Bloomberg Línea — Antigamente, os argentinos diziam que “se o Brasil pegar um resfriado, a Argentina espirra”. Essa é a importância das relações comerciais com o Brasil para a Argentina. Entretanto, o contrário não é verdade e, inclusive, nos últimos anos, a importância da Argentina no comércio exterior do Brasil vem diminuindo.
Um relatório da consultoria argentina Ecolatina aponta que o setor externo brasileiro tem sido um dos mais dinâmicos da região. “Em média, durante o período 2010-2021, as exportações do Brasil cresceram a uma taxa média anual de 6,5%, mais que o crescimento global (5,5%) e o fraco desempenho da economia argentina (4,1%)”.
Contudo, a Ecolatina destacou que o bom desempenho do Brasil não esteve ligado à Argentina, que foi o país que perdeu mais participação entre 2010 e 2022.
Mesmo assim, apesar da deterioração, a Argentina continua sendo fundamental para o setor industrial brasileiro: o país de Lionel Messi é o segundo principal destino da manufatura brasileira.
Por que a Argentina está se tornando cada vez menos relevante para o Brasil?
A Ecolatina detalha que a queda abrupta na relevância da Argentina para o fluxo comercial do Brasil é explicada pelo surgimento da China e seu aprofundamento como principal parceiro comercial do Brasil.
Como resultado, ao passo que a Argentina perdeu 4 pontos percentuais de sua participação no comércio exterior brasileiro – a maior queda entre os mais de 200 países com os quais o Brasil faz comércio – a China aumentou sua participação em 10 pontos percentuais.
Um resultado semelhante é obtido se observarmos a participação da Argentina nas importações brasileiras, que durante o mesmo período caiu 4,6 pontos percentuais, passando de 9,2% para 4,6%.
A Ecolatina destaca que, após o impulso das relações nos anos 90, foram registradas duas etapas posteriores bastante distintas:
- Durante o período entre 2003 e 2011 houve uma expansão notável, com um crescimento médio anual de 17%;
- Depois disso, houve uma pausa e, durante o período entre 2012 e 2021, houve uma queda de 5% no ritmo anual médio;
Em todo caso, a relação morna entre os dois países ainda não é suficiente para retirar a Argentina da lista dos principais aliados comerciais, pois está em terceiro lugar atrás da China e dos Estados Unidos, indicando a relevância que ainda prevalece.
O que é comercializado entre Argentina e Brasil?
As vendas brasileiras para a Argentina foram constituídas mais de 80% por manufaturas de origem industrial (MOI), enquanto a proporção de MOI exportada pelo Brasil para o resto do mundo (excluindo a Argentina) foi inferior a 25%.
Tudo isso em um cenário de perda de dinamismo da atividade industrial brasileira (-0,7% em 2022), registrando uma queda de 16% desde o último pico em 2013, sem ainda conseguir voltar aos níveis de atividade pré-pandemia (-1,3% em comparação com 2019).
Como resultado, a participação das MOI nas exportações argentinas em 2022 (27%) estava em seu nível mais baixo desde 2009 (38%).
Por outro lado, a balança comercial excedente do Brasil com a Argentina é explicada pelas exportações de MOI. Os resultados comerciais por itens importantes (exportações - importações) em 2022 mostraram que produtos primários, combustíveis e manufaturas de origem agrícola (MOA) implicaram déficit comercial para o Brasil de cerca de US$ 3,4 bilhões.
Enquanto isso, o superávit de MOI contribuiu para uma receita de aproximadamente US$ 5 bilhões, e os minerais contribuíram com US$ 725 milhões líquidos.
Em relação a este último, a Ecolatina resumiu: “(Para o Brasil) o comércio com a Argentina é impulsionado pelas MOI, e o relacionamento com o resto do mundo é explicado pelas matérias-primas. Assim, durante 2022, a Argentina se tornou o segundo destino das MOI brasileiras, atrás dos Estados Unidos, país que tirou a Argentina do primeiro lugar em 2014″.
A indústria automobilística é o principal fator quando se trata de explicar a composição das MOI. Os primeiros quatro produtos brasileiros exportados para a Argentina durante 2022 estavam relacionados ao setor.
A Ecolatina detalha que nesta área existe uma “complementaridade produtiva e integração vertical”, sendo o Brasil mais especializado nas etapas iniciais de produção e a Argentina, nas etapas finais.
Déficit comercial para a Argentina
A Ecolatina destacou que desde o início do século 21, a Argentina só conseguiu um superávit comercial com o Brasil em seis anos. Nesse contexto, a Argentina é a principal entusiasta e promotora de uma “moeda comum” entre os dois países, que não substitui a soberania monetária de cada país, mas oferece maior fluidez ao intercâmbio comercial.
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