Como os bancos na América Latina se saem no atendimento ao cliente

Reportagem especial da Bloomberg Línea mostra a situação dos bancos em países selecionados da América Latina em relação à qualidade de atendimento ao cliente

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Bloomberg Línea — Enquanto o surgimento de novas instituições de pagamento, fintechs e bancos digitais impulsionou a concorrência no setor bancário no Brasil nos últimos anos, o desenvolvimento do serviço ao cliente no setor bancário tem progredido de forma desigual na América Latina, uma região com uma inclusão financeira que varia de país para país.

Para mostrar como as instituições financeiras têm sido avaliadas na região, a Bloomberg Línea preparou uma reportagem especial que traz um retrato de como os principais bancos são avaliados em relação à qualidade do serviço prestado aos clientes em países como Brasil, Chile, Colômbia, México e Panamá.

Reclamações, denúncias, sanções, respostas das instituições bancárias, bem como avaliações dos órgãos controladores desses serviços financeiros são os principais indicadores que a Bloomberg Línea levou em conta para a reportagem. No caso do Brasil, foram usados os dados do ranking de reclamações trimestral elaborado pelo Banco Central, que regulamenta o setor no país.

A reportagem da Bloomberg Línea é uma amostra do grau em que os bancos dos países analisados abordam e resolvem as reclamações de seus usuários, bem como o tipo de sanções ou multas impostas pelas autoridades quando são detectadas falhas ou irregularidades.

Esse trabalho regional faz parte de uma série de projetos especiais que a Bloomberg Línea traz em suas plataformas digitais e pode ser uma ferramenta de referência para o processo de tomada de decisões da comunidade financeira na América Latina.

A avaliação dos bancos nos principais países da América Latina

No Brasil, de acordo com o ranking de reclamações de instituições financeiras do BC, elaborado a partir das reclamações do público registradas nos canais de atendimento do Banco Central do Brasil, Banco Pan (banco adquirido pelo BTG Pactual em dezembro de 2022) es a totalidade do índice mais baixo entre os 15 principais bancos, financeiras e entidades de pagamento no primeiro trimestre de 2023.

Como os bancos são avaliados pelos clientes em qualidade de atendimento no Brasil

No Chile, o Serviço Nacional do Consumidor (SERNAC) informa que, para o segundo semestre de 2022, as empresas com melhor qualificação e, portanto, melhor comportamento no tratamento de suas reclamações são o Banco de Chile, o Banco Security e o Banco Itaú (leia a reportagem completa em espanhol).

Os principais bancos da Colômbia registraram um total de 1.262 milhões de queixas no ano passado, segundo o último dado disponibilizado pela Superintendência Financeira. O número de reclamações está relacionado diretamente com o número de usuários dessas entidades financeiras, indicando as fontes dessa entidade (leia a reportagem completa em espanhol).

No México, a Comisión Nacional para la Defensa de los Usuarios de los Servicios Financieros (Condusef), avaliou o serviço prestado a clientes por meio de seu Índice de Desempenho de Atenção aos Usuários (IDATU). Destacam-se instituições como Actinver, Banco Azteca, Banco Base, Inbursa, Banco Inmobiliario Mexicano, Bank of America Merril Lynch, Bankaool, Consubanco, Dondé Banco e Intercam, que obtiveram nota 10 de qualificação (leia a reportagem completa em espanhol).

De acordo com a Superintendência de Bancos do Panamá, no ano de 2023 foram registradas 293 reclamações nas instituições bancárias. Dominam as reclamações sobre serviços relacionados com os cartões de crédito, com 27,99% do total, assim como as contas poupança, com 20,82% das reclamações (leia a reportagem completa em espanhol).

O banco ideal

A ação dos órgãos reguladores ou das autoridades financeiras locais em alguns mercados ajuda a legislação a exigir a mediação dos órgãos de proteção ao consumidor, como é o caso do México, Chile ou Panamá, segundo especialistas.

Exemplos incluem o Banco Central e Fundação de Proteção e Defesa do Consumidor (Procon) no Brasil, a Comissão Nacional de Proteção e Defesa dos Usuários de Serviços Financeiros (Condusef) no México, o Serviço Nacional do Consumidor (Sernac) no Chile ou a Autoridade de Proteção ao Consumidor e Concorrência (Acodeco) no Panamá.

“Essas entidades ajudam muito a capacitar os usuários, pois estes podem contar com alguém para forçar os bancos a responder às suas reclamações ou reivindicações”, disse Ángel Iván Lozano, diretor de Carreira do Bacharelado em Economia do Tecnológico de Monterrey, à Bloomberg Línea. “Embora existam limitações e nem tudo favoreça os usuários, o fato de as reclamações serem registradas por meio desse mecanismo ajuda os consumidores”.

Lozano diz que em 2022 o Condusef, do México, recebeu mais de 184 mil arquivos de queixas, dos quais cerca de 70 mil eram favoráveis aos usuários do sistema financeiro e mais de 114 mil desfavoráveis.

De acordo com a Deloitte, que realizou um estudo sobre a confiança no setor bancário do Chile, é preciso fazer uma distinção entre uma reclamação e uma queixa. A primeira é uma expressão de insatisfação com os produtos ou serviços de uma empresa. A segunda, segundo ele, é o direito de reclamar formalmente sobre um produto ou serviço pelo qual se pagou, ou se o consumidor acredita que seus direitos foram violados durante o processo.

Deixando os preconceitos de lado, a Deloitte sugere que as reclamações devem ser levadas em conta na região, pois implicam uma formalização por parte dos usuários nos canais correspondentes.

