Pão de Açúcar à venda: mercado discute volta de Abilio Diniz ao controle

Empresário da família fundadora do GPA é atualmente acionista relevante e membro do conselho do rival Carrefour, mas eventual retorno é visto como alternativa viável por analistas

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Bloomberg — A decisão do francês Casino de vender o controle do Grupo Pão de Açúcar (PCAR3), anunciada nesta segunda-feira (26) na França, trouxe de volta ao mercado apostas na alternativa de o empresário Abilio Diniz e família reassumirem o controle da tradicional empresa do varejo do país. O Casino detém 40,9% das ações ordinárias do GPA, enquanto 59% estão em circulação no mercado (free float).

Abilio e família travaram há uma década uma batalha com o CEO do Casino, Jean-Charles Naouri, para seguir à frente do GPA, mas perderam e acabaram saindo do grupo que havia sido fundado pelo patriarca Valentim Diniz.

Abilio posteriormente montou posição e se tornou um dos principais acionistas do Carrefour global. Hoje ele é também acionista relevante e vice-presidente do conselho de administração do Carrefour Brasil (CRFB3).

A Península, gestora da família Diniz, não respondeu ao pedido de comentário.

O GPA tinha um market cap da ordem de R$ 4,5 bilhões nesta segunda-feira, o que implica que a fatia de 41% Casino, sem prêmio pelo controle, esteja na casa de R$ 1,8 bilhão.

Não está claro se Abilio tentaria retomar o controle da empresa fundada por seu pai em uma operação pessoal ou por meio do Carrefour, dado que se tornou um acionista relevante.

Analistas ouvidos pela Bloomberg Línea apontaram expectativas de melhoria operacional da companhia em caso de eventual retorno do GPA para as mãos de seus fundadores.

A hipótese de venda do GPA já era motivo de especulação no mercado há alguns anos. Ganhou força neste ano com o aprofundamento da crise financeira do Casino. Na sexta passada (23), o Casino vendeu sua última fatia (11,7%) do grupo atacadista Assaí, em uma operação estimada em R$ 2 bilhões.

Nesta segunda-feira, ações do GPA tiveram queda de 5,21%, para R$ 16,75 no fechamento. Pela manhã, tiveram as negociações suspensas até 10h23, no começo do pregão. Os papeis acumulavam ganhos de 7% neste ano até a última sexta-feira (23) - e de 6% em 12 meses.

“O movimento [anúncio de venda do Casino] veio em linha com o que observamos na semana passada, com o grupo se desfazendo da sua posição no Assaí”, disse Gabriel Costa, analista da Toro Investimentos, corretora do Santander Brasil.

No material divulgado na França, o Casino informou que trabalha na execução em 2023 e 2024 de um plano de venda de ativos “non-core” que inclui ativos na América Latina (GPA e Éxito).

“GPA e Éxito são ativos que poderão ser vendidos como parte do plano de três anos de venda de ativos do Grupo Casino, sendo que nesta data não há cronograma, metas definidas ou processo de venda em aberto para o GPA. O único projeto ativo neste momento envolvendo essas duas empresas é a segregação dos negócios de GPA e Éxito”, disse o VP de Finanças do GPA, Guillaume Gras, em fato relevante divulgado no meio da tarde.

Segundo o analista da Toro, a avaliação é que, em busca de um prêmio pelo controle, o Casino pode efetuar a venda de toda a participação no GPA, em vez de realizar o desinvestimento em etapas. “A princípio, observamos uma grande diferença entre a operação realizada com o Assaí. Na ocasião, o Casino se desfez de uma parcela de 11,7% da empresa, ao passo que a posição no GPA é muito maior.”

Para a equipe de analistas de varejo da XP, liderada por Danniela Eiger, não há ainda candidatos claros no mercado para adquirir o controle do GPA. Relatório da XP apontou que o mais provável é o surgimento de algum investidor estratégico ou financeiro como compradores. Analistas descartam o interesse de players como Grupo Mateus (GMAT3) e esperam que a possível venda ocorra somente em 2024.

Efeitos para a governança

Para Danielle Lopes, sócia e analista de Ações da Nord Research, o desembarque do grupo francês do GPA seria vista pelos investidores como benéfica, bem como a possibilidade de retorno da família Diniz ao comando da rede supermercadista.

