Este CEO prodígio lidera um negócio de US$ 7,5 bi em receita em Wall Street

Peng Zhao, à frente da Citadel Securities, foi para a faculdade aos 14 anos e se tornou homem de confiança do fundador, o poderoso investidor Ken Griffin

CEO da Citadel Securities, Peng Zhao: ascensão meteórica em Wall Street (Foto: Sarah Blesener/Bloomberg)
Por Katherine Doherty
13 de Maio, 2023 | 07:30 AM

Bloomberg — Entre todas as histórias que os líderes de Wall Street contam sobre os momentos cruciais que os levaram a seus poderosos postos, a do CEO da Citadel Securities, Peng Zhao, pode ser a única que envolve revirar lixo.

É uma história que começa com uma arrogância juvenil e termina como uma parábola sobre perseverança – algo que a empresa precisará para realizar suas ambições em meio a uma série de regulamentações propostas pelos Estados Unidos.

Na época, Zhao estava no ensino fundamental no que ele descreve como uma “escola pública mediana de Pequim” quando sua turma recebeu dois ingressos para fazer um teste para participar de uma prestigiada olimpíada de matemática.

Um deles naturalmente ficou com Zhao, o melhor aluno da sala, que logo o perdeu. Ele disse ao pai que não se preocupasse, pois não queria ir e, se necessário, poderia pedir à escola o ingresso do outro garoto. Seu pai não aceitou.

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A busca levou a dupla a uma caçamba no bairro, onde espalharam os resíduos pelo chão e o vasculharam. As horas se passaram e Zhao implorou para irem embora, mas seu pai não quis.

Ao vasculharem os últimos restos de lixo, encontraram o ingresso perdido. Zhao fez o teste, foi aprovado e acabou entrando em uma via rápida de educação que o levou à universidade com apenas 14 anos e, depois ao coração do sistema financeiro dos EUA.

Entre os CEOs das principais empresas de Wall Street, Zhao tem sido excepcionalmente discreto. Ele dirige um dos mais importantes formadores de mercado dos EUA, que relaciona compradores e vendedores em aproximadamente uma de cada cinco negociações de ações dos EUA, gerando cerca de US$ 7,5 bilhões em receita em 2022.

A empresa, criada em 2002, visa crescer na Ásia e na Europa e expandir-se além das ações e opções para desempenhar um papel mais importante no trading de renda fixa, tomando a participação de mercado dos bancos de Wall Street.

Além disso, a empresa destaca-se pelo pioneirismo em listagens diretas – alternativa às ofertas públicas iniciais (IPOs) que demandam onerosas apresentações e reuniões com possíveis investidores.

Foto: Sarah Blesener/Bloomberg

No entanto, mesmo dentro de seu setor e entre os críticos mais ferrenhos da empresa, Zhao, de 40 anos, dificilmente chama a atenção.

Isso se deve, em parte, à sombra projetada pelo extrovertido bilionário fundador da empresa, Ken Griffin, que também é proprietário da Citadel, a administradora de fundos hedge de US$ 58 bilhões.

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Griffin está sempre sob os holofotes – falando diante de legisladores dos EUA, na televisão, em conferências e formaturas universitárias –, muitas vezes defendendo o papel cada vez maior da Citadel Securities nos mercados e seu controverso leque de ordens de ações e opções de corretoras de varejo por meio de uma prática conhecida como pagamento por fluxo de ordens.

Nos últimos meses, a empresa tem resistido a partes da proposta de revisão das regras de mercado da Securities and Exchange Commission (SEC) – órgão americano semelhante à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) no Brasil – que ameaça restringir sua função de manejar cerca de um terço do volume de trading de ações no varejo.

Griffin provocou ainda mais controvérsias ao se alinhar com o governador republicano da Flórida, Ron DeSantis, e recentemente mudar seus negócios de Chicago para Miami, abraçando a campanha da cidade para se tornar um centro financeiro subtropical de baixo custo, competindo com Nova York.

No entanto, nos bastidores, Griffin raramente visita a Citadel Securities, mantendo o controle remotamente, de acordo com pessoas próximas à empresa.

Em vez disso, é Zhao quem está envolvido nos esforços da empresa para reconectar os mercados de Wall Street com novos sistemas para manejar pedidos de clientes institucionais e de varejo.

“Se quiser fazer uma negociação, devemos ser o primeiro nome que vem à mente”, disse Zhao em uma rara entrevista em seu escritório, ainda em Chicago.

Total de ações no varejo processadas em março de 2023

Se (ou quando) a Citadel Securities acabar vendendo ações ao público, isso colocaria em evidência um CEO cuja posse formal do cargo em 2017 sequer foi marcada por um comunicado à imprensa.

“A única coisa que ele não fez muito foi ter um grande perfil público”, disse Jamil Nazarali, ex-executivo sênior da Citadel Securities que agora é CEO da EDX Markets, apoiada por sua antiga empresa.

