Comcast é principal aposta para mover a próxima peça do mercado de mídia

Expectativas nunca foram tão altas para um novo M&A da gigante das comunicações e maior provedor de TV a cabo e banda larga dos EUA, cinco anos após compra da Sky

NBC Universal, uma das principais empresa da Comcast: CEO Brian Roberts é conhecido por movimentos agressivos (Foto: David McNew/Getty Images)
Por Scott Moritz
30 de Maio, 2023 | 05:25 AM

Bloomberg — O CEO da Comcast, Brian Roberts, tem uma tendência a fechar grandes negócios a cada cinco anos. Foi em 2018 a última vez que ele fez uma grande aquisição, e Wall Street está pronta para seu próximo movimento dramático.

As apostas nunca foram tão altas para a gigante da mídia e das comunicações: a Comcast (CMCSA) está perdendo assinantes de TV a cabo a taxas recordes. O crescimento em seus negócios de internet de banda larga diminuiu em meio à concorrência acirrada de empresas como Verizon Communications e T-Mobile, e a chefe de publicidade, Linda Yaccarino, abandonou o barco para comandar o Twitter.

A provável venda do serviço de streaming Hulu é iminente e os roteiristas de Hollywood estão em greve. As ações da Comcast caíram cerca de 32% desde o pico há quase dois anos.

Como o maior provedor de TV a cabo e banda larga nos EUA, a Comcast ficou grande demais para adquirir mais empresas de cabo. Mas Roberts abraçou a ideia de possuir mais do conteúdo que seu sistema de cabo pode oferecer.

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Sua próxima grande jogada provavelmente envolverá a divisão de mídia da Comcast, um negócio de entretenimento que inclui a rede de transmissão NBC, um grupo estável de canais a cabo, os estúdios de cinema Universal e DreamWorks, plataformas de streaming, incluindo Peacock e uma participação no Hulu, e parques temáticos. E, no entanto, a Comcast carece de amplitude e profundidade de conteúdo para rivalizar com a Disney (DIS) e a Netflix (NFLX).

Se a Comcast tem uma “peça que falta, está na mídia”, disse Geetha Ranganathan, analista de mídia da Bloomberg Intelligence. E há um ajuste óbvio. Como muitas empresas, a Comcast provavelmente está “dando uma olhada mais de perto na indústria de games para a próxima etapa de crescimento e engajamento do cliente”, disse ela.

Roberts pode ter dado uma dica no ano passado, quando explorou brevemente um acordo envolvendo a empresa de videogames Electronic Arts, dona de títulos populares como Madden NFL e Star Wars.

Os seguidores atentos da Comcast suspeitam que ele ainda gostaria de adicionar esse tipo de conteúdo altamente lucrativo ao seu império, possivelmente em acordos com empresas como Nintendo ou Take-Two Interactive Software ou mesmo ou a Activision Blizzard se a aquisição planejada da Microsoft falhar.

“Quando você ouve que eles estão dispostos a se fundir com a EA, você pensa que qualquer coisa pode acontecer”, disse Jessica Reif Ehrlich, analista de mídia do Bank of America. “Games são um negócio com direitos de propriedade que se adapta bem ao cinema, à televisão e até mesmo aos parques temáticos”, disse ela.

Seja em jogos ou em mídia, Roberts enfrenta pressão para adquirir ou combinar ativos de mídia que ajudariam a criar uma entidade maior, principalmente em streaming.

Uma solução amplamente esperada é combinar a NBCUniversal com a Warner Bros. Discovery, sede da CNN, da Food Network e da série Succession da HBO. O novo empreendimento ofereceria uma riqueza de conteúdo de esportes a shows e filmes em uma escala que poderia catapultá-lo para as grandes ligas.

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“Isso criaria um produto de streaming verdadeiramente indispensável para qualquer família”, disse Peter Supino, analista da Wolfe Research.

