Bloomberg Opinion — “Pense em uma refeição com bacon e ovos”, começa uma metáfora sobre motivação no local de trabalho que ouvi pela primeira vez no final da década de 1980. “A galinha se envolveu na tarefa, mas o porco se comprometeu a dar seu melhor”.
Durante anos, os empregadores têm exaltado os benefícios do profundo comprometimento dos funcionários, que vai muito além de um mero envolvimento. A expansão econômica depois da crise de 2008 pareceu acelerar a tendência. Mas o que acontece com esse modelo de motivação dos funcionários quando os tempos ficam mais difíceis? Talvez seja o que estamos vendo agora.
Desde a pandemia, surgiram tensões entre funcionários e executivos, e os gerentes ficaram no meio do fogo cruzado. Vemos funcionários resistindo a ordens que não lhes agradam, defendendo novas políticas corporativas e pressionando as empresas a assumirem posições políticas que apoiam.
Do outro lado, vemos CEOs reagindo ou esperando em seu canto que, se puderem evitar que uma gafe viralize, todos logo seguirão em frente e voltarão ao trabalho.
Mas o que está motivando essa rebelião entre os funcionários? Uma visão puramente econômica sugere que é a mudança no mercado de trabalho: quando fica mais difícil preencher as vagas, os funcionários podem fazer mais exigências. A polarização política em toda a sociedade também pode estar agitando as coisas no trabalho. Se tudo é político agora, o trabalho também deve ser.
Essas explicações não estão incorretas, mas incompletas. Elas ignoram a mudança de décadas na forma como os funcionários são gerenciados e motivados: ao serem incentivados a pensar como coproprietários do negócio e ficarem satisfeitos por causar impacto ou fazer a diferença.
Mas acontece que essa abordagem também tem seus pontos negativos. Quando os funcionários se sentem donos das empresas, eles tomam mais iniciativa – e também têm opiniões sobre como o local deve ser administrado. Isso complicou a vida dos chefes, que se sentem frustrados por serem questionados tantas vezes.
Hoje, a motivação dos funcionários é amplamente vista como um projeto individual, de acordo com Maja Korica, professora da Warwick Business School, no Reino Unido. Nesse modelo, o chefe não é mais responsável por inspirar você, e seu compromisso com o trabalho deve ser impulsionado pela realização pessoal, não por algo tão banal quanto o dinheiro.
É claro que o salário tem um grande papel na satisfação do funcionário, mas é o que os estudiosos da organização chamam de “fator de higiene” – o que está em jogo. O que importa mais são as coisas intangíveis que os funcionários obtêm do trabalho, como significado, orientação e aprendizado, diz Jennifer Moss, estrategista de cultura no local de trabalho e autora de The Burnout Epidemic. E as pessoas levaram a sério o conselho de se dedicarem totalmente ao trabalho e agir como empreendedores.
Um cínico poderia apontar que há uma óbvia economia de custos para as empresas que adotam essa atitude: os executivos podem pagar menos aos funcionários ao mesmo tempo em que exigem mais deles – mais trabalho à noite e nos fins de semana e mais produtividade. A devoção de um funcionário a uma causa tão importante não deve diminuir só porque é sábado.
Apesar do potencial para excesso de trabalho, muitos funcionários acham o acordo atraente; é bom usar seus talentos e potencial. A atitude de trabalhar apenas para ser remunerado é depreciativa e mina irrita especialmente as expectativas de profissionais com alta escolaridade ouviram durante toda a vida para “fazer o que amam” e “encontrar sua paixão” e depois foram contratados ostensivamente para exercer seu julgamento e autonomia.
Tanto empregadores quanto funcionários estão repensando os termos deste acordo tácito, e é por isso que as tensões surgiram.
Talvez agora as pessoas tenham compreendido a verdade sobre as startups que prometem salvar o mundo. Mas muitos ainda contam com seus empregadores para, pelo menos, não piorar o mundo. E os funcionários mais engajados ainda esperam algum grau de aprendizado, significado, orientação e autonomia.
Mesmo que os trabalhadores mais jovens tenham padrões mais altos para seus empregadores – esperando que seus chefes trabalhem segundo seus valores – isso não significa que sejam mimados. Isso reflete o fato de que eles passaram toda a sua carreira trabalhando sob esse modelo. Esperar que sejam motivados a trabalhar pela mera remuneração ou para criar valor para o acionista é como se pedíssemos a um usuário de TV colorida 4K que ficasse satisfeito com uma televisão analógica em preto e branco.
A tensão entre funcionários proativos e chefes frustrados provavelmente não vai desaparecer. Em vez de recuar ou esperar que essa fase passe, os executivos devem aceitá-la e descobrir como administrá-la. Afinal, eles provavelmente não acham que a alternativa – pagar muito mais aos funcionários e permitir que eles se envolvam apenas em vez de se comprometerem ao máximo – seja muito atraente.
Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.
Sarah Green Carmichael é editora da Bloomberg Opinion. Anteriormente, era editora-gerente de ideias e comentários na Barron’s e editora executiva na Harvard Business Review, onde apresentava o podcast “HBR IdeaCast.”
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