Uma das discrepâncias entre os sistemas financeiros dos países analisados pela Bloomberg Línea é que não há consistência nos dados fornecidos pelas instituições. De acordo com os especialistas em direitos do consumidor, isso se deve principalmente ao que é conhecido como “engenharia social” e se explica pela falta de conhecimento das ferramentas e dos mecanismos de reclamação.

“Existem órgãos públicos que apoiam os cidadãos, eles existem, mas o problema é que há uma falta de conscientização social sobre como essas ferramentas são configuradas”, diz Lozano. “Há uma falta de conscientização social sobre como fazer valer os direitos do consumidor”.

No Chile, segundo a Deloitte, mesmo sendo um dos mercados mais maduros em termos de inclusão financeira, os usuários de bancos raramente fazem uma reclamação ou registram uma queixa junto às instituições: 46% dizem que já entraram com uma ação desse tipo e 54% nunca o fizeram.

Com a explosão e a onipresença das mídias sociais, canais como o Twitter se tornaram um megafone para a apresentação de reclamações. Como diz Lozano, embora não seja uma mídia formal, ela atrai a atenção dos bancos, especialmente dependendo do calibre da reclamação e da presença digital (seguidores ou peso) da pessoa que a publica.

Isso é relevante porque, à medida que o público se afasta das agências e os bancos canalizam os investimentos físicos para os digitais, a escuta digital faz com que as empresas se preocupem em atender a essa forma de troca com os consumidores.

“É uma questão de atendimento ao cliente, não uma questão financeira”, diz Lozano. “E de conveniência. Um usuário que não usa os canais digitais oficiais opta pelas redes. O atendimento ao cliente nas agências não é muito observado, pois um processo pode levar de um a 50 minutos, seja no caixa ou com um consultor”.

Nesse sentido, uma pesquisa da Mitto, empresa de consultoria omnichannel, realizada na Argentina, México, Peru e Colômbia, revela que 60% dos usuários desses países ainda preferem ir pessoalmente às agências para se comunicar com seus bancos.

“As instituições financeiras tradicionais estão enfrentando as novas necessidades de seus clientes, que estão buscando cada vez mais o digital, o instantâneo e o eficiente. Embora a implementação de chatbots, mensagens pelo WhatsApp e notificações por SMS e e-mail já façam parte do dia a dia dos usuários, os clientes relatam que apenas 31% de seus bancos oferecem comunicação pelo WhatsApp e 29% por chatbot”, diz Mitto em seu relatório.

Em última análise, acrescenta Lozano, a má experiência dos usuários com os clientes geralmente decorre de um método inadequado de comunicação com seus bancos. Ou seja, quando uma reclamação é gerada ou formulada, é porque não houve consistência nas trocas verbais ou textuais entre o usuário e a instituição.

Mitto coloca isso da seguinte forma: 35% dos usuários afirmam que sua experiência com o banco foi afetada por métodos de comunicação ruins.

Fraudes entre usuários

Um problema que alguns bancos e agências do setor enfrentam, segundo Lozano, é que muitas queixas e reclamações de usuários estão relacionadas a questões de fraude ou irregularidades entre consumidores. Esse é o caso, diz ele, de compras em plataformas como o Mercado Livre e outros marketplaces em que o comprador paga e a transação é feita, mas o produto ou serviço não é entregue.

“Agências como a Condusef, no México, precisam prestar atenção a essas reclamações sobre compras eletrônicas e separá-las das queixas sobre bancos”, diz o acadêmico.

Foco total em fintechs

Com referências como o índice de respostas aos usuários (como os índices das agências no Brasil), os bancos têm uma ferramenta para melhorar não apenas suas estatísticas, mas o relacionamento com seus clientes. No entanto, os especialistas dizem que isso deve ser considerado uma estratégia total pelas empresas.

“Para melhorar as estatísticas, as entidades devem procurar melhorar a experiência do cliente do início ao fim, entendendo as necessidades atuais dos clientes diante de uma comunidade diversificada em idade, gênero, renda e acesso à informação, bem como a concorrência digital de empresas como as fintechs”, disse Bryan Rojas, diretor de gestão de riscos financeiros da KPMG na Colômbia, à Bloomberg Línea.

As fintechs “ganharam participação no mercado financeiro por estarem mais próximas das necessidades dos clientes e oferecerem serviços como personal bankers, aplicativos personalizados, meios diretos de comunicação, entre muitos outros elementos que, com o uso da tecnologia, permitem melhorar o nível de satisfação do cliente”, disse ele.

Ele acrescenta que as instituições financeiras devem apelar para a transparência, a comunicação aberta, honesta e eficaz. Além disso, devem avançar nos processos de segurança e privacidade diante do aumento das fraudes. “Os usuários estão cada vez mais buscando mais confiabilidade em seus recursos e dados”.

E, por fim, ele urge que essas empresas abordem o tempo de uso e atendimento, já que “os usuários estão buscando velocidade em suas consultas e querem respostas instantâneas”.

METODOLOGIA

A Bloomberg Línea consultou os dados mais recentes sobre queixas, reclamações e índices de desempenho do serviço ao usuário nos diversos países latino-americanos apresentados nesta reportagem especial. A equipe editorial também consultou vários especialistas que cobrem o setor financeiro na região sobre o valor que as instituições financeiras dão ao conceito de atendimento ao cliente.

Os dados apresentados pela Bloomberg Línea foram fornecidos por órgãos reguladores e de proteção ao consumidor para acompanhar as respostas, queixas e reclamações dos usuários.

Não há um padrão que permita traçar um denominador comum devido a vários fatores, como o tamanho dos mercados, a prioridade que os reguladores e os agentes da concorrência dão ao assunto e as demandas dos próprios consumidores diante de irregularidades no setor.

– Com a colaboração de Alejandro Ángeles, Daniel Salazar, Filipe Serrano, Isabela Fleishmann e Lorena Guarino.