‘Brasil é uma armadilha?’, questiona JPMorgan em nova análise sobre a bolsa

Analistas do banco americano avaliam que há poucas chances de alta sustentável no índice, mas arcabouço fiscal e juros mais baixos podem contribuir para retomada

No acumulado do ano, o Ibovespa cai cerca de 10% até sexta-feira (24), com volta da saída do capital externoi
27 de Março, 2023 | 03:34 PM

Bloomberg Línea — Apesar de condições técnicas favoráveis à bolsa, o Ibovespa (IBOV) perdeu na semana passada o patamar dos 100 mil pontos. E, segundo o JPMorgan, o principal índice de ações da bolsa brasileira deve seguir pressionado enquanto não houver um corte nas taxas de juros – ou pelo menos, perspectivas de um caminho para isso.

Em relatório divulgado nesta segunda-feira (27), o time de análise do banco americano escreveu que o comunicado pós-Copom da reunião de 22 de março, que manteve a Selic em 13,75% ao ano e abriu possibilidade para novos aumentos nos juros, jogou um balde de água fria nas perspectivas para o investimento em ações.

“Estamos no auge do pessimismo? Há algum tempo pensamos que sim, principalmente porque essa foi a pergunta que mais ouvimos dos investidores nas últimas cinco semanas. Mas os preços estão mostrando que sempre podem piorar”, escreveram os analistas.

A avaliação é a de que estruturalmente não há grandes elementos que sustentem uma postura otimista com a bolsa brasileira. Por outro lado, o pacote fiscal pendente e uma queda eventual nas taxas de juros podem ser capazes de levantar o mercado, dizem os analistas do JPMorgan.

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No acumulado do ano, o Ibovespa cai cerca de 10% até sexta-feira (24), passando dos 109 mil pontos, ao fim de dezembro, para o patamar dos 99 mil pontos neste fim de março. Na semana passada, o índice chegou, inclusive, a perder o nível dos 98 mil pontos.

Já o fundo de índice (ETF) brasileiro EWZ, negociado na bolsa de Nova York, está sendo negociado abaixo de 26, um dos menores níveis desde a metade de 2020, no ápice da pandemia de covid-19.

À espera do pacote fiscal

No relatório, o JPMorgan destaca que o adiamento da viagem do presidente Lula à China, que estava marcada para o último fim de semana, pode acelerar o anúncio do novo arcabouço fiscal.

Um pacote considerado positivo deve percorrer um longo caminho para fornecer algum alívio ao mercado, escrevem os analistas, considerando que é um elemento-chave no caminho para taxas de juros mais baixas. Da mesma forma, completam, um pacote mal-elaborado levaria a outra “pernada” para baixo das ações.

“Em nossa recente viagem a Brasília, saímos com a mensagem de que o projeto de lei não deveria enfrentar oposição no Congresso e que poderia ser aprovado com relativa rapidez.”

O JPMorgan chama a atenção ainda para os novos diretores do Banco Central (de política monetária e de fiscalização) que serão nomeados pelo presidente Lula. “Embora o cenário-base seja o de nomes amplamente considerados ‘ok’ pelos mercados, o Copom hawkish aumenta o potencial para nomeações mais heterodoxas”, escreveram os analistas do banco.

As críticas de Lula ao patamar da Selic, além do papel de Roberto Campos Neto e da autonomia do Banco Central, também pressionam os ativos. “Acima de tudo, tenha em mente que a pressão do governo deve continuar pelo menos até que as taxas caiam, se é que será amenizada algum dia”, completam.

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Quem está comprando a bolsa?

Depois de um forte 2022 e início de ano, os estrangeiros estão tirando dinheiro do Brasil nas últimas cinco semanas, em um movimento impulsionado pelas maiores preocupações com os bancos e o cenário de crédito nos Estados Unidos.

No âmbito local, o peso da volatilidade trazida pelos mercados internacionais somado à incerteza fiscal e aos juros elevados têm contribuído para saída de ativos de risco. A expectativa do banco é a de que o primeiro trimestre deste ano seja o pior em termos de resgates para os fundos multimercados e de ações no país.

O comprador marginal, portanto, seria o investidor local que começa a usar parte de sua posição de caixa para entrar em um mercado barato, segundo o JPMorgan, ou o investidor de mercados emergentes que procura retomar as entradas no Brasil, principalmente depois que a China registrou em fevereiro sua primeira saída de investimentos desde maio de 2022.

‘Brasil é uma armadilha?’

Com relação aos valuations, a dúvida recai sobre se eles vão subir com a queda das taxas de juros.

Para o JPMorgan, apesar de estar sendo negociado abaixo da média e mais barato que outros emergentes, o Brasil ainda carece de boas expectativas para os ganhos das empresas.

“Embora as taxas mais baixas devam levar a uma reclassificação, a preocupação que temos é que a compressão dos lucros possa continuar, considerando a forte desaceleração econômica já em vigor e uma iminente recessão nos EUA no final do ano.”

“Em suma, as taxas [de juros] devem ser o fator que vai nos permitir responder à pergunta que vem se tornando mais frequente nos últimos tempos: o Brasil é uma armadilha?”, escreveu o time de análise do JPMorgan.

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Mariana d'Ávila

Editora assistente na Bloomberg Línea. Jornalista brasileira formada pela Faculdade Cásper Líbero, especializada em investimentos e finanças pessoais e com passagem pela redação do InfoMoney.