De exportações à guerra da Ucrânia: os temas da reunião de Lula com Xi Jinping

Presidente da China tenta ampliar influência como mediador de eventual acordo de paz com Rússia de Vladimir Putin, enquanto brasileiro busca também acordos comerciais

Por

Bloomberg — O presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, desembarca nesta quarta-feira (12) na China, enquanto seu homólogo Xi Jinping tenta dar impulso a negociações para interromper os combates na Ucrânia, mais de um ano após a invasão russa.

A viagem de Lula a Xangai e Pequim ocorre enquanto Xi embarca em uma rodada de diplomacia nas semanas que sucedem sua visita a Moscou, onde fortaleceu os laços políticos com o presidente russo Vladimir Putin ao mesmo tempo em que promoveu em Pequim um apelo por um cessar-fogo na Ucrânia.

O líder chinês recebeu na semana passada o presidente francês Emmanuel Macron e a presidente da Comissão Europeia Ursula von der Leyen para discutir o esforço.

Xi tem buscado consolidar sua imagem como pacificador depois de ajudar a intermediar um acordo entre o Irã e a Arábia Saudita, que concordaram em normalizar as relações diplomáticas em março.

Ele cultiva essas credenciais enquanto ainda ameaça Taiwan, tendo realizado extensos exercícios militares no final de semana depois que a presidente Tsai Ing-wen se encontrou com o presidente da Câmara dos Representantes dos EUA, Kevin McCarthy.

O líder brasileiro também buscou um papel maior nos esforços globais para acabar com a guerra na Ucrânia, uma dinâmica que provavelmente o tornará um tema-chave de sua reunião bilateral com Xi na sexta-feira.

Lula apoia a maior parte do plano da China para acabar com o conflito, incluindo o cessar-fogo, disse o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, a um pequeno grupo de repórteres em Brasília antes da viagem. “É urgente acabarmos com as mortes, a destruição e as atividades que estimulam a pressão inflacionária em todos os países”, disse Vieira.

Ainda assim, o presidente do Brasil tem reservas sobre a proposta da China de permitir que a Rússia mantenha o controle dos territórios ucranianos ocupados, embora permaneça cético em relação ao líder ucraniano Volodymyr Zelenskiy. “Putin não pode manter o território ucraniano”, disse Lula a jornalistas em Brasília em 6 de abril. “Talvez não estejamos discutindo a Crimeia, mas o que ele invadiu recentemente precisa ser reconsiderado. Mas Zelenskiy também não pode ter tudo o que deseja.”

Atitude dos EUA

A iniciativa da China foi desacreditada pelos Estados Unidos e alguns aliados, que desconfiam de qualquer processo que permita à Rússia manter seus ganhos no campo de batalha. No entanto, para Xi, a pressão por um cessar-fogo na Ucrânia também visa combater as tentativas dos EUA de retratar a China como uma ameaça à ordem internacional.

Durante a visita de Macron, o líder francês traçou uma abordagem diferente da postura mais dura dos EUA em relação a Pequim. E a visita de Lula também ajuda a consolidar os esforços da China para servir como representante das economias em desenvolvimento que podem oferecer uma alternativa aos EUA.

“Não é uma visita qualquer – é Lula”, disse Karin Vazquez, pesquisadora não residente do centro de estudos Centro para China e Globalização, que mora em Xangai. “Ele é muito respeitado como líder global e, do ponto de vista chinês, indica a relevância do Brasil e de outros países emergentes na construção da ‘Nova Era’ de Xi.”

Lula, que foi forçado a adiar a viagem no mês passado devido a uma pneumonia, disse no ano passado que Zelenskiy era “tão responsável quanto Putin pela guerra”. Mais recentemente, ele disse a um canal de TV local que o Brasil está “pronto para fazer qualquer esforço para garantir a paz no mundo”.

Lula começará sua visita em Xangai, onde deve visitar um centro de inovação da Huawei Technologies Co., empresa de tecnologia que os Estados Unidos alegam representar uma ameaça à segurança nacional.

O dirigente brasileiro segue então para Pequim, onde também manterá encontros com o premiê Li Qiang e Zhao Leji, presidente da Assembleia Popular Nacional. As negociações se concentrarão fortemente no meio ambiente – incluindo monitoramento por satélite da destruição na floresta amazônica – bem como agricultura e commodities. Os ministros do Meio Ambiente e da Agricultura do Brasil, Marina Silva e Carlos Favaro, acompanharão Lula na viagem.

É a terceira grande visita de Lula ao exterior desde que assumiu o cargo no início do ano, depois de visitas à Argentina em janeiro e aos Estados Unidos em fevereiro. A viagem a Washington ocorreu sem o tipo de missão empresarial que viajou à China no mês passado, como parte da viagem previamente marcada de Lula, e terminou sem novos acordos bilaterais substanciais.

Brasil e China, por outro lado, já fecharam acordos no mês passado, quando Favaro e mais de 100 executivos do agronegócio brasileiro viajaram a Pequim na esperança de fortalecer as relações comerciais entre os dois países. A China concordou em reabrir seu mercado para a carne bovina brasileira depois que o comércio foi suspenso por um mês em meio a investigações sobre um caso de doença da vaca louca, e quatro frigoríficos brasileiros obtiveram permissão para enviar para a China.

Durante a visita, Favaro disse à Bloomberg News que ainda há espaço para aumentar o comércio de carnes porque a participação brasileira no mercado chinês não é grande. Mais anúncios são esperados nesta semana, depois que os planos para finalizar vários novos acordos foram adiados por causa da ausência de Lula no mês passado.

O comércio bilateral de mercadorias da China com o Brasil quase dobrou de 2017 para US$ 171,5 bilhões no ano passado, mostraram dados da alfândega chinesa. A China é o maior parceiro comercial do Brasil há 14 anos consecutivos, enquanto o país sul-americano é o maior fornecedor de soja, frango e açúcar da China, segundo dados do Ministério do Comércio.

A relação comercial atraiu o escrutínio de ambientalistas que temem que a expansão da produção de soja e pecuária tenha ajudado a impulsionar o desmatamento em ecossistemas como a floresta amazônica e a região do cerrado brasileiro. Lula prometeu proteger a Amazônia e buscará o apoio da China para esse esforço, como fez com os EUA durante sua visita à Casa Branca em fevereiro.

- Com a colaboração de Jasmine NgColum Murphy, E Murtaugh e Fran Wang.

Veja mais em Bloomberg.com