debates, há alguma percepção de coisas mágicas, coisas conscientes, e eu me preocupo sobre a influência disso na legislação e que, no fim do dia, isso nos deixe mais lentos com a adoção da tecnologia.”
Para Stone, falar sobre robôs ao longo dos anos envolveu durante muito tempo uma percepção quase que maniquísta de que “ou é algo que vai nos destruir ou que salvar o mundo”.
“Agora não temos visto mais manchetes tão alarmistas e o público em geral e os legisladores estão com os olhos mais abertos do que cinco anos atrás”, disse Stone. Nesse momento do painel, Smart complementou dizendo que a Inteligência Artificial generativa como o ChatGPT “não é má”.
“Às vezes é meio estúpida, mas não é má.”
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