Comcast tem histórico de grandes negócios nas duas últimas décadas

Mas um acordo com a Warner Bros. também pode enfrentar obstáculos antitruste na tentativa de fundir a controladora da CNN com a MSNBC, e os reguladores do governo de Joe Biden tiveram problemas com muitos negócios ainda menores. De qualquer forma, tal movimento teria que esperar até abril de 2024, quando certas vantagens fiscais que beneficiaram o acordo entre a Warner Bros. e a AT&T estarão fora do caminho.

Games: jornada completa

Um caminho mais fácil seriam a indústria de games, na qual a Comcast seria uma nova entrante e apresentaria pouquíssimas preocupações antitruste. Além disso, a empresa já obteve sucesso de bilheteria com a adaptação da NBCUniversal Pictures do popular jogo Super Mario Bros., que se tornou o maior sucesso de bilheteria do ano.

“Os games permitem um envolvimento mais profundo com o público e criam melhores experiências”, disse Ranganathan. “A Comcast pode potencialmente minerar esses personagens. Super Mario é um ótimo exemplo de game, filme e atração de parque temático.”

O momento de qualquer movimento importante de Roberts pode estar ligado a uma provável decisão de vender a participação da Comcast no Hulu no início do próximo ano. A Comcast e a Disney têm um acordo para que a gigante dos parques temáticos e da mídia compre a participação de um terço da Comcast em um acordo que avalia o Hulu em no mínimo US$ 27,5 bilhões.

A Comcast, por sua vez, também tem a opção de comprar a participação majoritária da Disney. Se Roberts vender, ele recebe pelo menos US$ 9 bilhões para injetar de volta no negócio, financiar um novo ou pagar investidores em uma recompra de ações.

Mesmo que Roberts desista do Hulu, ele está se inclinando para plataformas de streaming como Peacock, que ele vê como o futuro da TV.

A Comcast está em uma transição lenta e tardia para uma oferta de vídeo on-line para o consumidor que pode ser um ponto de aterrissagem para clientes de TV tradicionais que fogem dessa alternativa.

Brian Roberts, presidente do conselho e CEO da Comcast, um dos maiores grupos de entretenimento e mídia do mundo (Foto: David Paul Morris/Bloomberg)

Peacock é a salvação de vídeo da Comcast, mas agora é relativamente insignificante com 22 milhões de assinantes - em comparação com os quase 160 milhões do Disney+. E está prestes a perder US$ 3 bilhões este ano. Em uma recente teleconferência com investidores, Roberts disse que a Comcast tomaria medidas para reduzir as perdas na Peacock, cobrando dos clientes de TV paga pelo acesso, em vez de incluí-lo automaticamente em seu serviço a cabo.

Roberts passou sua carreira na empresa que seu pai, Ralph Roberts, co-fundou e controla um terço dos direitos de voto das ações, uma possível complicação para investidores ativistas. A Trian Partners de Nelson Peltz comprou uma participação na Comcast em 2020, dizendo que estava subvalorizada e manteve discussões com a administração. Há um ano, a Trian anunciou que vendeu sua participação.

Roberts é aconselhado por seu próximo número 2, o presidente Michael Cavanagh, que passou a maior parte de sua carreira no setor bancário. Embora Cavanagh esteja na empresa há quase oito anos, o fato de Roberts ter acrescentado a unidade de mídia às suas funções depois que Jeff Shell foi demitido há um mês do cargo de CEO da NBCUniversal, em vez de contratar um veterano da indústria ou qualquer um dos vários candidatos qualificados da empresa, sugere que há um plano para ser colocado em ação.

Roberts tem se apoiado mais em Cavanagh ultimamente. Ele disse aos investidores que Cavanagh tem uma influência calmante que “me lembra um pouco do meu pai”. Quanto à direção, disse Roberts, “há uma oportunidade para o tipo certo de líder intervir e dizer: ‘Como podemos obter o benefício de todas essas empresas trabalhando juntas?’”

Ele acrescentou: Cavanagh está “nos ajudando a dirigir de uma maneira que eu acho que será melhor do que fizemos historicamente”.

Prenúncio de novo M&A?

