Opinión - Bloomberg

Hoje trabalhamos menos do que outras gerações. Por que nos sentimos esgotados?

Uma semana de quatro dias é o sonho de qualquer trabalhador, mas, mesmo trabalhando menos do que as gerações anteriores, estamos mais descontentes

Fonte: FreePik
Tempo de leitura: 5 minutos

Bloomberg Opinion — Os trabalhadores estão se sentindo esgotados e passando por burnout. Portanto, não é de se admirar que as pessoas se animaram com um estudo recente do Reino Unido que afirmou que as empresas que reduziram as horas semanais em 20% (ou seja, ficando com uma semana de trabalho de quatro dias) tiveram funcionários muito mais felizes sem perder receita.

Na ausência de uma semana de quatro dias, mais americanos parecem estar optando por trabalhar em meio período, mesmo que exista a possibilidade de trabalhar em período integral. Tudo isso além das tendências de, por exemplo, fazer o mínimo no trabalho – o chamado “quiet quitting”.

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Parece que chegamos à era de trabalhar menos. Mesmo antes da pandemia, os americanos estavam trabalhando menos. Na verdade, nunca passamos tão pouco tempo no trabalho. Portanto, se estamos esgotados, talvez o problema não seja o trabalho.

A aspiração de trabalhar menos é tão antiga quanto o próprio ato de trabalhar. Em 1928, o economista britânico John Maynard Keynes previu que seus netos só precisariam trabalhar 15 horas por semana porque a tecnologia faria boa parte de nosso trabalho. Apesar de ainda trabalhamos muito mais do que 15 horas por semana, ele não estava totalmente errado. Há uma tendência decrescente no número de horas trabalhadas.

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A tecnologia sem dúvidas tornou o trabalho mais produtivo. O exemplo mais recente é o da pandemia, na qual as tecnologias adotadas permitiram que mais pessoas trabalhassem remotamente, economizando tempo de deslocamento, conversas fiadas e socialização. Mas aposto que Keynes nunca imaginou um smartphone que permite que seu chefe entre em contato a qualquer hora do dia.

Um estudo dos economistas Mark Aguiar e Erik Hurst estima que em 1965, os homens de 21 a 65 anos de idade trabalhavam por uma média de 51 horas por semana; em 2003, o tempo caiu para apenas 39,9 horas e, desde então, tem se mantido bastante estável.

As mulheres continuam sendo uma parte menor da força de trabalho, mas um número muito maior delas trabalha fora de casa desde os anos 60 e mais mulheres trabalham em meio período. A semana média de trabalho de uma mulher aumentou de 20 para 26,3 horas até 2003 e continuou relativamente estável desde então.

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O mesmo estudo também mediu o trabalho em casa, como tarefas domésticas, e constatou que a tecnologia – como melhores cortadores de grama e máquinas de lavar louça – levou a uma grande redução nesse âmbito também. Quando os economistas incluíram todas as formas de trabalho, eles estimaram que as horas de trabalho diminuíram 7,6 horas para os homens e 6,44 horas para as mulheres.

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O benefício de trabalhar menos é ter mais horas de lazer. As horas de lazer dos homens aumentaram quase 20% entre 1965 e 2003. As mulheres tiveram 10% a mais de lazer, embora, após esse aumento, elas começara a diminuir novamente nos anos 90, quando elas começaram a passar mais tempo cuidando dos filhos. Agora as mulheres trabalhadoras passam quase duas vezes mais tempo com seus filhos do que nos anos 60.

Uma surpresa: em 1965, os homens com escolaridade mais baixa trabalhavam mais horas, mas essa tendência se inverteu e agora os que ganham mais tendem a trabalhar mais. Em 2003, os homens instruídos trabalhavam cinco horas a mais por semana do que os homens sem diploma de ensino médio.

E isso ainda é verdade: em 2003, os homens com o ensino médio ou com menos escolaridade trabalhavam 3,6% menos horas do que os homens com mais escolaridade; em 2018, a diferença diminuiu um pouco, chegando a 1,6%. E talvez a diferença tenha agora diminuído ainda mais: desde a pandemia, os homens instruídos são os mais propensos a fazer o mínimo no trabalho.

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Sejamos honestos: se a meta é uma semana de trabalho de quatro dias, os que ganham mais são os que podem se dar ao luxo de trabalhar menos. Mas isso não é realista em toda a economia. Por exemplo, trabalhadores que ganham por hora (e tendem a ganhar menos em geral), não podem se dar ao luxo de trabalhar 20% a menos na semana.

Além disso, uma semana de trabalho de quatro dias também prejudicaria a economia. A tecnologia nos torna mais produtivos para que possamos fazer mais em menos tempo, mas é improvável que esses ganhos de produtividade sejam suficientes para compensar a queda de 20% no trabalho.

O estudo britânico sugere que isso é possível, mas o projeto foi diminuto, e 88% das empresas que participaram são de marketing, serviços profissionais, administração, ou instituições de caridade ou sem fins lucrativos. Para a maioria dos empregos, menos trabalho significa menos produção, o que significa menos produtos e serviços. Isso agrava a escassez de mão-de-obra e aumenta a inflação, empobrecendo a todos.

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Até mesmo as empresas no estudo do Reino Unido reclamaram que a semana de trabalho de quatro dias causou muita confusão porque o resto do mundo trabalhou durante cinco dias. E as empresas que deixaram os trabalhadores escolherem seus dias de folga tiveram problemas para coordenar seus funcionários.

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Portanto, nossa economia não está pronta para reduzir o trabalho em 20%. Mas há uma tendência real de pessoas trabalhando menos e ainda assim sofrendo de burnout. A pergunta é: por quê? Como mais pessoas estão ficando esgotadas se estão trabalhando menos e têm mais tempo livre do que as gerações anteriores?

Talvez seja porque, mesmo com a redução de horas de trabalho, parece que nunca estamos fazendo uma pausa genuína. Os pais gastam muito mais tempo cuidando dos filhos do que as gerações anteriores. Também passamos nosso momento de lazer de maneira diferente.

Mesmo com mais tempo, o lazer pode não ser tão restaurador quanto costumava ser. Nós passamos o tempo olhando para as telas e jogando videogames cheios de adrenalina e passamos menos tempo lendo ou interagindo com as pessoas de nossa comunidade. Estas tendências estão associadas a mais ansiedade e infelicidade, tanto para adolescentes quanto para adultos.

Talvez a forma como passamos nosso tempo sem trabalhar seja o que nos está exaurindo – não o número de horas que estamos realmente trabalhando.

Trabalhar de casa pode piorar essa sensação – mesmo economizando tempo e sendo ser mais produtivos, estamos ficando mais na frente nas telas e mais sozinhos. O que é, em muitos aspectos, irônico.

Keynes esperava que a tecnologia nos libertasse do trabalho. E realmente nos deu menos trabalho e mais tempo livre, mas também está nos fazendo sentir mais sobrecarregados e infelizes.

Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.

Allison Schrager é colunista da Bloomberg Opinion e escreve sobre economia. É pesquisadora sênior do Manhattan Institute e autora de “An Economist Walks Into a Brothel: And Other Unexpected Places to Understand Risk”.

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