Bloomberg — No coração do centro financeiro de Chicago, um prédio de sete andares que ocupa grande parte de um quarteirão já foi a sede da maior bolsa de opções do mundo. Agora, ele está vazio e acumulando poeira.
A propriedade, que por décadas abrigou um espaço em que traders se acotovelavam e gritavam uns com os outros, está no mercado imobiliário desde 2019, mas a proprietária Cboe Global Markets não consegue encontrar um comprador.
O prédio da Chicago Board of Trade, que já foi um importante centro de commodities, teve um desempenho ainda pior quando os credores devolveram as chaves à Apollo Global Management.
Na Magnificent Mile, a famosa rua repleta lojas ao norte do rio Chicago na Michigan Avenue, as fachadas vazias das lojas se destacam, com um recorde no número de imóveis vagos.
Os centros urbanos vazios são uma característica deprimente das cidades dos Estados Unidos atualmente, seja em São Francisco ou Nova York. Mas Chicago, terceira maior cidade do país, enfrenta seus próprios desafios que ameaçam seu status como um dos principais centros financeiros globais.
A frequência aos escritórios da região está em cerca de metade dos níveis pré-pandemia, de acordo com a empresa de segurança Kastle Systems. Mas, além de o centro comercial estar passando dificuldades com o lento retorno dos trabalhadores, a saída de grandes empresas da cidade, como a Citadel e a Boeing (BA), deixou um vazio difícil de ser preenchido na cidade.
A Guggenheim Partners, uma grande empresa do setor financeiro da região, mantém seus escritórios praticamente fechados, enquanto empresas como a Cboe e a Allstate não estão exigindo que todos os funcionários retornem ao escritório.
Nesse cenário, a cidade enfrenta um aumento na criminalidade, incluindo roubos de carros e assaltos, algo que custou o cargo da prefeita Lori Lightfoot este ano, que não se reelegeu.
Agora, cabe ao seu substituto, Brandon Johnson, um progressista que assumiu o cargo na segunda-feira (15), mudar a maré de má sorte da cidade, incluindo reverter a decadência do centro da cidade.
As coisas não estão melhorando para o mercado de imóveis comerciais, com a taxa de vacância de escritórios da cidade atingindo um recorde de 22,4% no primeiro trimestre.
Até mesmo as empresas de tecnologia, antes consideradas uma oportunidade brilhante para o futuro de Chicago, reduziram seus escritórios: a Salesforce (CRM) e a Meta Platforms (META), dona do Facebook, abrmão de quase 22,3 mil metros quadrados de espaço.
“Algo drástico precisa ser feito”, disse Andy Gloor, CEO da Sterling Bay, uma grande incorporadora por trás do badalado bairro de Fulton Market. “Chicago não conseguirá prosperar sem um distrito comercial central dinâmico”.
A saída da gigante dos frigoríficos Tyson Foods foi a que mais afetou a cidade, após ter anunciado que fecharia seus escritórios locais. A empresa deixou seu espaço de 22 mil metros quadrados de escritórios no centro da cidade no primeiro trimestre.
Chicago teve o segundo pior desempenho entre 11 cidades dos EUA em um índice de locação de escritórios, à frente apenas de São Francisco no primeiro trimestre, de acordo com a empresa imobiliária CBRE Group.
Os locatários que estão deixando seu espaço atual ou reduzindo seu tamanho devido ao trabalho híbrido ou a demissões recentes acrescentaram 140 mil metros quadrados de espaço para sublocação no centro de Chicago nos primeiros três meses do ano, segundo dados da CBRE – o suficiente para abrigar cerca de 15 mil a 20 mil pessoas.
“Muitas dessas empresas estão tentando testar se ter um espaço menor e um pouco mais flexível e trabalhar remotamente trará a mesma produtividade”, disse Matt Carolan, que lidera uma equipe de corretores de imóveis na Jones Lang LaSalle, uma empresa de consultoria imobiliária.
É um contraste com Nova York, cujo prefeito Eric Adams vem pressionando as empresas a trazer os funcionários de volta às torres de escritórios e os executivos de Wall Street vêm criticando o trabalho remoto.
O JPMorgan (JPM) disse a seus diretores gerentes no mês passado que eles deveriam trabalhar presencialmente todos os dias da semana.
