Opinión - Bloomberg

A visão de Elon Musk para o Twitter é indesejada para os principais anunciantes

Bilionário dono do Twitter está criando uma plataforma na qual os usuários mais ríspidos dão o tom, mas isso é péssimo para os negócios

Bilionário esteve em entrevista para a BBC nesta quarta-feira (12)
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Bloomberg Opinion — Mais de 3 milhões de espectadores ouviram a entrevista de Elon Musk para James Clayton, da BBC, na manhã da quarta-feira (12) no Reino Unido. Eles ouviram o dono do Twitter (TWTR) se esquivar de perguntas sobre segurança, afirmar que o CEO da empresa havia se tornado seu cachorrinho e fazer múltiplas alusões racistas e pornográficas sobre o nome da emissora. Tudo bem típico de Musk.

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Outras pautas incluíram uma garantia de que os anunciantes do Twitter estavam “retornando” e, como resultado, a empresa estava “quase” no breakeven. “Poderíamos ter um fluxo de caixa positivo neste trimestre se as coisas continuarem indo bem”, previu Musk. Como o Twitter é uma empresa privada, temos que acreditar na palavra de Musk.

A Insider Intelligence, respeitado grupo de pesquisa de dados, vê um panorama muito diferente. “Muitas grandes agências ainda não aconselharam os clientes a encerrar a pausa [na publicidade com a empresa]”, escreveu a analista Jasmine Enberg. “Esperamos que a receita publicitária mundial do Twitter caia 27,9% este ano enquanto os anunciantes continuam cortando gastos.”

Enberg observou relatórios da empresa de pesquisa em economia digital Sensor Tower que diziam que os gastos dos dez maiores anunciantes do Twitter – que incluem a Amazon (AMZN), IBM (IBM) e Coca-Cola (KO) – haviam caído 89% em fevereiro e março de 2023 em comparação com o período anterior à chegada de Musk, em setembro a outubro de 2022. O serviço pago de verificação de perfis recentemente reformulado, o Twitter Blue, não chegará nem perto de suprir o déficit.

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Em azul, o crescimento anualizado da receita proveniente de anúncios; em branco, a parcela do gasto total de gastos totais com anúncios digitais

Isto não é necessariamente tudo culpa do Musk, aponta Enberg, com razão. A queda na relevância do Twitter para grande parte da população – aqueles que não querem um feed com desgraça e tristeza constantes – fez com que anunciantes hesitassem há um bom tempo. O comportamento nada civilizado no Twitter é anterior à ascensão de Donald Trump, mas se intensificou após sua chegada à presidência dos Estados Unidos. A contribuição de Musk tem sido permitir e incentivar a incivilidade.

“Twitter é o ‘paraíso dos trolls’”, disse Musk após a entrevista da BBC, quando a discussão continuou no Twitter Spaces, quando Musk convidou alguns seguidores que estavam ansiosos para conversar.

Um deles, Ian Miles Cheong, uma personalidade da direita nas redes sociais, descreveu o apelo do Twitter: “quando você envia um tuíte para uma celebridade, há uma boa chance de que ela o leia e se irrite, e então diga que você é um troll – é isso que eu faço. É gostoso, é divertido ver essa reação. É como jogar um videogame, mas melhor”.

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“É exatamente isso”, concordou Musk.

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É o tipo de sentimento típico entre o grupo de usuários do Twitter que sente que a rede ficou “mais divertida” do que nunca. Pode ser verdade para alguns – da mesma forma que alguns acham “divertido” tocar música alta no ônibus ou vandalizar um orelhão. Há uma certa multidão cultivada por Musk no Twitter que relaciona o comportamento detestável com diversão.

Mesmo assim, o “Paraíso dos Trolls” não é o tipo de lugar que os anunciantes mais sensatos escolheriam para inserir suas marcas. Em vez disso, o dinheiro migrou para reinos mais amigáveis para a Geração Z – o YouTube e o TikTok.

Uma troca de e-mails entre os principais executivos de publicidade divulgada no início deste mês pelo site de notícias Semafor antes de uma grande conferência da indústria na próxima semana, deu um vislumbre dos medos das grandes marcas. Tariq Hassan, diretor de marketing do McDonald’s (MCD), disse que a propriedade do Twitter por Musk “objetivamente só pode ser caracterizada como um misto de caos e momentos de irresponsabilidade”. A vice-presidente da Colgate-Palmolive (CL) Diana Haussling acrescentou que ela tinha que estar “atenta à retórica nociva e muitas vezes racista de Elon Musk”.

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Apesar de tudo isso, Musk pode, é claro, estar dizendo a verdade sobre a volta de alguns anunciantes. A revitalização do feed do Twitter sugere isso. É possível ver grandes anunciantes, como Apple (APPL) e Walt Disney (DIS), assim como marcas como a Champions League da UEFA e outras.

O que mudou desde que Musk chegou é a proliferação de ofertas a preços extremamente baixos ou com público-alvo confuso. Recentemente, vi uma propaganda de uma empresa de equipamentos agrícolas – infelizmente, estou longe de ser o público certo para ele. Outros anúncios traziam produtos baratos e cafonas.

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Ainda assim, Musk teve razão ao dizer à BBC: “se a Disney se sente confortável anunciando filmes para crianças e a Apple se sente confortável anunciando iPhones, esses são bons indicadores de que o Twitter é um bom lugar para anunciar”.

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Contudo, há menos de cinco meses, quando Musk usava sua plataforma para intimidar a Apple, perguntando se “os EUA odeiam a liberdade de expressão” quando parecia que a empresa ia deixar de anunciar na rede.

Após uma visita à sede da Apple e um passeio ao redor de um lago com o CEO Tim Cook, o relacionamento pareceu melhorar, e a empresa mais rica do mundo foi convencida a ficar na plataforma. Mas nem todas as empresas vão receber esse tipo de atenção individual.

“Pode chegar, está tudo bem”, disse Musk à BBC quando instado a passar uma mensagem a marcas que ainda relutavam em anunciar no Twitter. O problema é que a rede que ele parece querer criar é indesejada para os anunciantes. E embora Musk goste de descrever o Twitter como a maior praça pública do mundo, o que ele realmente criou é um playground selvagem – um lugar no qual manda quem grita mais alto.

Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.

Dave Lee é colunista da Bloomberg Opinion e cobre a área de tecnologia. Foi correspondente em São Francisco no Financial Times e na BBC News.

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