A visão de 5 especialistas do mercado sobre o comunicado do Copom

Comitê de Política Monetária do Banco Central manteve a taxa Selic mais uma vez em 13,75% ao ano e não sinalizou de forma clara um corte na próxima reunião

Juros estão em 13,75% ao ano desde agosto de 2022
21 de Junho, 2023 | 08:38 PM

Bloomberg Línea — Nesta quarta-feira (21) no fim da tarde, o Copom anunciou que decidiu manter a taxa básica de juros da economia (Selic) em 13,75% ao ano. A taxa está neste patamar desde agosto de 2022. A decisão foi tomada por unanimidade entre os membros do Comitê de Política Monetária do Banco Central.

Pela primeira vez desde que começou a subir os juros, em março de 2021, o comunicado do Banco Central (BC) amenizou o tom e retirou uma frase considerada hawkish, “de que não hesitará em retomar o ciclo de ajustes se cenário” presente nos últimos comunicados.

Ainda assim, o Banco Central não deu sinais do momento em que os juros podem cair, enfatizando que sua estratégia tem funcionado.

Economistas ouvidos pela Bloomberg Línea afirmaram que o teor do comunicado foi hawkish e que a probabilidade de um corte nos juros em agosto, como o mercado precificava, é baixa. Veja as avaliações:

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Marco Caruso, do Banco Original

O economista-chefe do Banco Original destacou dois pontos no comunicado do Banco Central.

“Eles escrevem que os próximos passos dependem de uma lista de coisas que todo mundo já sabe, como dinâmica inflacionária, os componentes que são mais sensíveis a juros, ao PIB, às expectativas. Então as próximas decisões dependem de dados.”

“Sempre dependem, mas só de eles incorporarem isso no texto reforça que eles não estão só esperando o CMN definir a meta de inflação, não tem um grandíssimo evento que faria os juros caírem. Tem que olhar todas essas coisas e elas têm que sugerir que se está no caminho certo.”

O outro ponto indicado por Caruso é o que o levou a entender que o Copom está menos hawkish (rigoroso no combate à inflação). A retirada de um trecho que citava nos comunicados passados um cenário alternativo, com a Selic no patamar de 13,75% indefinidamente, mostra que os diretores do BC entendem que ela deverá cair em algum momento.

“O comunicado da decisão foi claramente mais hawkish do que o mercado esperava, e inclusive a gente, e também pelo que estava precificado.”

Marília Fontes, da Nord Research

Analista de renda fixa da Nord Research, Marília Fontes também avaliou o comunicado como duro, dado que o Comitê reforça, por exemplo, que o crescimento do PIB foi puxado pelo agronegócio e que a inflação em 12 meses deve voltar a subir no segundo semestre.

“Talvez o Copom tenha usado essa linguagem dura para manifestar que vai o corte vai ser zero ou 25 pontos no máximo. Isso para o mercado não se animar e precificar meio ponto. Ele deixou uma porta aberta, mas reforçou diversas vezes que ainda é necessário cautela e parcimônia. Então, se houver uma queda da Selic na próxima reunião, ela vai ser de 0,25 ponto percentual.”

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André Perfeito

O economista André Perfeito, ex-Necton Investimentos, disse entender que o BC está mantendo os juros em patamar acima do que deveria. Além disso, estaria abrindo mão de definir os juros por si mesmo, entregando essa responsabilidade para os preços do mercado.

“Que pese a retirada do trecho em que apontava que poderia subir os juros (em aparente boa fé com o momento atual), volta a ficar claro que a atual diretoria irá insistir em abrir mão de decidir e que terceiriza ‘tecnicamente’ para as expectativas de mercado. É algo um tanto diferente do estilo dessa mesma diretoria, que cortou os juros mais que o esperado pelo mercado, que subiu mais que o esperado pelo mercado e está mantendo de lado por mais tempo que o esperado pelo mercado.”

Étore Sanchez, da Ativa Investimentos

O economista-chefe da Ativa Investimentos destaca a permanência das expectativas desancoradas como um ponto de atenção do Banco Central. E que as análises da corretora já apontavam isso como um obstáculo para um corte nos juros.

“O BC reconheceu a melhora da conjuntura, mas afirmou que o processo desinflacionário tende a ser mais lento e que, por expectativas de inflação desancoradas, segue demandando cautela e parcimônia. Temos ressaltado fortemente o aspecto da desancoragem das expectativas, na qual qualificamos em nosso morning call como ‘fator condicionante para que se preserve a estratégia monetária’, o que fora reforçado pela autoridade”.

Étore entende que ao reforçar o peso da desancoragem das expectativas em seus cálculos, a importância da reunião do CMN no dia 29 de junho aumenta.

“Vale salientar que o debate sobre a elevação do juro neutro não se tornou evidente nesse comunicado, o que deverá ser ponto de atenção na ata a ser divulgada na próxima terça-feira.”

Idean Alves, da Ação Brasil Investimentos

“O tom do comunicado veio mais hawkish que o esperado. Mas um pouco suave, se comparado aos comunicados das reuniões anteriores. Chama a atenção o fato de o comitê ainda não sinalizar que teremos corte de juros na próxima reunião, o que vai contra o que o mercado esperava.”

“Na minha visão, o cenário atual está melhor que o esperado e isso deve se materializar em corte em algum momento no ano de 2023″, analisou o economista Idean Alves, chefe da mesa de operação do escritório de agentes autônomos Ação Brasil Investimentos.

