Bloomberg — Um pouco de glitter, comum no carnaval, é como uma garrafa de champanhe na véspera de Ano Novo: é só diversão até a manhã seguinte. O glitter tradicional é um microplástico, o que significa que a maioria dele acaba em corpos d’água após um único uso. Este ano, a União Europeia proibiu a venda de glitter plástico solto, citando os impactos ao meio ambiente.
Isso não significa que a festa acabou, pelo menos não se depender dos fornecedores do Bioglitter. Inventado pela Ronald Britton, fornecedora britânica de pó de metal, o Bioglitter se decompõe naturalmente em ambientes de água doce em quatro semanas, de acordo com seus materiais de marketing.
“Ambientalmente, os microplásticos, por seu tamanho menor, se espalham literalmente por todo o ambiente”, diz Paul Anastas, diretor do Centro de Química Verde e Engenharia Verde da Universidade de Yale. “A questão é que eles podem ser encontrados em seres vivos - de plantas a pequenos organismos, grandes organismos, vida marinha e, sim, humanos.”
A jornada do Bioglitter começou cerca de 12 anos atrás, quando a Ronald Britton realizou uma reunião para discutir as reclamações de um cliente de cosméticos sobre os impactos ambientais do glitter plástico. Na época, era o único tipo de glitter que a empresa vendia.
“Voltando de carro, pensei: precisamos substituir isso por algo”, diz Andrew Thompson, gerente de produto do Bioglitter na alemã Sigmund Lindner, que comprou a marca da Ronald Britton no início deste ano. “Falando com um ou dois fabricantes na época, ficou evidente que ninguém realmente tinha uma boa solução para o problema de como substituir o plástico.”
A Ronald Britton decidiu criar seu próprio produto. Após consultar especialistas em biodegradabilidade, a empresa concentrou-se em um glitter que pudesse se degradar com segurança em água doce – menos ambicioso do que um glitter que se biodegrada em ambientes marinhos (mais complexos), mas melhor do que um produto que só se decompõe em condições industriais de compostagem.
“A química da água doce em rios e lagos ao redor do mundo é muito semelhante. É bem compreendida. E os métodos de teste laboratorial que recriam as condições de água doce são muito bem estudados”, diz Stephen Cotton, gerente de vendas de glitter da Signmund Lindner. “Então usamos isso como nosso guia.”
O glitter tradicional é feito de uma fina folha de dois tipos de plástico: cloreto de polivinila (PVC) e polietileno tereftalato (PET). É então revestido com alumínio para dar brilho e cortado em pequenos pedaços hexagonais. A equipe da Ronald Britton decidiu substituir o plástico por celulose regenerada, o material das paredes celulares das plantas.
Para criar a base de celulose do Bioglitter, a empresa obtém polpa de madeira da Europa, muitas vezes de árvores de eucalipto. A madeira é certificada pela FSC ou PEFC, um selo que indica florestas geridas de acordo com rigorosos padrões de sustentabilidade.
Depois que a madeira é transportada para as duas fábricas do Bioglitter na Alemanha, as moléculas de celulose são extraídas da polpa e reconstituídas em um filme transparente, que é então revestido com uma fina camada de alumínio e cor.
O teste final da criação da Ronald Britton foi o processo de certificação de água doce, administrado pela empresa de teste e inspeção TUV Austria. O processo pode levar até 12 meses, exige uma detalhada descrição de todas as matérias-primas e custa mais de US$ 50.000.
“Queríamos nos diferenciar e realmente mostrar como nossos produtos eram os melhores do mundo”, diz Cotton. O processo levou 10 meses e foi concluído em janeiro de 2019; agora, a Ronald Britton promove o Bioglitter como o único glitter biodegradável em água doce certificado atualmente no mercado. Seus primeiros compradores vieram da indústria de cosméticos.
Mesmo com a certificação, as credenciais do Bioglitter não são perfeitas. Um estudo em 2021 descobriu que tanto o glitter biodegradável quanto o convencional têm efeitos prejudiciais na vida vegetal em habitats de água doce, e que o glitter com núcleo de celulose incentiva o crescimento de espécies invasoras.
“Quando falamos de greenwashing, sempre pensamos: você está dando uma visão excessivamente positiva do que está fazendo?”, diz Wren Montgomery, professora associada de sustentabilidade na Ivy Business School da Western University no Canadá. “Eu acho que isso está dando uma visão excessivamente positiva.”
Mesmo que o Bioglitter se degrade, isso não significa que devemos permitir, diz Rafael Auras, professor de sustentabilidade de embalagens na Michigan State University, já que o processo de degradação adiciona celulose não natural aos ecossistemas.
À medida que os microplásticos recebem mais atenção, a demanda pelo Bioglitter está crescendo. Depois dos clientes de cosméticos, vieram os eventos festivos ecologicamente corretos, depois a indústria de artesanato, depois as roupas.
No início deste ano, a Guess lançou uma linha de camisetas e moletons impressos com BioGlitter. A aquisição do Bioglitter pela Sigmund Lindner, em maio, foi motivada pelo desejo de “resolver o problema do glitter”, diz Cotto.
A empresa ainda está aprimorando o Bioglitter para melhorar seu efeito de brilho e sua utilidade. Atualmente, o produto vem em três efeitos diferentes.
O Biosparkle tem um acabamento metálico tradicional, enquanto o BioHolo tem um efeito mais holográfico. Biopure, além de um visual opalescente, substitui o revestimento de alumínio que induz o brilho por um feito de mica natural ou sintética.
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