Videogames

A falta de notoriedade de Zhao, mesmo em seu próprio setor, é ainda mais impressionante devido à história incomum por trás de sua ascensão – começando com a competição de matemática na escola.

A aprovação o tornou candidato a um programa de aceleração que dá a jovens de 10 anos a chance de concluir o ensino médio em quatro anos. Zhao precisou primeiro ser avaliado em um acampamento de duas semanas no qual, logo no primeiro dia, ele se sentou ao lado de sua futura esposa.

Em um teste crucial, os organizadores do acampamento levaram os alunos à uma pista e lhes deram uma tarefa simples: movimentar-se.

Os candidatos se perguntaram o que era preciso para impressioná-los. Alguns correram e ficaram exaustos. Outros, caminharam durante o que virou um esforço de duas horas. Os que persistiram, como Zhao, demonstraram resiliência e conseguiram entrar no programa.

Zhao desenvolveu uma veia competitiva. Aos 12 anos, descobriu sua vocação ao ler um jornal no metrô de Pequim.

Uma reportagem descrevia como físicos, matemáticos e cientistas da computação estavam desenvolvendo sistemas para superar os profissionais de Wall Street na previsão de movimentações do mercado. Ele ficou encantado com os altos riscos e as possíveis grandes recompensas. “Isso me atraiu”, disse ele.

Assim, com o objetivo de entrar no setor financeiro dos EUA, ele se matriculou dois anos depois na Universidade de Pequim para estudar matemática aplicada.

“Ele era bem conhecido no campus não apenas por sua idade mas por seu intelecto”, disse Fung Wu, colega de classe de Zhao que era quatro anos mais velho. Eles moravam em andares diferentes do mesmo alojamento.

Wu lembra que os grupos gastavam semanas trabalhando em problemas matemáticos, mas Zhao os terminava em poucos dias e passava o resto do tempo jogando videogame.

Anos mais tarde, depois que Zhao obteve seu PhD em estatística pela Universidade da Califórnia em Berkeley, e Wu obteve seu PhD em física na Universidade de Stanford, eles se reuniram na Citadel Securities.

Zhao chegou primeiro, em 2006, após um estágio de verão no Lehman Brothers. Ele tinha 23 anos, e a empresa de Griffin tinha apenas uma fração do porte atual.

Reconectando Wall Street

A parceria de Zhao com Griffin decolou cerca de um ano depois.

O mercado hipotecário dos EUA estava começando a entrar em colapso e Griffin procurou alguém capaz de modelar as possíveis consequências.

Um colega indicou Zhao, mas já era quase fim de semana. Naquela noite, a esposa de Zhao sugeriu que ele colocasse um despertador “caso Ken ligasse”. Assim, Zhao o fez, para as 6h de um sábado. O telefone tocou às 6h30.

Os dois acabaram passando horas em frente a um quadro branco. Logo, Griffin tinha um assento temporário no escritório de Zhao, onde ficava observando o matemático. Mais tarde, quando a empresa conseguiu superar a crise de 2008, os negócios decolaram, assim como a carreira de Zhao.

A primeira área de formação de mercado que a Citadel Securities ampliou foi a de opções, lançada em 2002. A abordagem inicial era simples: a empresa entrou em cena para assumir o outro lado do trading – ou, no jargão do setor, oferecer liquidez – à medida que mais investidores entravam no mercado com trading algorítmico.

Embora a unidade já fosse considerada um sucesso, Zhao acreditava que ela poderia ganhar muito mais.

Quando seus codiretores, David Smith e Jim Knight, deixaram o cargo em 2014, ele ficou encarregado e remodelou a forma como a unidade recebia ordens, emulando a forma como a negociação de ações estava evoluindo: confiando mais na análise preditiva do que na intervenção humana. Isso levou a mais atribuições.

“É preciso ter credibilidade com a liderança sênior e com Ken, para poder expandir os negócios”, disse Matt Culek, COO da empresa, que ingressou em 2012. “Peng conseguiu fazer as coisas.”

Foto: Tim Boyle/Bloomberg

Conforme Zhao foi criando suas equipes, ele priorizou o recrutamento, apostando que os melhores talentos teriam maiores chances de faturar mais.

Isso frequentemente significava persuadir pessoas com outros interesses a se juntarem à uma empresa de Chicago focada nas entranhas dos mercados dos EUA. Ele começou com seu ex-colega de classe Wu.

Zhao começou fazendo uma ligação pessoal para Wu, apresentando uma “grande oportunidade” em finanças. Lisonjeado, Wu agradeceu o interesse, mas disse que não sabia muito sobre dinheiro, apenas sobre física.

Mesmo assim, Zhao continuou ligando e começou a enviar “desafios” que intrigaram Wu, que cedeu e concordou com uma entrevista.

