Bloomberg Opinion — A Soho House, badalada rede de clubes privados para os descolados e prósperos, está chegando à Cidade do México. E, embora a exclusividade seja parte de seu apelo – talvez até mesmo toda a ideia –, a sede do clube na capital mexicana testará duramente sua proposta de valor.
Não me entenda mal: tenho certeza de que a Soho House da Cidade do México, a primeiro unidade na América Latina, será espetacular. A inauguração está prevista para setembro, mas posso informar que o endereço é bastante ousado, em um edifício barroco reformado no bairro histórico de Juárez.
O desafio para o Soho House da Cidade do México é o mesmo da economia mexicana como um todo: o aparentemente implacável peso. Embora represente um voto de confiança no México, ele também pode causar estragos nos setores da economia mais expostos à concorrência internacional.
A moeda mexicana, que subiu cerca de 40% nos últimos anos, aumentou muito o custo da associação à Soho House em dólares. Dos mais de 40 locais do clube em todo o mundo, somente a “Little Beach House” em Malibu, com vista para o Oceano Pacífico, é mais cara.
A anualidade da Soho House da Cidade do México custará 47.000 pesos, o que equivale a cerca de US$ 2.727 (R$ 13.108) – um pouco mais do que os associados pagam em Nova York e quase o dobro do que pagam no Soho House original em Londres.
Não se trata de um prêmio sobre os mercados emergentes: em Istambul, a associação anual custa US$ 1.692. A comparação é baseada no site de preços da Soho House, considerando o custo anual para acesso a uma única casa e usando as médias de junho para as moedas estrangeiras relevantes.
Fundadores e pessoas com menos de 27 anos têm desconto. Para uma associação na Cidade do México, há uma taxa única adicional de introdução de 20.500 pesos (cerca de US$ 1.223).
Isso não é culpa da Soho House: a movimentação brusca da moeda tende a produzir essas distorções, e elas podem ser exacerbadas por variações nos custos locais e na demanda dos clientes. Mas há evidências anedóticas de que o peso está muito forte.
Um Big Mac na Cidade do México, por exemplo, custa 89 pesos, o que, nas taxas de câmbio atuais, equivale a US$ 5,27 (R$ 25,34). Isso é quase o mesmo que o preço americano de US$ 5,36 listado no índice Big Mac deste ano, publicado pela The Economist, e significa que o peso está supervalorizado quando ajustado pelo poder de compra.
O Soho House ignora o impacto dessas flutuações. “Somos muito consistentes com o preço cobrado em todo o mundo”, diz Jarrett Stuhl, diretor de operações da Soho House para as Américas. A empresa “não está preocupada com o câmbio quando ela chega. Queremos nos concentrar em fazer o que é certo localmente, aqui no mercado, e o que o mercado pode pagar”.
É verdade que o chamado super peso ainda não teve um grande impacto sobre a economia em geral, que deve crescer perto de 3% novamente neste ano. As exportações do México vão principalmente para os Estados Unidos, portanto, a perda de competitividade causada pela valorização da moeda mexicana pode levar mais tempo para se tornar aparente.
Mas os preços se ajustarão à nova taxa de câmbio nos próximos meses, tornando as exportações mexicanas mais caras em comparação com as de outros países, diz Gabriela Siller, diretora de análise econômica do Grupo Financiero BASE, em Monterrey. E o efeito do super peso já é evidente em setores como o turismo: as chegadas ao país por vias aéreas cresceram apenas 1,1% em maio em comparação com o ano anterior.
É difícil encontrar previsões definitivas sobre o rumo que o peso está tomando. A Oxford Economics diz que o peso está supervalorizado em “pelo menos” 20% e prevê uma queda, assim como muitos outros analistas.
Há vários fatores cíclicos que poderiam prejudicar o fascínio do peso, inclusive uma recessão nos EUA, que obviamente prejudicaria a demanda por produtos mexicanos e serviços turísticos, e uma redução da atual diferença de 600 pontos-base entre as taxas de juros do México e de seu vizinho do norte.
Ao mesmo tempo, parece haver algo mais fundamental apoiando o peso: o México está na moda atualmente. Não é por acaso que o Soho House escolheu a Cidade do México. “Tudo se origina aqui”, diz Stuhl, citando a comunidade empresarial e cultural da cidade. “O ditado que tenho ouvido ao longo dos anos é: se você acertar a Cidade do México, acertará o resto da América Latina.”
Apesar da crise de segurança, do compromisso pouco firme com o estado de direito e dos problemas sociais, o México se integra cada vez mais à economia dos EUA, tornando-se seu principal fornecedor – e cada vez mais atraente para os investidores estrangeiros.
Uma pesquisa recente colocou o México como o principal destino para expatriados em 2023. A aceleração dos fluxos de remessas (no valor de quase US$ 61 bilhões nos últimos 12 meses) e o crescimento mais rápido do que o esperado também são outras fontes de apoio.
Conforme apontado pelo Goldman Sachs (GS) em um relatório recente, o peso pode estar cada vez mais supervalorizado e, ainda assim, permanecer “desvalorizado por períodos substanciais de tempo”, dadas as mudanças nos padrões de comércio global.
Em um exercício teórico, Teresa Alves, do Goldman, utilizou instâncias anteriores de avaliação errônea do peso para avaliar a supervalorização atual e descobriu que, em um cenário de desvalorização “moderada”, o peso mexicano poderia chegar a 16,60 por dólar e, em um cenário mais extremo, poderia ser negociado a 15,10 – nível não visto em quase uma década.
Se isso acontecer, uma associação ao Soho House da Cidade do México pode não parecer um negócio tão ruim.
Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.
Juan Pablo Spinetto é editor-chefe de economia e governo da Bloomberg News na América Latina.
Veja mais em Bloomberg.com
Leia também
Milionários de NY aproveitam crise dos escritórios para comprar ‘pechinchas’