Brasil: economia está melhor do que parece. Estávamos pessimistas demais?

Tempestade perfeita a favor, com perspectiva de corte de juros e recorde em exportações, eleva previsões para economia brasileira. Bolsa e dólar já respondem

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Bloomberg Opinion — Os economistas perceberam que estavam pessimistas demais em relação ao Brasil.

Pelo terceiro ano consecutivo, a economia brasileira deve crescer mais rápido do que os especialistas previam em janeiro. A expansão anualizada do PIB foi de 4% nos primeiros três meses do ano, a caminho de superar facilmente a previsão de consenso de apenas 0,78% de crescimento anual no início de 2023.

De fato, o Brasil pode estar no início de um ciclo virtuoso: condições internacionais favoráveis, inflação e taxas de juros em retração e um ambiente político mais construtivo.

A começar pelo setor externo. Com a reabertura da China, as exportações brasileiras, como soja e açúcar, estão crescendo, atingindo um recorde de quase US$ 340 bilhões nos últimos 12 meses e o maior superávit comercial já registrado. “Não há nenhum outro mercado emergente que tenha visto uma transformação remotamente próxima a esta”, diz Robin Brooks, economista-chefe do Institute of International Finance e otimista de longa data em relação ao Brasil.

Isto está acontecendo no Brasil. Uma transformação em enormes superávits comerciais impulsionados pelas exportações agrícolas (à esquerda, em cor de laranja) que vão predominantemente para a China (à direita, em vermelho). Não há nenhum outro mercado emergente que tenha visto uma transformação remotamente próxima a esta. O valor justo do câmbio entre dólares e reais permanece em 4,50...

Brooks há muito argumenta que o valor justo para o câmbio é de R$ 4,50 - e os investidores começaram recentemente a acreditar em sua tese, com o dólar caindo para R$ 4,81 na quarta-feira (14), a cotação mais baixa em mais de um ano. Uma perspectiva econômica mais positiva nos EUA, como escreveu meu colega Jonathan Levin, vai ajudar o Brasil ainda mais.

Depois, há a inflação, que vem caindo significativamente, surpreendendo os analistas. Claro que há ressalvas sobre o impacto dos cortes de impostos, e a leitura do núcleo ainda é alta. Mas a realidade é que, a 3,9%, a taxa de inflação do Brasil é menor do que a da maioria de seus pares ou mesmo de países mais ricos, como EUA, Canadá ou Austrália.

O valor representa dois terços da taxa de inflação nominal da zona do euro. E as expectativas de inflação também melhoraram significativamente: agora espera-se que o IPCA termine o ano a 5,42%, ante 6,05% no final de abril.

Com isso, o Banco Central, que conseguiu domar a alta de preços depois de elevar os juros para mais de 12% ao ano em abril de 2022, deve cortar a Selic. Atualmente a 13,75% ao ano, a taxa básica torna o Brasil o país com o juro real mais alto do mundo, de quase 10%.

A redução dos juros será crucial para ajudar a acelerar a demanda e aliviar os consumidores endividados. O mercado de trabalho também se fortalece, com queda da taxa de desemprego para 8,5% em abril, próxima aos níveis de 2015.

Ao contrário de outros países na região, as empresas brasileiras são muito sensíveis aos movimentos de juros. Por isso, o aperto monetário excessivo está prejudicando seus balanços - e, se os custos dos empréstimos caírem, será uma fonte de crescimento extra.

Por exemplo, a Yduqs, que oferece ensino presencial, híbrido e a distância, está percebendo uma recuperação na demanda, principalmente entre os clientes de baixa renda, e espera um ambiente muito melhor quando o Banco Central começar a reduzir juros, segundo o CEO, Eduardo Parente.

As ações da empresa subiram mais de 70% desde o início do ano com a expectativa de recuperação do consumo e maiores lucros, e Parente diz que cada ponto percentual de redução de juros representa R$ 28 milhões em caixa adicional. “Estamos muito animados com as perspectivas do país para 2024″, afirmou.

Os sinais dessa melhora na posição fiscal e monetária levaram a S&P Global Ratings a elevar a perspectiva para a dívida do Brasil de estável para positiva na quarta-feira.

Por fim, também há motivos de otimismo na frente política. Enquanto Lula parece ser um líder menos paciente e mais dogmático que em seus mandatos anteriores, as tendências do presidente à esquerda são contrabalanceadas por um congresso de centro-direita. Como disse recentemente à CNN Brasil o presidente da Câmara, Arthur Lira, o Congresso não é de esquerda, mas “reformador, liberal, conversador, que tem posicionamentos próprios”.

Ou seja, para ter alguma chance de avançar em sua agenda, Lula terá que fazer o tipo de barganha política que todos os presidentes tiveram que fazer. Felizmente para ele, o novo arcabouço do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, deve obter a aprovação do Congresso, lançando certa luz sobre o horizonte fiscal do Brasil. Portanto, mesmo que Lula avance com seus planos de enfrentar as antigas desigualdades do Brasil - que precisam ser abordadas -, a posição fiscal do país deve ser protegida.

O Brasil se beneficiou nos últimos anos de sua abertura a novas tecnologias, projetos recentes de infraestrutura, expansão dos mercados de capitais e um ambiente de negócios mais sofisticado. Tudo isso está sustentando uma economia que está pronta para decolar.

Claro, posso estar errado. As previsões sobre a economia brasileira são arriscadas, tanto para os jornalistas quanto para os economistas ouvidos pelo Banco Central em janeiro. Mesmo assim, parece um bom momento para o Brasil.

Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.

Juan Pablo Spinetto é editor-chefe da Bloomberg News para economia e governo na América Latina.

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