Por que crises financeiras se repetem tanto? A culpa não é da regulação

Ampliar esforços para aumentar a segurança dos bancos pode ter efeito contrário e levar o risco a outras áreas menos reguladas do setor financeiro

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Bloomberg Opinion — Se você vem acompanhando as crises bancárias nos Estados Unidos e na Europa e está perguntando por que isso está acontecendo novamente, a perspectiva não é muito boa: independentemente das leis aprovadas, ou da regulamentação aplicada, as crises bancárias se repetirão – e com frequência.

Faz sentido tentar limitar e impedir essas crises, e as reformas sistêmicas que os EUA e a UE ordenaram há mais de uma década foram apropriadas. Mas não há muito a se fazer. Parte do motivo decorre da própria natureza da regulamentação. A outra parte é que mais restrições impostas aos bancos levarão inevitavelmente a uma maior intermediação financeira fora do sistema bancário.

Considere o modelo bancário clássico, no qual passivos líquidos são usados para financiar ativos relativamente ilíquidos e de difícil valor, como empréstimos a empresas. Essa discrepância entre as qualidades dos ativos e passivos é o motivo pelo qual os bancos são necessários em primeiro lugar.

É também o que torna os bancos tão difíceis de regular: se o valor dos ativos bancários não for totalmente transparente para o mercado, ele também não será totalmente transparente para os reguladores, ou para os depositantes.

Uma abordagem para esse desafio é limitar os bancos a ativos “mais seguros” e impor exigências de capital. A ideia é boa, mas não vai resolver o problema. Primeiro, porque se os bancos forem limitados a ativos mais seguros, isso tende a torná-los menos lucrativos em tempos normais e a aproximá-los da insolvência em tempos conturbados.

Em segundo lugar, se esforçar para tornar os bancos mais seguros pode efetivamente aumentar o risco em outras áreas do setor financeiro, como fundos de money market, bancos de crédito comercial, fintechs, seguradoras, crédito comercial e outras. Essas instituições são normalmente menos regulamentadas que os bancos e não têm o mesmo tipo de acesso direto à janela de desconto do Federal Reserve.

Isso não é meramente hipotético: na crise de 2008, houve grandes problemas com fundos de money market e seguradoras.

Há uma tentação, à luz dos acontecimentos recentes, de endurecer muito as exigências de capital dos bancos – elevando-as para, por exemplo, 40%. Novamente, isso tornaria os bancos mais seguros, mas não necessariamente tornaria o sistema financeiro como um todo mais seguro.

Assim, os formuladores de políticas permitem que os bancos continuem em seu caminho potencialmente precário. Sejam quais forem suas razões, o fato é que as regulamentações bancárias só podem ser rígidas antes que o risco financeiro comece a se espalhar para outras áreas – possivelmente mais perigosas – do sistema.

Deixo claro que não estou argumentando uma regulamentação zero. Meu argumento é que qualquer regime regulatório é um alívio temporário, não uma solução permanente. Este é um defeito inerente a toda regulamentação: tanto os órgãos reguladores quanto os regulados tendem a empregar uma definição retroativa de um ativo ou posição de carteira de risco.

Durante a crise financeira de 2008, por exemplo, houve um excesso de concentração da atividade de derivativos na AIG, o que posteriormente exigiu um resgate. Os derivativos financeiros receberam má fama em muitos setores, e os títulos públicos foram vistos como um porto seguro.

No Silicon Valley Bank, o problema foi o inverso: sua carteira não estava suficientemente protegida com derivativos e swaps de taxas de juros, deixando-a vulnerável a grandes oscilações nas taxas de juros na sua carteira de títulos. O banco deveria ter usado mais derivativos.

É claro que é fácil dizer “podemos emitir regulamentações para que isso não aconteça mais”. Mas essas regulamentações não impedirão que novos tipos de erros aconteçam.

Depois há a questão da lenta intensificação do risco moral. Muitas vezes as crises resultam em algum tipo de resgate, o que por sua vez diminui pelo menos algumas salvaguardas de risco para a próxima vez.

O maior problema, entretanto, pode ser que em uma economia saudável, o setor financeiro tende a crescer em tamanho. A intermediação financeira é tipicamente aplicada ao patrimônio, não à renda. No entanto, com o tempo, a razão entre patrimônio e renda tende a subir.

As economias produzem mais, muitas estruturas se tornam mais duráveis, e os retornos dos investimentos se acumulam acima e além da depreciação. Assim, o tamanho do setor financeiro torna-se cada vez maior em relação ao PIB, mesmo que seja uma proporção aproximadamente constante do patrimônio.

À medida que o setor financeiro aumenta, será que tudo isso pode realmente ser resgatado, com recursos inevitavelmente limitados? É possível monitorar tudo com tanto cuidado, através de incentivos governamentais ou do mercado privado?

Será que existe uma oferta suficientemente grande de ativos verdadeiramente seguros, como Treasuries de curto prazo, para cobrir os riscos? A resposta a todas estas perguntas, mais cedo ou mais tarde, é não.

E é por isso que, se você me perguntar quando deve se preparar para a próxima crise financeira, minha resposta é sempre... agora.

Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.

Tyler Cowen é colunista da Bloomberg Opinion. É professor de economia na George Mason University e escreve para o blog Marginal Revolution. É coautor de “Talent: How to Identify Energizers, Creatives, and Winners Around the World.”

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