Nike perde o ímpeto da pandemia e terá que se reinventar mais uma vez

Gigante de artigos esportivos sofre com o fim da febre dos sneakers e a perda de apelo entre mulheres, e os investidores perceberam que ela terá que enfrentar dias de luta

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Bloomberg Opinion — A Nike (NKE) foi uma das empresas que se beneficiaram dos programas de estímulo do governo americano durante a pandemia. Quando consumidores tiveram que ficar em casa devido aos lockdowns e não tinham no que gastar o benefício, acabaram optando por comprar produtos da gigante de artigos esportivos.

Em 2020, os Air Jordan 1 Highs saíam por um prêmio de 61% no mercado de revenda. O preço das ações da Nike subiu 40% em 2020 e até 25,5% em 2021, para um recorde em novembro. Apenas quatro analistas de Wall Street, dos mais de 30 que cobriam a Nike na época, recomendaram aos investidores para “manter” as ações, o que muitas vezes é interpretado como uma recomendação de venda.

Infelizmente, esses dias de glória parecem ter ficado no passado.

As ações da Nike caíram 37% em relação ao seu pico. O número de analistas que recomendam manter as ações da empresa triplicou para 12.

Em sua demonstração de resultados para o exercício fiscal de 2023, publicado na semana passada, a empresa divulgou ter o equivalente a US$ 8,5 bilhões de mercadorias não vendidas, apesar de ter lançado uma série de promoções para tentar reduzir os estoques – em níveis cerca de 23% acima do que a própria empresa descreveu como saudáveis em 2021.

Sua expectativa de vendas para o exercício fiscal de 2024 ficou aquém das estimativas dos analistas. E os cobiçados Air Jordan 1 Highs? Eles agora são revendidos com um desconto de 2%. Isso leva a uma pergunta incômoda: a “bolha dos sneakers” de um mercado de US$ 152 bilhões está estourando? A resposta, pelo menos para a Nike, pode ser sim.

“De modo geral, a Nike é uma marca sólida e não sofre uma crise existencial”, disse Neil Saunders, analista da GlobalData Retail, em nota aos clientes. “No entanto ela também não está na dianteira e precisa aceitar que o próximo ano será de redefinição, contenção e reformulação da maneira como faz negócios.”

Um ponto fraco para a Nike é sua relação simbiótica com o mercado de revenda de sneakers, já que os revendedores rapidamente adquirem os estoques. Isso criou um fator de escassez para os calçados da empresa, o que permitiu que ela vendesse o que havia em estoque por um preço muito alto.

Em alguns aspectos, não é muito diferente do mercado de ingressos para shows. Mas, com a normalização das cadeias de abastecimento e a inflação elevada há dois anos, há sinais de que os consumidores estão sendo mais criteriosos quando se trata de gastos. Em suas listas de prioridades, sneakers caros estão bem longe do topo.

Outro problema para a Nike é que a empresa passa por um declínio na inovação - não lançou um tênis de sucesso desde o Nike React em 2019. Ao mesmo tempo, marcas independentes de tênis cresceram e empresas de vestuário de luxo entraram no negócio de calçados.

Os tênis da Hoka, adquiridos pela Deckers Outdoors em 2012 por US$ 1,1 milhão, agora geram cerca de US$ 1,4 bilhão em receita anual.

Enquanto a Nike é conhecida pelo estilo, a Hoka oferece conforto e desempenho e se tornou um dos preferidos para maratonistas, corredores casuais e fãs de tênis confortáveis. No ano passado, a Hoka ultrapassou Nike, Adidas, New Balance e Converse como a segunda marca de tênis mais vendida na StockX. A empresa francesa de roupas esportivas Salomon tem o tênis mais vendido do site de revenda.

O histórico da Nike com mulheres atletas também a deixa em desvantagem para capitalizar o crescente mercado de vestimentas que unem o casual com o funcional para exercícios, um mercado estimado em US$ 63 bilhões nos Estados Unidos.

A Nike manchou sua reputação entre as mulheres após um exame minucioso da cultura corporativa da empresa e do tratamento dado às atletas grávidas.

Várias atletas famosas, como a campeã olímpica de ginástica Simone Biles e a jogadora da WNBA Breanna Stewart, não renovaram seus contratos com a Nike, optando por empresas como Athleta, Gap, Puma e Lululemon (LULU), nas quais podem ter mais criatividade para criar seus produtos.

Com a desaceleração das vendas de tênis, a incapacidade da Nike de se conectar com as mulheres consumidoras é um risco. Se quiser sobreviver ao cenário de roupas esportivas em constante mudança, a empresa precisará expandir sua lista de atletas mulheres e acrescentar novas roupas e calçados exclusivos criados para elas.

O lado bom para a Nike é que ela parece reconhecer suas limitações. A empresa anunciou várias mudanças de executivos no mês passado em um esforço para “oferecer inovações revolucionárias” que poderiam trazer o tipo de criatividade e novidade de que a marca precisa.

E, na semana passada, anunciou uma nova iniciativa voltada para as mulheres, chamada Nike Well Collective, que incluirá 1.000 novos instrutores de exercícios focados em bem-estar holístico e uma série de novos exercícios em seus aplicativos. No final do verão no hemisfério Norte, a empresa lançará um tênis exclusivo com a estrela do New York Liberty Sabrina Ionescu, chamado Nike Sabrina 1.

Nos esportes, não há história maior do que a da volta por cima – o atleta aposentado que faz um retorno triunfante. Pode ser prematuro fazer essa comparação com a Nike, mas é fundamental que a empresa convença clientes e investidores de que pode voltar aos dias de glória.

Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.

Leticia Miranda é colunista da Bloomberg Opinion e escreve sobre bens de consumo e indústria varejista. Foi repórter de negócios na NBC News e repórter de varejo na BuzzFeed News.

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