Tom Wilson, CEO da Allstate, disse que a seguradora constatou que “a flexibilidade realmente vende” e que a política pós-pandemia ajudou nos esforços de recrutamento em todas as localidades do país.
“Decidimos tratar nossos funcionários como clientes”, disse Wilson. “Vendemos a eles um emprego, e um emprego vem com dinheiro, crescimento profissional – e agora com mais flexibilidade”.
Nos bastidores, as autoridades de Chicago dizem que os empregadores têm sido mais flexíveis com os funcionários por medo de perder pessoas em um mercado de trabalho apertado.
Esse é um desafio para a cidade, na qual líderes empresariais criticaram o aumento da criminalidade, mas as ruas vazias também não favorecem ambientes seguros.
Os incidentes de crimes em Chicago aumentaram 41% no ano passado em relação a 2021, e mais 43% até agora em 2023.
O bilionário Ken Griffin citou a violência como um dos motivos para transferir sua empresa Citadel para Miami, e o CEO do CME Group (CME), Terry Duffy, recentemente se manifestou sobre o fato de sua esposa ter sido vítima de roubo de carro em plena luz do dia.
“Precisamos continuar criando motivos para que as pessoas venham ao centro da cidade”, disse Michael Fassnacht, diretor da World Business Chicago e diretor de marketing da cidade. “Eu incentivo todos os líderes corporativos a terem pelo menos uma política de três dias no escritório por semana”.
Há outros efeitos indiretos do modelo de trabalho híbrido. O número menor de pessoas no centro da cidade deixou as varejistas desanimadas. A taxa de vacância da Magnificent Mile é de 29%, sendo que a parte mais ao norte está 39% vazia, de acordo com a Cushman & Wakefield.
Ao assumir o cargo de prefeito, Johnson terá que lidar com a lenta recuperação de Chicago após a pandemia, o aumento da criminalidade e os prédios vazios que estão perdendo seu valor, o que poderia reduzir no longo prazo o valor do imposto predial que a cidade arrecada.
O democrata de 47 anos atraiu os eleitores de uma cidade amplamente progressista. Durante sua campanha, ele se comprometeu a aumentar os impostos sobre as grandes empresas para aumentar a receita de Chicago, mas os líderes empresariais dizem que ele está aberto a ouvir seus argumentos sobre por que o aumento afastaria as empresas.
Johnson se reuniu com vários líderes empresariais e pediu que eles aproveitassem seus conhecimentos para ajudar a cidade a cortar custos ou aumentar a receita, de acordo com Jason Lee, porta-voz da equipe de transição.
O novo prefeito diz que entende os desafios que o centro da cidade está enfrentando e está focando na revitalização do Loop, como é conhecido o distrito comercial central.
Nem tudo vai mal para Chicago. O West Loop e seu distrito Fulton Market estão em expansão, com uma enxurrada de bares e restaurantes que atendem aos funcionários de empresas como o Google, e o McDonald’s (MCD). Os edifícios da área custam cerca de US$ 20 o metro quadrado a mais do que no Loop, de acordo com Carolan, da JLL.
“Todos os edifícios que construímos em Fulton Market estão 100% alugados”, disse Gloor, da Sterling Bay, que atualmente está construindo outra torre no bairro.
Os incentivadores de Chicago também estão esperançosas quanto ao futuro do Thompson Center, um prédio de propriedade do governo na década de 1980 recentemente adquirido pelo Google. O plano é que o edifício seja reformado e reaberto em 2026.
No entanto, de volta ao centro financeiro, o valor do edifício da Cboe na South LaSalle já foi reduzido em mais da metade devido a duas baixas contábeis e à depreciação, segundo registros regulatórios.
A empresa colocou o prédio à venda há quase quatro anos para se mudar para uma nova sede no reformado Old Post Office, enquanto o espaço para trading foi transferido para a Chicago Board of Trade.
Contudo, a revitalização do centro da cidade exigirá muito mais do que a venda de um prédio.
Quanto mais empresas implementarem políticas de retorno ao escritório, “mais pessoas virão para o centro da cidade”, disse Brad Serot, vice-presidente da CBRE. “É quando começamos a ver ruas mais movimentadas, restaurantes e cafés prosperando novamente”.
--Com a colaboração de Tarso Veloso e Elizabeth Campbell.
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