Bloomberg Línea — Os primeiros três meses do ano foram marcados por uma queda vertiginosa nos investimentos em capital de risco em todo o mundo. Mas, na América Latina, o cenário é o mais crítico entre todas as regiões.
A América Latina teve uma retração de 54% em relação ao quatro trimestre de 2022 e de 87% em relação ao mesmo período no ano anterior. Apenas US$ 600 milhões foram investidos em empresas de tecnologia na região, de acordo com dados do CB Insights. As startups latino-americanas são as que menos captaram no trimestre, atrás de Estados Unidos (US$ 32,9 bilhões), Ásia (US$ 12,5 bilhões), Europa (US$ 10,4 bilhões) e África (US$ 0,7 bilhão).
O resultado é visto como um sinal de alerta para a indústria de tecnologia na região. A queda reflete uma aversão ao risco em meio a um cenário incerto de alta de juros, inflação ainda elevada e crise bancária nos primeiros três meses do ano.
Já os Estados Unidos tiveram um ambiente de financiamento mais estável no primeiro trimestre de 2023. O montante investido caiu 1% em relação ao trimestre anterior, para US$ 32,5 bilhões, segundo dados do CB Insights.
Contudo, o resultado foi influenciado pela rodada excepcional de US$ 6,5 bilhões da fintech Stripe. Sem ela, os EUA teriam registrado uma queda de financiamento de 21%, indicando que nenhuma região está imune à desaceleração contínua do capital de risco.
No mundo, o financiamento global de risco alcançou US$ 58,6 bilhões no primeiro trimestre de 2023, refletindo uma queda de 13% em relação ao trimestre anterior. Só a rodada da Stripe representou 11% do total de financiamento do trimestre.
Segundo o Crunchbase, plataforma de dados sobre startups e venture capital, o financiamento em estágio inicial na América Latina também foi afetado negativamente. Para o primeiro trimestre, apenas algumas centenas de milhões de dólares foram destinados a negócios em estágio inicial, uma queda em relação aos US$ 1,5 bilhão do primeiro trimestre do ano anterior.
Os aportes também caíram para startups no estágio de semente (inicial), embora um pouco menos. De acordo com dados do Crunchbase, o investimento em Seed na América Latina caiu 73% em relação ao primeiro trimestre de 2022.
O número de rodadas também está em queda, mas não tão acentuadamente quanto o total de investimentos. Para o primeiro trimestre de 2023, o Crunchbase registrou um total de 129 rodadas de financiamento relatadas do estágio de semente até o de crescimento, uma queda de 71% em relação ao ano anterior.
Março foi o segundo pior mês desde maio de 2020
As startups latino-americanas captaram US$ 245 milhões em março, uma queda de 78% em comparação com o mesmo período no ano passado e o menor valor desde julho de 2020.
Foram apenas 62 rodadas em março, uma queda de 47% em relação ao mesmo mês no ano passado, e o segundo pior resultado desde maio de 2020. Só fevereiro teve um desempenho pior em transações, de acordo com dados do Sling Hub.
Dados da plataforma mostram que investimentos de até US$10 milhões em startups da América Latina caíram 30% em relação ao primeiro trimestre de 2022, enquanto rodadas maiores, acima de US$ 10 milhões, despencaram 70%.
Os três países com maior volume de investimento na região tiveram quedas maiores que 70% em março deste ano contra o mesmo mês no ano passado, segundo o Sling Hub. O Brasil recebeu 34 rodadas (55% do total), seguido pelo Chile (13% do total), com oito aportes, e o México, com sete rodadas (11% do total).
O tamanho médio das rodadas foi US$4,8 milhões, uma queda de 56% em relação ao mesmo período no ano passado. Ou seja, os aportes ficaram menores: o estágio semente foi o que mais recebeu aportes, com 17 investimentos no mês de março.
O setor de fintechs foi o que mais recebeu investimentos em março, com US$ 146 milhões, 59% do total.
Já o relatório da Mindset Ventures, que se baseia em dados do CB Insights e do PitchBook, relata que o Brasil teve 32 novas operações de fundos de VC em março, bem abaixo das 107 transações de fevereiro, mas acima dos 31 investimentos de janeiro.
Nemer Rahal, sócio da Mindset Ventures, disse em comunicado que o terceiro trimestre de 2023 repetiu o que se tem observado nos últimos meses, com “valuations em baixa para empresas em estágio inicial e possível tendência similar para empresas mais maduras, mas possivelmente puxadas para cima por empresas fora da média”.
“O número de unicórnios se mantém inalterado, pois os investidores estão mais cautelosos com o valor de entrada nas empresas”, disse.
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