Queda de ações da LVMH e da Hermès indica que o luxo não é tão invencível

Grandes grupos de alto padrão de consumo cresceram nos últimos meses com vendas que pareciam à prova de recessão, mas dados recentes são um sinal de alerta

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Bloomberg Opinion — Nesta segunda-feira (22), Sidney Toledano, que lidera o portfólio de marcas menores da LVMH, disse no evento Financial Times Business of Luxury Summit que, quando se trata de produtos de alta qualidade, o mundo não gira apenas em torno dos Estados Unidos e da China.

A queda recente nos preços das ações de grupos de luxo, incluindo a LVMH, a Hermès e a Richemont, mostra que os investidores não compartilham dessa opinião.

No fechamento de segunda-feira (22), o índice MSCI World Textiles Apparel & Luxury Goods Index havia subido cerca de 20% desde o início deste ano, com os líderes do setor acelerando muito mais. Os valuations dependeram, em grande parte, de dois fatores: a continuidade da recuperação da China pós-covid e o soft landing do mercado de luxo dos EUA. Pelo menos um desses fatores está em xeque.

Os gastos com cartões de crédito nos EUA, monitorados por analistas do Citigroup (C), vêm diminuindo há cerca de um ano. Não houve melhora em abril, segundo o Citigroup.

Durante esse período, vale destacar dois acontecimentos. Primeiro, Johann Rupert, presidente da Richemont, proprietária da Cartier, confirmou no início deste mês que o mercado americano estava desacelerando desde novembro.

E, na semana passada, o Burberry Group relatou um declínio de 7% nas vendas nas Américas em seu trimestre mais recente – desempenho mais fraco do que suas concorrentes. Embora os super-ricos continuem gastando, o CEO da Burberry, Jonathan Akeroyd, disse que os consumidores americanos mais jovens e com mais aspirações estavam reduzindo as compras de tênis, chapéus e cintos.

Mesmo não sendo uma marca de luxo, vale a pena mencionar o aviso de lucros da Foot Locker na sexta-feira (20). Embora possa haver um indicativo que a nova CEO Mary Dillon está tentando contar as más notícias primeiro, pode haver algum cruzamento entre sua base de clientes e aqueles que aspiram trocar seus tênis Nike por um par da Dior.

Na terça-feira, os analistas do Deutsche Bank disseram que a desaceleração dos EUA era uma “preocupação crescente” – e com razão.

Os EUA, juntamente com a Coreia do Sul, são o motor das fortunas do luxo nos últimos três anos. Enquanto a China oscilava entre lockdowns e reaberturas, os americanos, principalmente os jovens que descobriram o luxo europeu, continuaram gastando. Outro fato que ajudou foi o pagamento de estímulos financeiros à população por governos e os ganhos do mercado de ações e de criptomoedas.

Isso incentivou as marcas de luxo a abrir novas lojas nos EUA, especialmente longe dos principais centros de compras de Nova York e Los Angeles e em locais como Austin, no estado do Texas.

Embora a desaceleração das compras de produtos de luxo nos EUA não seja grave o suficiente para colocar essas lojas em risco, devemos observar se as marcas ficarão sobrecarregadas com pontos de venda de baixo desempenho após essa expansão.

Os investidores deveriam se lembrar da onda de fechamento de lojas na China há sete ou oito anos, depois que as marcas abriram lojas em cidades menores e os gastos diminuíram no país.

Nesse cenário, a LVMH parece exposta, pois gerou 23% de seu faturamento nos EUA no primeiro trimestre. Dito isso, a empresa possui algumas das marcas mais fortes do mundo, lideradas pela Louis Vuitton e pela Dior, e também obteve 36% de seu faturamento na Ásia, exceto o Japão, no período.

Empresas que estão tentando recuperar suas fortunas correm um risco ainda maior, como a Kering, proprietária da Gucci. A Burberry está em reestruturação e mais exposta a quedas entre os clientes premium do que entre os ultra-ricos. Mas, historicamente, a empresa também gerou cerca de 40% de seu faturamento de consumidores chineses (atualmente, são cerca de 30%) e tem um novo estilista: Daniel Lee.

Com a moderação do mercado dos EUA, há ainda mais necessidade de os consumidores chineses assumirem o consumo de luxo. Até o momento, os gastos estão concentrados em cidades da China Continental, como Hainan, ou em viagens para destinos próximos, como Macau e Hong Kong.

A temporada de viagens para a Europa – algo necessário para manter o consumo dos chineses em alta – ainda não começou. E, é claro, qualquer problema na recuperação da China seria mais um revés.

Para que as ações de luxo mantenham os ganhos neste ano, deve acontecer um cenário perfeito: os EUA desaceleram, mas a China acelera, dando continuidade ao desempenho robusto que os vendedores de alto padrão tiveram nos últimos dois anos.

Esse é o melhor cenário possível. Ele pode ser frustrado pelo fato de os consumidores chineses perderem seu amor por produtos de luxo ou por um hard landing nos EUA.

Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.

Andrea Felsted é colunista da Bloomberg Opinion e escreve sobre os setores de varejo e bens de consumo. Anteriormente, escrevia para o Financial Times.

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