Os analistas têm procurado pistas sobre qual pode ser o próximo passo. Em uma teleconferência de resultados no mês passado, a palavra “estratégia” apareceu 20 vezes. A última vez que essa palavra foi usada com tanta frequência foi em uma teleconferência de resultados cinco anos atrás, logo após a Comcast anunciar seu último grande negócio - a aquisição da emissora de TV britânica e provedora de banda larga Sky.

Cavanagh respondeu à maioria das questões de estratégia e sugeriu que nada está de pé. “Não há razão para ninguém pensar que vamos revisitar a estratégia”, disse ele.

Enquanto as especulações sobre um negócio orbitam sobre a empresa, por dentro a Comcast opera com “capacidade máxima de investimento”, colocando dinheiro em esforços transformadores como a mudança para o streaming e uma revisão completa de sua rede de TV a cabo para aumentar a capacidade, disse o diretor financeiro Jason Armstrong em uma entrevista.

“Há muitas coisas que estamos fazendo internamente, portanto, na medida em que estamos procurando fazer algo inorgânico para adicionar ao portfólio - abarra está bem alta”, disse Armstrong.

A Comcast, com sede na Filadélfia, ainda obtém a maior parte de sua receita anual de US$ 121 bilhões com assinantes de TV a cabo e banda larga, mas os investidores descrevem esse lado do negócio como um cubo de gelo derretendo lentamente.

Os assinantes de TV estão cortando o cabo em números recordes e o crescimento da banda larga quase desapareceu diante das ofertas rivais de fibra e internet sem fio das empresas de telefonia.

Recentemente, a Comcast estancou algumas das perdas agregando serviços de telefonia móvel de baixo custo com banda larga. Mesmo que Roberts opte por um acordo hollywoodiano com a Warner Bros., a Comcast ainda será a maior empresa de cabo e banda larga dos Estados Unidos.

O serviço de streaming Hulu pode ser peça-chave para o próximo movimento da Comcast (Foto: Daniel Acker/Bloomberg)

É por isso que nem todo mundo acha que a divisão de mídia deveria ser o foco das atenções no momento.

Roberts tem sido oportunista nos negócios, “criando grande valor para os acionistas, particularmente com a NBCUniversal”, disse o managing director da Duff & Phelps, Ben Bielawski, cuja empresa é investidora de longa data da Comcast. Mas “a mídia não move a ação e é mais uma distração”, disse.

No mínimo, os resultados financeiros mais recentes, que mostraram ganhos de clientes de banda larga e wireless melhores do que o esperado, “tiram a pressão” de qualquer necessidade de fazer um acordo imediatamente. Eventualmente, disse Bielawski, a empresa encontrará alguma maneira de “monetizar” o negócio de mídia.

Para os principais investidores leais da Comcast, o showbiz não é apenas uma distração, é um fardo. Os negócios de TV a cabo e banda larga da empresa geram o dobro da receita da unidade de mídia, mas não estão crescendo. E, embora as assinaturas de TV a cabo e os anúncios gerem mais de quatro vezes os ganhos ajustados antes de juros, impostos, depreciação e amortização (Ebitda) do que a NBCU gera, uma grande parte desse dinheiro é gasta com a mídia.

Quando o negócio principal está financiando outra atividade, você obtém o que Craig Moffett, analista da MoffettNathanson, chama de “desconto de conglomerado”. E a mídia não é exatamente um porto seguro. A Comcast fez uma grande aposta em entretenimento em um momento de queda nos lucros e paralisação da produção devido ao que poderia ser uma longa greve dos roteiristas, e seu serviço de streaming é apenas um peixinho nadando em um mar agitado de tubarões como a Netflix.

Apesar dos obstáculos, Roberts pode ter uma abertura agora que os ativos de mídia caíram de valuations muito altos.

“Este é um momento decisivo para o setor”, disse Todd Lowenstein, estrategista-chefe de ações da HighMark Capital Management. “Estamos em uma redefinição, após um período de busca por crescimento e superinvestimento quando o dinheiro era de graça.”

- Com a colaboração de Liana Baker.

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