Bloomberg — Se especialistas do mercado financeiro e gestores experientes estão com dificuldade em entender o atual estresse financeiro, imagine o investidor pessoa física com pouco conhecimento do tema.
Por mais frenéticas que tenham sido as notícias, a reação entre estrategistas de renda variável e analistas foi uniforme: nenhuma.
Seja pela relutância em se comprometer com uma nova direção, pela incapacidade de formular uma nova tese – ou simplesmente por não estarem convencidos de que algo importante aconteceu –, as estimativas permanecem quase exatamente onde estavam antes de toda a turbulência.
A estagnação é mais evidente entre estrategistas de Wall Street que preveem as oscilações dos mercados com base em tendências macroeconômicas. Pelo terceiro mês consecutivo, o preço-alvo médio para o S&P 500 em dezembro deste ano está em 4.050 pontos, representando uma inatividade não vista desde 2005. O índice fechou nesta quarta-feira aos 4.027 pontos.
Embora possa ser enquadrado como convicção, a imobilidade provavelmente reflete as incertezas sobre os rumos da economia e do mercado.
Dados compilados pela Bloomberg mostram que a diferença entre as estimativas mais altas e mais baixas de preço-alvo para o S&P 500 é de 47% – a maior nesta época do ano em duas décadas.
“É uma série de eventos em câmera lenta com resultados desconhecidos”, disse Michael Purves, fundador da Tallbacken Capital Advisors. “Não sabemos o quão contagiosa é essa crise dos bancos regionais. Não sabemos a resposta do governo a uma aceleração. E, se tivermos uma paralisação dos empréstimos, não está claro em que magnitude isso afetará os lucros.”
A falta de reação contrasta com grandes gestoras de recursos que rapidamente ajustaram suas posições após a turbulência bancária.
Os fundos hedge (equivalente aos multimercados no Brasil) long & short, com estratégias compradas (aposta na alta) ou vendidas (aposta na queda), abandonaram ações do setor financeiro e buscaram segurança em companhias de grande capitalização do setor de tecnologia.
Ao mesmo tempo, fundos de índice (ETFs, na sigla em inglês) reverteram algumas posições depois de serem pegos pela volatilidade, de acordo com dados compilados pela mesa de trading do Goldman Sachs (GS).
Neste contexto, a exposição líquida a ações em fundos hedge permaneceu baixa no 19º percentil de um intervalo de um ano; as posições “em caixa” (ativos de maior liquidez) em fundos mútuos aumentaram por 15 meses seguidos; e os chamados consultores de negociação de commodities deixaram de ficar comprados em cerca de US$ 130 bilhões em contratos futuros para assumirem apostas vendidas em torno de US$ 28 bilhões, mostram dados do banco de investimento.
“Parece que a maioria dos grupos de investidores teve algumas semanas difíceis”, escreveu Bobby Molavi, managing partner do Goldman, em nota. “Ainda há uma falta de convicção em quase todos os lugares”, mas, pelo menos, o posicionamento corresponde à percepção pela primeira vez neste ano.
No entanto ficar imóvel tem sido lucrativo ultimamente.
O S&P 500 encerrou uma segunda semana consecutiva de ganhos, quase eliminando todas as perdas de 8 de março, um dia antes do começo da quebra dos bancos regionais.
Embora os Treasuries de referência - títulos do Tesouro dos EUA de 10 anos - tenham desferido golpes contra investidores com posições vendidas, aguentar a pior volatilidade em quatro décadas teria produzido lucros consideráveis.
Com tantos fatores em jogo, sobram narrativas conflitantes. Embora a crise bancária possa levar a condições de financiamento mais rigorosas que prejudicam a economia, o espectro de uma recessão colocaria o Federal Reserve mais perto de encerrar sua agressiva campanha de combate à inflação.
Analistas que acompanham ações individuais praticamente não mudaram suas projeções para os lucros corporativos. Sua previsão agregada para 2023 para componentes do S&P 500 ficou perto de US$ 220 por ação na semana anterior à quebra dos bancos, incluindo o Silicon Valley Bank (SVB).
Com a temporada de balanços referente ao primeiro trimestre de 2023 programada para começar em cerca de duas semanas, é possível que muitos deles estejam aguardando projeções atualizadas das empresas antes de ajustar seus números.
“A economia e os mercados de trabalho dos Estados Unidos têm sido resilientes nos últimos nove meses, e os mercados extrapolaram isso” para refletir que os resultados corporativos também possam permanecer fortes, disse Nicholas Colas, cofundador da DataTrek Research.
“Os balanços do primeiro trimestre e os guidances - que obteremos na primeira metade do segundo trimestre - testarão essa teoria.”
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