“O Abilio já tem comentários recentes sobre a possibilidade de retorno. Isso seria bastante benéfico. A família opera o negócio desde a fundação. Nunca deu problemas aos acionistas minoritários, como foi o caso do Casino, e consequentemente fizeram a empresa entregar bons resultados”, comentou Lopes.

Ela apontou ainda que, em uma eventual troca de controle, as ações da GPA tenderiam a ser negociadas sem o desconto relacionado ao risco de governança atribuído ao grupo francês.

“O Casino tem histórico de prejudicar acionistas minoritários, como no passado, quando queimou caixa e não pagou dividendos na venda das ações do GPA para o Éxito, empresas do mesmo grupo. Foi uma transação que deixou o investidor bastante receoso, pois teve um valor muito acima do mercado, em um claro risco de governança, além de o Casino ter entregue resultados ruins após a era Abílio”, disse Lopes.

Segundo Eduardo Yamashita, diretor de operações da Gouvêa Ecosystem, consultoria especializada em varejo, “os ativos do GPA são estrategicamente relevantes com lojas muito bem localizadas, marca forte e reconhecida, canal e operação digital maduros, programa de loyalty como referência no mercado”. Por essas razões, ele disse acreditar que “muitos grupos, nacionais e internacionais, são potenciais compradores” e considera a família Diniz como uma “candidata natural” aos ativos por sua exposição no Carrefour.

João Daronco, analista da Suno Research, também avaliou que anúncio do Casino pode favorecer os investidores do GPA. “É mais um movimento para destravar valor para os acionistas do GPA”. Ele avaliou que o plano de expansão do GPA não deve ser afetado pela expectativa de mudança de controlador. “Meu cenário-base não é esperar que o plano de expansão seja congelado.”

Júlia Monteiro, analista da corretora MyCap, afirmou que o mercado ainda aguarda informações sobre o modelo da possível venda do controle do GPA.

“O Casino pode fazer com o GPA como ocorreu com o Assaí: vender em block trade com as corretoras, a fim de evitar uma queda do preço da ação, sem colocar a mercado. A operação do Assaí foi considerada um sucesso, rendeu mais do que se imaginava”, disse Monteiro.

A analista da MyCap também disse avaliar que um possível retorno da família Diniz ao comando do GPA seria positivo. “O Abilio tem expertise e conhece bastante o negócio. Ele faz parte de outros conselhos. Ele tinha cláusulas de non compete, condições em que ele não poderia comprar o GPA de volta.”

Dificuldades do GPA

O último balanço do GPA mostrou uma companhia com dificuldades financeiras. No primeiro trimestre, reportou um prejuízo de R$ 315 milhões em operações continuadas, com uma queda de margem bruta para 24,4%, redução de 2,5 pontos percentuais em 12 meses. O resultado foi atribuído à alta da inflação no custo das mercadorias e à dificuldade no repasse para os clientes, além da necessidade de reposicionamento das bandeiras, segundo a analista Georgia Jorge, do BB Investimentos.

Neste momento, o mercado acredita que o GPA vai dar prosseguimento à estratégia de dedicar foco ao segmento de lojas de menor porte, com destaque para regiões de público de maior poder aquisitivo.

A apresentação do planejamento estratégico para os próximos anos não impediu um rebaixamento da recomendação para as ações. A analista do BB revisou, por exemplo, o valuation do GPA, cortando o preço-alvo de R$ 20,60 para R$ 14, com recomendaçao de venda, para o final de 2023.

Entre as justificativas da mudança, a analista citou a queda das margens operacionais e a rentabilidade esperada para os próximos anos, a exclusão da operação do Grupo Éxito das projeções em razão da segregação entre GPA e Éxito com a redução de capital e a incorporação do plano de expansão, com premissas mais conservadoras, considerando a abertura de 80% das 300 lojas previstas até 2024.

“Os principais riscos existentes à tese de investimento do GPA são a acirrada competição entre alguns mercados, afetando a rentabilidade do negócio, a incapacidade de entender o comportamento e a necessidades do consumidor, a dificuldade para implementar de forma bem-sucedida sua estratégia multicanal, e a incapacidade de gerenciar adequadamente o estoque, gerando rupturas nas vendas”, apontou a analista do BB Investimentos.

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