Bloomberg Opinion — Cada vez mais há evidências de que o setor sem fins lucrativos dos Estados Unidos está falhando em alguns aspectos básicos. Especificamente, faltam ações para acabar com as desigualdades injustas e as barreiras às oportunidades.
Veja o caso dos hospitais filantrópicos. De acordo com os dados, estes quase não se comportam de forma diferente dos hospitais com fins lucrativos: os preços não são sistematicamente mais baixos, e eles não fazem mais para ajudar as pessoas. Alguns estudos mostram pequenas diferenças, mas é difícil argumentar que os hospitais sem fins lucrativos são mais caridosos ou têm prioridades mais altruístas.
Outro exemplo: universidades de prestígio. Em Harvard, por exemplo, mais de dois terços dos alunos de graduação vêm dos 20% mais ricos da distribuição de renda, enquanto apenas 4,5% vêm dos 20% mais pobres. Considerando que Harvard tem um fundo patrimonial de aproximadamente US$ 50 bilhões e goza de isenção de impostos, seria de se esperar que distribuísse seus benefícios de forma mais uniforme – nem que fosse para evitar a publicidade negativa.
A essa altura, não é surpresa alguma ler um estudo que detalha o quanto algumas instituições sem fins lucrativos são desiguais. Por isso, fiquei agradavelmente surpreso ao ler uma pesquisa, publicada esta semana, que adotou uma nova abordagem: uso de dados de geolocalização para examinar quais lugares são os melhores – e piores – para reunir americanos ricos e pobres.
Infelizmente, os museus tiveram uma pontuação especialmente ruim, e a maioria deles não tem fins lucrativos. As igrejas também não se saíram bem, embora sua retórica tenda a ser muito favorável aos pobres. E há muitos lugares no setor privado com fins lucrativos que tiveram pontuações ruins. As farmácias, por exemplo, tendem a ser muito locais, e seus clientes refletem a segregação de renda de seus bairros.
E quais são os melhores em atrair clientes de todos os níveis de renda? As redes de restaurantes. Não necessariamente fast-foods, mas os chamados restaurantes casuais. Os ricos e os pobres nos Estados Unidos só se reúnem verdadeiramente em lugares como Olive Garden e Applebee’s.
Onde moro, no norte do estado da Virgínia, notei que os restaurantes chineses de alta qualidade, mas baratos, têm uma clientela especialmente mista. A combinação de preços mais baixos e culinária regional, que pode ser um sinal de gosto refinado, parece agradar a um amplo grupo demográfico.
Esses tipos de restaurantes conseguem reunir ricos e pobres, criando um ambiente no qual muitos dos marcadores tradicionais de status estão ausentes. Nenhum desses lugares poderia ser descrito como chique, e a mistura ocorre em parte porque muitos clientes de renda mais alta estão dispostos a curtir um ambiente com menos protocolos sociais.
Essas descobertas levantam uma questão: se o objetivo é tornar-se mais igualitário, há algo que as instituições sem fins lucrativos dos EUA possam aprender com seus restaurantes casuais?
Uma lição é que é mais difícil convencer as pessoas mais pobres a se misturarem com as mais ricas em ambientes nos quais a cultura é moldada para se alinhar com um status socioeconômico mais elevado. As igrejas, por exemplo, geralmente são gratuitas e abertas a todos, mas os pobres não parecem tão interessados em participar de cultos religiosos em bairros mais ricos. Talvez isso aconteça porque eles não consideram a igreja mais como um “serviço melhor” (seja qual for a definição), mas sim como um ambiente em que não se sentem totalmente confortáveis ou bem-vindos.
Em outras palavras: instituições ou estabelecimentos mais ricos atraem uma base mista de clientes ou usuários somente quando abrem mão do controle cultural. Vitrais maiores e bancos mais confortáveis podem fazer muito pouco para atrair frequentadores de igrejas de baixa renda. Um aparte: uma característica interessante do marketing de “cultura” (por falta de uma palavra melhor) na internet é que ele pode ser amplamente atraente. A música clássica no YouTube, por exemplo, não é apenas gratuita, mas também não tem um tipo de apelo esnobe.
O modelo de negócios do setor sem fins lucrativos dos EUA depende da produção de status e reputação, tanto para si mesmo quanto para seus afiliados. Muitas organizações sem fins lucrativos trabalham na criação de ambientes de um tipo muito específico, tanto para arrecadar dinheiro quanto para aumentar sua influência. Para as elites, esses ambientes são inócuos e até mesmo inspiradores. Mas essas mesmas elites estão começando a perceber que o que é convidativo para uma pessoa é desagradável para outra.
Para ser justo, a questão de como ser mais igualitário aflige mais do que apenas o setor sem fins lucrativos. A ascensão da política populista em todo o mundo, por exemplo, pode ser explicada, em muitos aspectos, pelo fracasso das elites e dos especialistas em adaptar seu apelo aos eleitores comuns.
Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.
Tyler Cowen é colunista da Bloomberg Opinion. É professor de economia na George Mason University e escreve para o blog Marginal Revolution. É coautor de “Talent: How to Identify Energizers, Creatives, and Winners Around the World”.
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