De frota elétrica à Argentina: como o setor de caminhões planeja crescer

Segundo o CEO da Volkswagen Truck & Bus, Roberto Cortes, em entrevista à Bloomberg Línea, setor conta com estímulos do governo Lula para retomar a produção

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Bloomberg Línea — A indústria nacional de caminhões e ônibus pretende voltar a ampliar as vendas de veículos novos com uma agenda que inclui da eletrificação da frota ao aumento das exportações para a Argentina. O eixo de medidas previstas inclui o apoio do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em um momento de desaceleração da economia no cenário de juros elevados e incertezas econômicas.

Segundo o CEO da Volkswagen Truck & Bus, Roberto Cortes, as montadoras do setor pretendem levar ao governo uma pauta com cinco reivindicações, que vão de estímulos à exportação até taxas de juros mais baixas das linhas do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

O executivo, à frente de uma das marcas líderes em vendas de caminhões, esteve recentemente em Brasília com o vice-presidente da República e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), Geraldo Alckmin, para discutir a pauta da indústria de veículos pesados.

“Esses pleitos independem do arcabouço fiscal e da reforma tributária. O ministro Alckmin está analisando cada um deles e temos uma expectativa positiva sobre isso”, afirmou Cortes em entrevista exclusiva à Bloomberg Línea.

Conforme o executivo, representantes do setor e da área técnica do MDIC têm se reunido para discutir temas como eficiência energética e financiamentos. Os 5 pleitos do setor são:

1. Renovação da frota

O principal pleito do setor é a implantação de um programa de renovação da frota de veículos pesados, tema discutido há anos pela indústria, mas sem sucesso.

Cortes afirmou ter conversado com Alckmin sobre como colocar em operação o Programa de Aumento da Produtividade da Frota Rodoviária (Programa Renovar), criado no ano passado com o objetivo de estimular, de forma voluntária, a retirada de circulação de veículos que não atendam aos parâmetros técnicos de rodagem ou que tenham mais de 30 anos de fabricação.

“A frota de caminhões do país está duas vezes mais velha do que deveria. Mesmo com um crescimento pequeno do PIB, se houver incentivo à renovação da frota, os benefícios são totais. Entendemos que isso pode melhorar parte do custo Brasil, a ineficiência do transporte”, disse Cortes.

O executivo disse que uma das ideias discutidas é utilizar o fundo existente das petroleiras para financiar que proprietários troquem veículos muito antigos. “Como um dos objetivos do fundo das petroleiras é a eficiência energética, a renovação de frota traria essa melhoria.”

Na avaliação de Bráulio Borges, pesquisador associado do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV IBRE), a política de renovação de frota é necessária, mas não pode ignorar o ajuste fiscal.

“É possível acomodar subsídios para tirar de circulação os caminhões mais antigos e poluentes, mas o céu não é o limite”, afirmou o especialista.

Segundo Borges, é preciso levar em consideração os custos e os benefícios de uma eventual política de subsídios para a renovação da frota de caminhões. “O custo social do carbono é expressivo, mas uma política pública bem feita tem que assegurar que os caminhões mais antigos saiam de fato de circulação, sendo desmontados para não haver o risco de voltarem a rodar no interior do país.”

2. Crédito com juro mais baixo

A indústria de veículos pesados historicamente dependeu, em parte, de linhas de financiamento do BNDES para uma parcela significativa de suas vendas, com destaque para o Finame.

Há cerca de dez anos, no governo de Dilma Rousseff, o Finame chegou a ter juros reais negativos (abaixo da inflação). Houve uma corrida para a compra de caminhões inclusive como forma de investimento, segundo fontes do setor, o que levou a um aumento de capacidade instalada das montadoras. Posteriormente, houve uma onda de forte ociosidade na indústria.

O pleito do setor são taxas do Finame mais atrativas do que as atuais. “O financiamento do BNDES tem taxas muito parecidas com as de mercado. É preciso que haja condições mais atrativas, além de um Finame para veículos usados, que hoje não temos”, reivindicou Cortes.

Executivos do BNDES dizem que a prioridade do banco são setores ligados a projetos sociais, embora a indústria também deva ter estímulos no âmbito de um pacote que deve ser anunciado nesta quinta-feira (25) por Alckmin e líderes de outras pastas do governo federal.

Na última terça-feira (16), diretores do BNDES disseram que atividades que geram “alto retorno social”, como as ligadas a escolas, hospitais, metrô e transição energética, podem ter “subsídios limitados com teto e transparência”.

“Não estamos propondo o BNDES do passado. Continuamos a discussão sobre subsídio com um teto, no âmbito da nova política de industrialização”, disse o diretor do BNDES Nelson Barbosa. Ele disse que as taxas praticadas pelo banco serão de mercado: “captação mais spread”.

Na visão do pesquisador da FGV, a melhor alternativa para estimular a renovação da frota de caminhões muito antigos seria oferecer uma linha de financiamento do BNDES nem necessidade de aporte do Tesouro, em vez de uma redução de impostos, por exemplo.

3. Incentivos a elétricos

Cortes destacou que diferentes países estão propondo incentivos fiscais para a eletrificação da frota.

O executivo disse ter discutido a implantação de uma espécie de Finame verde, que poderia ser usado para financiar as vendas de elétricos e caminhões modelo Euro 6, produzidos sob a nova legislação de emissões que entrou em vigor no início deste ano no país.

A Volkswagen se beneficiaria, segundo ele, porque produz caminhões 100% elétricos no Brasil. A fábrica de Resende, no Rio de Janeiro, já fornece o e-Delivery para clientes como a Ambev.

4. Exportações

Outro pleito do setor, segundo Cortes, é um ambiente mais favorável para as exportações. Entre as medidas que poderiam ajudar está a retomada do regime especial de reintegração de valores tributários para empresas exportadoras (conhecido como Reintegra).

“Também pedimos alguma forma de viabilizar as exportações para a Argentina, que está com problemas de divisa”, disse o executivo.

A exportação ajudaria a elevar a utilização da capacidade instalada do setor, avaliam fontes ouvidas pela Bloomberg Línea. Atualmente, a capacidade total de produção da indústria de caminhões e ônibus no Brasil é de cerca de 400 mil unidades ao ano (em três turnos). Em dois turnos, esse volume cai para 250 mil veículos.

O recorde de produção da indústria local ocorreu há mais de uma década, em 2011, quando 275 mil caminhões e ônibus foram produzidos no país. No ano passado, a produção do setor foi de 194 mil veículos pesados.

Para este ano, a Anfavea, associação que representa as montadoras, estima uma queda em torno de 20% da produção sobre 2022. Isso porque, no ano passado, houve um movimento de antecipação de compra de veículos Euro 5, mais baratos do que os modelos da geração atual (Euro 6).

5. Ônibus escolar

Cortes relatou que o setor espera a retomada do programa “Caminho da Escola”, que repassa recursos federais para a compra de ônibus escolares pelos municípios, prioritariamente em áreas rurais, com o objetivo de oferecer transporte gratuito a estudantes da rede pública de educação básica.

“Conversamos sobre incentivar o programa Caminho da Escola não só para regiões rurais mas também urbanas. É importante renovar a frota, pois o programa já tem 15 anos”, disse Cortes.

O pesquisador do FGV Ibre avaliou que, para o segmento de ônibus, o Brasil deveria caminhar para a eletrificação e modelos híbridos. “Os poluentes dos veículos a combustão têm um impacto direto sobre a saúde humana e a produtividade dos trabalhadores, o que gera um gasto grande com saúde pública.”

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