Wu, que imaginou que seria apenas uma viagem de um dia para Chicago, logo se tornou funcionário em tempo integral. “Ele não é um cara ruim. Ele tem boas intenções”, disse Wu. “Ele apenas consegue o que quer”.

Ascensão silenciosa

Não é apenas o recrutamento que Zhao considera um quebra-cabeças a ser resolvido. Para entreter colegas e amigos em restaurantes, ele pede ao garçom que escolha uma garrafa de vinho e a sirva sem mostrar o rótulo, para que ele possa prova e identificar o tipo, a safra e a origem.

“Não gosto de álcool, gosto de estudá-lo”, disse ele.

O truque, que ele aperfeiçoou enquanto trabalhava em seu doutorado perto de Napa Valley, é pegar algo que parece subjetivo ou caótico e dividi-lo em partes que podem ser mapeadas e compreendidas. Ele vê os mercados da mesma forma.

Na Citadel Securities, disse ele, a criação de novas linhas de negócios sempre começa com a tentativa de descobrir como encontrar instantaneamente o preço correto de um ativo – usando matemática, modelagem e machine learning.

Uma vez resolvido esse problema, a empresa desenvolve um método de compra e venda próximo a esse preço que pode ser ampliado.

Aqueles que conhecem Zhao desde seus primeiros dias na empresa dizem que sua transição da solução de problemas para a gestão dos negócios parecia natural. Mas ele demorou mais para se considerar um líder sênior.

Em meados de 2016, com grande alarde, Griffin recrutou o ex-COO da Microsoft (MSFT) Kevin Turner para dirigir a Citadel Securities. Zhao, que se tornou cientista-chefe, disse que não ficou incomodado por ter sido preterido.

“Se minha meta de carreira fosse ser CEO, eu não teria estudado matemática na graduação”, disse ele.

Turner não teve o mesmo tipo de relacionamento com Griffin que Zhao e, quando ainda era novato, não estava acostumado com as outras idiossincrasias da empresa. Ele durou apenas alguns meses.

Zhao então assumiu o cargo sem mais delongas. Na época, alguns colegas viam seu novo cargo como uma simples descrição do que ele já estava fazendo.

“Ele era a força por trás da inovação, responsável pelas agendas de pesquisa e pela receita”, disse Roy Kaiser, chefe de derivativos. “Tudo o que você associaria a um CEO.”

Em última análise, a decisão significou que Griffin – na qualidade de proprietário – escolheu Zhao para ser a pessoa encarregada de proteger e expandir grande parte de seu império.

A empresa tinha cerca de 300 pessoas um ano antes da posse de Zhao. Atualmente, são quase 1.600.

Recursos do fundador

Há um equívoco comum fora do setor financeiro de que a formação de mercados é relativamente segura e entediante, semelhante a uma empresa de energia elétrica que mantém as luzes acesas, de acordo com o analista da Moody’s Investors Service Fadi Abdel Massih.

A realidade é que se trata de “um processo altamente complicado com a possibilidade de grandes perdas”.

Como CEO, Zhao é conhecido por ser obcecado por métricas. Ele ajudou a criar um portal de gestão interna que monitora o desempenho dos funcionários e das linhas de negócios em tempo real, registrando a receita e mostrando como a empresa está em relação a seus pares.

Os gerentes analisam os resultados todos os meses, decidindo onde expandir ou recuar.

“Há um alinhamento de interesses quando é o capital do fundador que está em risco”, disse Massih. À medida que Zhao acrescenta linhas de negócios, os ganhos da empresa são diversificados para que ela possa suportar melhor uma perda ocasional em qualquer parte de seus negócios.

A Citadel Securities está em vias de entrar para a seleta lista de dealers primários do Federal Reserve, que negociam diretamente com o Fed de Nova York à medida que este implementa a política monetária e promete dar lances em todos os leilões do Tesouro dos EUA.

Mas sua influência cada vez maior vem chamando a atenção.

Os críticos, incluindo o presidente da SEC (a comissão de valores mobiliários dos EUA), Gary Gensler, apontaram o domínio da empresa nos mercados de ações como emblemático de um problema de concorrência no setor.

No ano passado, sua equipe apresentou uma proposta de 1.600 páginas para reformular a estrutura do mercado dos EUA e transferir mais trading às bolsas.

Mesmo que os órgãos reguladores levem isso adiante, o analista da Fitch Ratings Bain Rumohr prevê que a Citadel Securities não terá problemas. “Há muita coisa em jogo, mas as grandes empresas serão capazes de se adaptar”, focando, por exemplo, nas negociações mais lucrativas, disse.

Zhao reconhece que o escrutínio público e regulatório do papel da empresa nos mercados está se intensificando, mas ele está confiante de que a empresa pode continuar a evoluir e manter uma vantagem no cenário em transformação.

“As pessoas reconhecem o papel fundamental que desempenhamos no mercado”, disse ele. “E, mesmo assim, somos sutis.”

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