Opinión - Bloomberg

Férias com trabalho: manter rotina do escritório em viagens pode ser desvantajoso

Com o trabalho remoto e híbrido, funcionários puderam unir uma viagem de férias à rotina do trabalho, mas a falta de limites claros entre obrigação e lazer pode ser prejudicial

Aeroporto de Atlanta, nos Estados Unidos
Tempo de leitura: 3 minutos

Bloomberg — A temporada de férias escolares chegou e as companhias aéreas estão satisfeitas: a Associação de Segurança nos Transportes dos Estados Unidos espera que o número de passageiros ultrapasse os níveis pré-pandemia no período de verão do país. Em um fim de semana recente, quase 10 milhões de pessoas passaram por um dos mais de 400 aeroportos dos EUA, mas pressupor que todos estavam saindo de férias é errado.

Isso porque muitos viajantes praticarão o chamado “workation” – trabalhar (work, em inglês) remotamente durante as viagens de férias (vacation) – algo que parte de uma tendência crescente que leva a ideia de trabalho híbrido um pouco ao pé da letra.

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A estratégia, que faz parte da premissa de “trabalhar de qualquer lugar” e que vem surgindo cada vez mais, prova que os limites entre licença remunerada e não remunerada estão ficando mais confusos.

Isso está acontecendo por três motivos.

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Primeiro, culturalmente, americanos tendem a achar que férias são para os fracos. Não é de surpreender que menos da metade dos funcionários use seus dias de férias e que os EUA estejam muito atrás da maioria dos países avançados no que se refere à oferta de um mínimo de dias de férias anuais.

O país tem, na verdade, uma fobia de férias – um problema que remonta ao início da era industrial. Um artigo publicado há quarenta anos no Industrial Relations Law Journal sobre a política de férias foi bem sucinto: “as partes tendem a redigir disposições ambíguas de elegibilidade para férias”. O argumento é de que lobos não precisam de férias.

Em segundo lugar, estão sendo feitas tentativas bastante genuínas para satisfazer as pessoas que não suportam trabalhar apenas no escritório. Em resposta, as companhias aéreas Star do Japão introduziram o “Star Pass” para atrair passageiros de voos domésticos de e para Tóquio, tanto a trabalho quanto a lazer.

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Embora não seja uma ideia totalmente nova, a ideia ganhou força desde a covid-19. A pandemia fez com que o burburinho sobre o trabalho flexível ficasse mais intenso, e agora ele não mostra sinais de diminuir, sinalizando o desejo de equilíbrio entre vida pessoal e profissional – nessa ordem.

Mas o terceiro motivo é menos bem-intencionado do que o segundo, e mais alinhado com o primeiro. A tendência de trabalhar durante as férias pode ser uma maneira secreta de manter as pessoas trabalhando, mesmo quando elas precisam se desligar.

Está surgindo uma batalha entre gerentes hiperestressados que tentam atender à clara demanda dos funcionários por liberdade e à igualmente clara demanda de executivos por trabalho presencial e monitorado. Talvez isso explique por que uma em cada cinco empresas dos EUA não tem políticas transparentes sobre o trabalho híbrido.

No entanto, outros países estão implementando trabalho flexível em todo o mundo. O Quênia está entre os mais recentes a considerar essa possibilidade, e o “direito de se desconectar” está no centro do debate.

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Eu defendo o aumento da flexibilidade no trabalho – tanto em mindset como em práticas de horário e local de trabalho. E sou totalmente a favor da redução de algumas soluções injustas (e insalubres): no Reino Unido, por exemplo, as pessoas estão bastante escandalizadas com a nova pesquisa da empresa de bolsas de nicotina Hyapp, que mostra que o fumante médio acaba tendo um intervalo remunerado de 20 minutos por dia, o que equivale a trinta e nove horas por ano – cerca de uma semana inteira de férias a mais.

Só não sou a favor dos limites confusos entre descanso e flexibilidade no trabalho. Sim, a tecnologia ajuda quem precisa ficar sempre online: as vendas de computadores desktop caíram mais de 25% no final do ano passado, enquanto o mercado global de laptops deve crescer 4% (mais de 5% na Ásia), chegando a US$ 234 bilhões até 2030. E sim, há uma conveniência em poder trabalhar um pouco aqui e ali e não ser obrigado a usar os dias de férias.

Mas, antigamente, precisávamos desligar os computadores desktop e levantar da mesa. Chegou a hora de restabelecer esse limite com os laptops. Pelo menos de vez em quando.

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Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.

Julia Hobsbawm é colunista do Bloomberg Work Shift e fundadora do The Nowhere Office.

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