Bloomberg — Os mercados podem ter sobrevivido ao último dos aumentos de juros mais agressivos nos Estados Unidos das últimas quatro décadas. No entanto, poucos em Wall Street estão comemorando.
Se o aumento de 0,25 ponto percentual de quarta-feira (3) marcou o pico do ciclo nos EUA, como as probabilidades implícitas do mercado sugerem, as perspectivas para ativos de risco parecem sombrias.
Isso contrasta com os sete ciclos anteriores de aperto, em que o último aumento quase sempre levou a um rali nas ações e no crédito de maior risco. A única exceção ocorreu no final da era das pontocom em 2000, diante das pressões de uma recessão.
O que é diferente agora é que os traders de swaps esperam que o próximo movimento do Federal Reserve não seja o de uma pausa estendida, mas um corte de juros – talvez já em julho.
Tal reversão para a política expansionista sugere uma recessão que forçará a mão do banco central. Combinando a queda das ações de bancos regionais dos EUA e as previsões de lucros mornas das companhias americanas, a perspectiva é sombria.
Mesmo que os EUA possam evitar uma recessão, os estrategistas do Goldman Sachs (GS) e Morgan Stanley (MS) estão tendo dificuldades em imaginar o que impulsionará para cima os preços das ações.
O índice Nasdaq 100, com grande exposição ao setor de tecnologia, subiu 21% este ano e é negociado em torno de 25 vezes o lucro. O crédito corporativo de alto risco também subiu, adicionando 3,9%.
“Seguindo movimentos históricos, o investidor compraria no último aumento, porque normalmente veríamos o mercado se recuperar a partir daí”, disse Nadia Lovell, estrategista sênior de ações na UBS Global Wealth Management.
Mas agora, “temos uma inflação ainda alta, preocupações com o sistema bancário e alguma fragilidade em torno disso. Achamos que o resultado será apenas diferente desta vez”.
Outros estrategistas dos maiores bancos de Wall Street também estão pessimistas: o Morgan Stanley prevê que o S&P 500 irá recuar para 3.900 até o final do ano, à medida que a economia desacelera. O Goldman Sachs não vê ganhos pós-pausa para as ações dos EUA na segunda metade do ano, prevendo que o S&P 500 encerrará o ano negociado a 4.000 pontos.
Os estrategistas do Bank of America (BAC) aconselham os investidores a “vender o último aumento da taxa” e também veem o S&P 500 encerrando o ano em 4.000. Muitos ativos de risco já precificaram uma mudança na política do Fed – mas não os danos econômicos que podem vir junto com essa mudança.
“Os mercados geralmente precificam os cortes antes da chegada da recessão, mas muitas vezes há sinais falsos e os cortes precificados atualmente parecem ser grandes demais”, disse Christian Mueller-Glissmann, chefe de pesquisa de alocação de ativos no Goldman Sachs.
Copo meio cheio
Ainda assim, é fácil entender por que alguns investidores permaneceram otimistas. As ações dos EUA se valorizaram após o fim de seis dos sete ciclos de aumento de taxas anteriores e entregaram um retorno médio de 13% nos seis meses seguintes, enquanto a renda fixa obteve ganhos.
“O fraco desempenho após o último aumento, quando a curva está invertida, muitas vezes é impulsionado por uma forte desaceleração no crescimento e nos lucros”, disse Andrew Sheets, estrategista-chefe de ativos cruzados do Morgan Stanley. “Achamos que esses riscos existem hoje.”
Em 2000, mesmo após o Fed começar a cortar as taxas de juros, os ativos de risco naquele ciclo levaram anos para se recuperar, pois as empresas trabalharam para reduzir sua alavancagem e investimentos excessivos do final dos anos 1990.
Os balanços corporativos estão em melhor forma desta vez, mas o mercado de títulos está sinalizando uma recessão iminente. Toda a curva do Tesouro está invertida, sinalizando uma queda econômica.
Os estrategistas do Morgan Stanley recomendam títulos de renda fixa de alta qualidade. O crédito high grade apresentou ganhos após cada pausa do Fed desde 1984 e obteve um retorno médio de 9,6%.
Mas a inflação permanece persistentemente alta e isso pressionará os lucros.
“Temos quase três cortes de taxa precificados para o segundo semestre e, ao mesmo tempo, nossas previsões apontam para um núcleo da inflação mais alto e para uma inflação principal elevada no segundo semestre”, disse Max Kettner, estrategista-chefe multi-ativos do HSBC. “Este é um dilema difícil. Um desses muito provavelmente se mostrará errado.”
Enquanto isso, as expectativas por cortes acentuados nas taxas de juros estão aumentando. Contratos de swap vinculados às datas das reuniões do Fed têm caído, já que os mercados estão precificando cerca de 70 pontos-base de cortes até o final do ano.
“Não podemos ver como o Fed estaria cortando as taxas na ausência de uma desaceleração significativa na economia dos EUA”, disse Johanna Kyrklund, diretora de investimentos da Schroder Investment Management, que tem uma posição pessimista sobre ações americanas. “Algo tem que ceder”.
-- Com a colaboração de Christopher Anstey
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