Alves prevê que a Selic deverá ser mantida em 13,75% na próxima reunião, momento em que deve haver a sinalização de quando o corte poderá ocorre. “Esse corte se dará muito provavelmente na reunião de setembro. O Copom está bem assertivo no discurso e não vai mudar agora.”

Veja o comunicado do Copom na íntegra

“O ambiente externo se mantém adverso, ainda que com revisões positivas para o crescimento do ano. Apesar da atenuação do estresse envolvendo bancos nos EUA e na Europa, a situação segue demandando monitoramento. Os bancos centrais das principais economias permanecem determinados em promover a convergência das taxas de inflação para suas metas, inclusive com a retomada de ciclos de elevação de juros em algumas economias, em um ambiente em que a inflação se mostra resiliente.

Em relação ao cenário doméstico, o conjunto dos indicadores mais recentes de atividade econômica segue consistente com um cenário de desaceleração da economia nos próximos trimestres. O crescimento acima do esperado no primeiro trimestre refletiu principalmente o forte desempenho do setor agropecuário. Não obstante o arrefecimento recente dos índices de inflação cheia ao consumidor, antecipa-se uma elevação da inflação acumulada em doze meses ao longo do segundo semestre. Ademais, diversas medidas de inflação subjacente seguem acima do intervalo compatível com o cumprimento da meta para a inflação. As expectativas de inflação para 2023 e 2024 apuradas pela pesquisa Focus recuaram e encontram-se em torno de 5,1% e 4,0%, respectivamente.

As projeções de inflação do Copom em seu cenário de referência* situam-se em 5,0% em 2023 e 3,4% em 2024. As projeções para a inflação de preços administrados são de 9,0% em 2023 e 4,6% em 2024.

O Comitê ressalta que, em seus cenários para a inflação, permanecem fatores de risco em ambas as direções. Entre os riscos de alta para o cenário inflacionário e as expectativas de inflação, destacam-se (i) uma maior persistência das pressões inflacionárias globais; (ii) alguma incerteza residual sobre o desenho final do arcabouço fiscal a ser aprovado pelo Congresso Nacional e, de forma mais relevante para a condução da política monetária, seus impactos sobre as expectativas para as trajetórias da dívida pública e da inflação, e sobre os ativos de risco; e (iii) uma desancoragem maior, ou mais duradoura, das expectativas de inflação para prazos mais longos. Entre os riscos de baixa, ressaltam-se (i) uma queda adicional dos preços das commodities internacionais em moeda local, ainda que parte importante desse movimento já tenha sido verificado; (ii) uma desaceleração da atividade econômica global mais acentuada do que a projetada, em particular em função de condições adversas no sistema financeiro global; e (iii) uma desaceleração na concessão doméstica de crédito maior do que seria compatível com o atual estágio do ciclo de política monetária.

Considerando os cenários avaliados, o balanço de riscos e o amplo conjunto de informações disponíveis, o Copom decidiu manter a taxa básica de juros em 13,75% a.a. e entende que essa decisão é compatível com a estratégia de convergência da inflação para o redor da meta ao longo do horizonte relevante, que inclui o ano de 2024. Sem prejuízo de seu objetivo fundamental de assegurar a estabilidade de preços, essa decisão também implica suavização das flutuações do nível de atividade econômica e fomento do pleno emprego.

A conjuntura atual, caracterizada por um estágio do processo desinflacionário que tende a ser mais lento e por expectativas de inflação desancoradas, segue demandando cautela e parcimônia. O Copom conduzirá a política monetária necessária para o cumprimento das metas e avalia que a estratégia de manutenção da taxa básica de juros por período prolongado tem se mostrado adequada para assegurar a convergência da inflação. O Comitê reforça que irá perseverar até que se consolide não apenas o processo de desinflação como também a ancoragem das expectativas em torno de suas metas. O Comitê avalia que a conjuntura demanda paciência e serenidade na condução da política monetária e relembra que os passos futuros da política monetária dependerão da evolução da dinâmica inflacionária, em especial dos componentes mais sensíveis à política monetária e à atividade econômica, das expectativas de inflação, em particular as de maior prazo, de suas projeções de inflação, do hiato do produto e do balanço de riscos.

Votaram por essa decisão os seguintes membros do Comitê: Roberto de Oliveira Campos Neto (presidente), Carolina de Assis Barros, Diogo Abry Guillen, Fernanda Magalhães Rumenos Guardado, Maurício Costa de Moura, Otávio Ribeiro Damaso, Paulo Sérgio Neves de Souza e Renato Dias de Brito Gomes.”

* No cenário de referência, a trajetória para a taxa de juros é extraída da pesquisa Focus e a taxa de câmbio parte de USD/BRL 4,85, evoluindo segundo a paridade do poder de compra (PPC). O preço do petróleo segue aproximadamente a curva futura pelos próximos seis meses e passa a aumentar 2% ao ano posteriormente. Além disso, adota-se a hipótese de bandeira tarifária “verde” em dezembro de 2023 e de 2024. O valor para o câmbio é obtido pelo procedimento usual de arredondar a cotação média da taxa de câmbio USD/BRL observada nos cinco dias úteis encerrados no último dia da semana anterior à da reunião do Copom.

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Victor Sena

Editor assistente na Bloomberg Línea. Formado em Jornalismo pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. Especializado em cobertura de economia.