Bloomberg Opinion — Todos os anos, no Dia Internacional da Mulher, a mídia aproveita oportunidade para publicar histórias sobre como as mulheres estão tendo sucesso no trabalho. A observância anual é uma boa oportunidade para fazer um balanço do progresso na igualdade de gênero (ou a falta dele).
Mas muito frequentemente essas histórias destacam tendências que não são corroboradas por pesquisas ou dados. Isso incomoda. Se quisermos resolver os desafios que continuam limitando o progresso das mulheres, é importante separar a suposição dos fatos. Separei quatro perguntas que uso como guias para determinar se uma matéria vale a pena.
A tendência analisada é corroborada por dados ou utiliza dados de uma fonte confiável? Já perdi a conta de quantas matérias proclamam o que as mulheres andam fazendo sem expor os dados relacionados. É claro que os dados não são tudo – o storytelling também é necessário – mas para chamar algo de “tendência”, é necessário ter alguns números para corroborá-la.
Por exemplo, é comum que as matérias contem que mulheres de meia-idade com alto grau de escolaridade optem por não fazer parte da força de trabalho, sem apoiar essas afirmações com números sólidos como os publicados pelo Departamento de Estatísticas do Trabalho dos Estados Unidos. Por que isso acontece? Porque os dados do órgão não confirmam essa tendência. Na verdade, existem hoje mais mulheres com formação universitária na força de trabalho dos EUA do que homens.
Isso não significa que você não possa enumerar algumas mulheres que deixaram a força de trabalho para serem mães e cuidarem da casa, ou que isso indique que suas histórias não são importantes. Isso só significa que elas representam uma fração muito pequena da população. Além disso, a maioria das mulheres que deixaram seus empregos para cuidar dos filhos geralmente ficam fora da força de trabalho por um período relativamente curto. Em um país com uma política de licença-maternidade extensa, elas podem até mesmo nem entrar para as estatísticas como demissões.
A tendência em questão deixa de distinguir adequadamente os diferentes grupos de mulheres? Muitas matérias do Dia Internacional da Mulher falam sobre mulheres sem distinguir entre grupos raciais ou econômicos. Mas os detalhes fazem toda a diferença. Por exemplo, a participação de homens e mulheres na força de trabalho varia consideravelmente de acordo com a etnia.
Poderia haver uma discussão interessante sobre essas diferenças. Mas não se a matéria escondê-las.
Da mesma forma, as histórias que falam sobre tendências frequentemente implicam que as mulheres com filhos pequenos ficam fora da força de trabalho devido a fatores psicológicos – estresse, culpa ou devoção maternal. Mas uma análise da BLS do pré-pandemia mostrou que a taxa de participação das mulheres na força de trabalho dispara quando seus filhos chegam à idade escolar, um sinal de que fatores externos – como o custo e a disponibilidade de cuidados para crianças – podem ser ainda mais significativos.
A matéria chega a mencionar homens? Estou farta de matérias que nem ao menos mencionam homens. Ao longo dos 20 anos em que escrevo sobre igualdade de gênero, os jornalistas melhoraram muito na discussão do papel dos empregadores na perpetuação dos desequilíbrios de gênero no trabalho. Mas as histórias sobre mulheres na força de trabalho ainda não mencionam seus cônjuges, que afinal são as pessoas que muitas vezes exercem a maior influência direta na carreira das mulheres.
Em famílias de casais heteroafetivos, os maridos desempenham um papel enorme nas decisões de suas esposas sobre quanto trabalhar e quais oportunidades de trabalho aproveitar, não apenas através do que dizem, mas por meio de seu comportamento. Um marido pode dizer que está orgulhoso, mas a carreira de sua esposa ainda pode ruir se ele não compartilhar as tarefas domésticas, os cuidados com os filhos ou a carga mental de administrar tudo ao mesmo tempo.
A história aborda o comportamento dos homens como a norma? Mesmo uma história que parece tratar das diferenças e ser corroborada por dados pode ficar aquém das expectativas. Uma tendência comum sobre as mulheres no local de trabalho é que elas não são confiantes. Estas histórias são sempre corroboradas por resmas de estudos acadêmicos revisados por pares que mostram, de fato, uma diferença de confiança entre homens e mulheres.
Porém, é importante observar que, embora essa constatação seja robusta, ela não confirma que os homens são realmente confiantes. Isso é uma pressuposição. E quando os pesquisadores fizeram o teste, descobriram que os homens não eram um grupo de controle neutro. Em vez disso, os homens tinham a tendência de ter um senso inflado de suas próprias habilidades.
É verdade que as mulheres são menos confiantes que os homens. Mas a realidade é que os homens tendem a ser superconfiantes, não que as mulheres são subconfiantes. Mais uma vez, isso deve influenciar as soluções que buscamos. Será que as mulheres precisam de treinamento de assertividade? Ou será que as organizações precisam parar de equiparar vaidade e habilidade?
No ritmo atual das mudanças, vai demorar séculos séculos até que as mulheres alcancem a plena igualdade com os homens. Temos que fazer melhor. E podemos começar sendo mais inteligentes sobre como diagnosticamos os problemas que as mulheres enfrentam.
Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.
Sarah Green Carmichael é editora da Bloomberg Opinion. Anteriormente, era editora-gerente de ideias e comentários na Barron’s e editora executiva na Harvard Business Review, onde apresentava o podcast “HBR IdeaCast.”
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